Economia entra em desaceleração no terceiro trimestre (como esperado)

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 02 de dezembro de 2022

Os números do Produto Interno Bruto (PIB), a medida aceita até aqui pelos governos para aferir o volume de riquezas produzidas por um país, confirmaram as expectativas de uma desaceleração no ritmo de crescimento da economia na segunda metade do ano e, ainda, a predominância dos serviços como “motor” do avanço recente experimentado pela atividade econômica. Comparado ao trimestre imediatamente anterior, a variação saiu de 1,0% no segundo trimestre para 0,4% no terceiro, com elevação ainda de 3,6% frente ao mesmo período de 2021. Com exceção para o consumo do governo, que acelerou seu crescimento às vésperas das eleições, todas as demais categorias, seja no lado do consumo, seja no lado da oferta, experimentaram desaquecimento.

Bem ao gosto do ministro dos paraísos fiscais, aquele que confirmou ter destinado a uma conta fora do País algo como US$ 9,55 milhões para não pagar impostos e gosta de fazer comparações internacionais, o avanço de 0,4% experimentado pelo PIB coloca o Brasil numa 24ª colocação entre as economias que já divulgaram seu desempenho no período, num ranking que inclui meia centena de países. O País teve companhia de Portugal, Tunísia e Alemanha, que enfrenta uma crise energética, mas foi superado, para ficar apenas nas Américas, pelo Peru (0,6%), Canadá e Estados Unidos, ambos com crescimento de 0,7%, e ainda pelo México (0,9%), sempre na passagem do segundo para o terceiro trimestres deste ano.

No mesmo intervalo, os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram queda de 0,9% para a agropecuária, frente ao trimestre encerrado em junho deste ano, depois de ter anotado leve incremento de 0,1% no segundo trimestre, numa estabilidade pelo menos virtual. O PIB da indústria, que havia registrado elevação de 1,7% no segundo trimestre, passou a crescer 0,8%. Mesmo os serviços, que responderam por alguma coisa em torno de 57,9% do valor nominal do PIB acumulado neste ano até setembro, saíram de crescimento próximo a 1,3% para 1,1%.

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Desaquecimento geral

Do lado da demanda, investimentos e consumo das famílias apontaram a mesma tendência de aceleração. Na mesma sequência, considerando as taxas de crescimento experimentadas no segundo e no terceiro trimestres respectivamente, o investimento reduziu sua velocidade de crescimento de 3,8% para 2,8%; o consumo das famílias passou de 2,1% para 1,0%, ou seja, praticamente a metade. No caso do governo, que havia reduzido seu consumo em 0,9% no segundo trimestre, registrou alta de 1,3% no terceiro trimestre. A tendência de esfriamento da atividade, num cenário de redução da renda disponível e de arrocho monetário (alta dos juros), no diagnóstico da equipe de macroeconomia do Itaú BBA, pode ser percebida com clareza maior quando se consideram as taxas de crescimento acumuladas em quatro trimestres. O PIB, que encolheu 3,3% em 2020, avançou 5,0% no ano passado (dado revisado recentemente pelo IBGE), atingindo 5,2% nos 12 meses terminados em março deste ano. Mas veio caminhando para baixo desde então, chegando a 3,2% no segundo trimestre (sempre no acumulado em quatro trimestres) para se limitar a 3,0% no dado mais recente. “Mantemos nossa perspectiva de que o ritmo continuará desacelerando à frente”, reforça o Itaú BBA.

Balanço

  • Na leitura do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), a perda de intensidade no terceiro trimestre, “como vinha sendo esperado”, ocorreu “a despeito das medidas anticíclicas adotadas pelo governo”. Vale dizer, a escalada de gastos na reta final da campanha eleitoral e nos meses anteriores teve pouca relevância para aquecer a atividade econômica.
  • O desaquecimento surge de forma mais drástica num setor que vinha apresentando fortes taxas de crescimento, embora em grande parte estivesse recuperando o terreno perdido desde a recessão e depois ao longo da pandemia. O investimento chegou a experimentar um salto de 16,7% em 2021, mas entrou em desaquecimento vertical nos trimestres seguintes, com a taxa recuando inicialmente para 10,2% no primeiro trimestre e desabando para 3,8% no segundo trimestre para fechar em apenas 0,8% no período de 12 meses até setembro passado.
  • No acumulado dos três primeiros trimestres deste ano, comparado a idêntico período de 2021, o investimento ficou no zero a zero e não saiu do lugar. Para comparação, em igual período do ano passado, registrou-se salto de 21,7% nesta área.
  • O PIB dos serviços havia avançado a uma taxa anual de 6,3% nos três primeiros meses de 2022 e passou a crescer 4,4% no terceiro trimestre, uma taxa ainda robusta, mas equivalente a 70% do ritmo anterior, puxado especialmente pelos serviços presenciais, mais afetados pelas medidas de restrição a aglomerações e à circulação de pessoas durante a fase mais crítica da pandemia. Segundo analistas, completando-se o ciclo de normalização das atividades no setor, a tendência, em parte já observada, seria de desaquecimento e taxas menores de crescimento.
  • O consumo das famílias, que pelo lado da demanda respondeu por 62,6% do PIB no acumulado dos primeiros nove meses deste ano, igualmente experimentou alguma desaceleração, embora num ritmo menos intenso. As famílias haviam expandido seu consumo em 4,7% nos 12 meses terminados em março deste ano, taxa reduzida para 3,7% até dezembro.
  • De acordo com o IBGE, o consumo das famílias anotou avanço de 4,6% na comparação entre o terceiro trimestre deste ano e igual período do ano passado, depois de crescer 5,7% no segundo trimestre de 2022. O instituto atribui o desempenho ao aumento no consumo de serviços presenciais, em geral usufruídos em maior escala por famílias de renda mais elevada, à melhora relativa no mercado de trabalho, com elevação da massa salarial em termos reais (descontada a inflação), a um salto nominal (sem descontar a inflação) de 22,8% no saldo das operações de crédito para pessoas físicas com recursos de livre provisão pelos bancos e, adicionalmente, à queda do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que baixou de 9,6% no segundo trimestre para 8,6% no trimestre imediatamente seguinte.
  • Pesou para esfriar a demanda das famílias e suas decisões de consumo, acrescenta ainda o IBGE, especialmente a elevação da taxa básica de juros de 5,0% para 13,9% ao ano, na média observada em 2021 e 2022, respectivamente. Esse fator tende a operar com maior vigor daqui para frente em função do aumento nos níveis de endividamento das famílias, agravado mais recentemente pela retomada da tendência de alta nos preços em geral.