Economia global tende a registrar “crescimento anêmico” neste ano

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 06 de maio de 2023

Em meio a incertezas e turbulências acumuladas nos últimos três anos, com impactos severos primeiro da pandemia e, na sequência, da guerra entre Rússia e Ucrânia sobre as cadeias internacionais de produção e de suprimentos, levando ao incremento da inflação ao redor do globo, as previsões de crescimento para a economia mundial continuam meramente “anêmicas”, na descrição do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Mesmo numa perspectiva de curto prazo, a sucessão igualmente crescente de eventos climáticos extremos, que tende a se tornar uma constante daqui em diante, surge como ameaça real, afetando vidas e a atividade econômica em todo mundo, mas sobretudo em países mais pobres.

Adicionalmente, a elevação dos juros, política adotada para reverter o surto inflacionário, tem trazido desafios ainda maiores, levando à quebra de bancos médios no começo deste ano e, mais recentemente, atingiu um cheio o tradicional Credit Suisse, que já vinha, a bem da verdade, enfrentando dificuldades para atender ao fluxo crescente de saques de seus clientes. Os riscos de uma crise bancária, ainda que não se admita a possibilidade de uma repetição dos episódios de 2008/09, que produziram a pior crise financeiro desde o colapso de 1929/30, continuam presentes e têm sido considerados pelos bancos centrais na Europa e nos Estados Unidos em seu processo de decisão sobre a política monetária.

Em nota recente, o instituto compilou as projeções mais recentes de institutos multilaterais para o Produto Interno Bruto (PIB) global, a exemplo do Fundo Monetário Internacional (FMI), Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), além do Banco Mundial. As previsões mais recentes, divulgadas em abril, parecem confirmar a expectativa de desaquecimento em toda a economia mundial, saindo de um avanço próximo a 3,4% em 2022 para variações ao redor de 2,8% (FMI) e de 2,1% (Unctad) para este ano. A OCDE calibrou suas previsões para este ano em 2,6% na estimativa divulgada em março, enquanto do Banco Mundial vinha trabalhando, até janeiro deste ano, com uma variação ainda mais modesta, em torno de 1,7%, quer dizer, metade do crescimento observado no ano passado.

Continua após a publicidade

Desdobramentos

“A inflação atingiu patamares recordes em décadas e, para trazê-la de volta às suas respectivas metas, os bancos centrais das economias avançadas apertaram agressivamente suas políticas monetárias desde o final de 2021, reduzindo o crescimento econômico mundial”, registra o Iedi. Os juros mais altos do que aqueles praticados nos primeiros dois anos da pandemia associaram-se a “brechas na regulação financeira” e ainda a “riscos específicos” já observados em determinadas instituições financeiras, gerando, ainda de acordo com o Iedi, “desdobramentos negativos sobre a estabilidade financeira”, levando à falência, em março deste ano, do Silicon Valley e do Signature Bank, dois bancos regionais dos Estados Unidos. A crise desembarcou na Europa, “levando ao colapso da confiança em um banco de atuação global ‘too big to fail’ (grande demais para quebrar, numa tradução livre), o Credit Suisse”, registra o instituto.

Balanço

  • Ainda que a ação imediata e, na visão do Iedi, “ousada” dos governos estadunidense e suíço tenham possivelmente evitado, conforme o FMI, uma crise financeira de alcance global, as condições financeiras em todo o mercado internacional de crédito tornaram-se “ainda mais adversas”, com o risco de instabilidade financeira ainda presente.
  • O fundo, na verdade, chegou a ajustar ligeira e modestamente sua previsão inicial, que contemplava crescimento de 2,9% para este ano, reduzindo a projeção em 0,1 ponto percentual no panorama da economia global divulgado em abril, por conta do ligeiro corte nas projeções para as economias emergentes e em desenvolvimento, que tiveram a taxa revisada pela FMI de 4,0% para 3,9%. “O quadro desenhado pelo fundo pressupõe que as turbulências no setor financeiro foram contidas e, com isso, não haverá impacto significativo sobre a atividade econômica nem em 2023 nem em 2024”, avalia o Iedi.
  • Se valem de alguma coisa, as projeções daquelas instituições sugerem que a taxa de crescimento esperada para 2024 não deverá retomar os níveis de 2022, com avanços entre 2,7% e 3,0% nas estimativas, respectivamente, do Banco Mundial e do FMI. Para as economias avançadas, o crescimento estimado, no caso do fundo, saiu de 1,2% para 1,3% (lembrando que o crescimento havia sido de 2,7% em 2022).
  • A melhoria modestíssima valeu tanto para a economia dos EUA quanto para os países da área do Euro: a previsão de crescimento, naquela mesma ordem, passou de 1,4% e de 0,7% para 1,6% e 0,8% – indicando que as principais economias europeias continuariam a enfrentar dificuldades maiores para sustentar seu crescimento. O PIB havia crescido 2,1% e 3,5% nos EUA e na área do Euro em 2022. Para 2024, espera-se nova desaceleração para os EUA, com variação esperada de 1,1% pelo FMI. Na área do Euro, o incremento tende a ser mais alentado, próximo a 1,4% em 2024.
  • O FMI antecipa apenas leve desaquecimento para as economias emergentes e em desenvolvimento, graças especialmente à China, com o crescimento saindo de 4,0% para 3,9%. A economia chinesa deve crescer 5,2% neste ano diante de 3,0% em 2022. Na região da América Latina e Caribe, o desempenho piora, puxado para baixo pelo Brasil e pelo México (incluindo-se nessa relação muito provavelmente também a Argentina, que o FMI não divulgou suas previsões para o país vizinho).
  • A economia brasileira tende a reduzir seu crescimento de 2,9% no ano passado para 0,9% neste ano, com o México saindo de 3,1% para 1,8%.
  • Como reflexo da desaceleração da demanda mundial, as projeções do fundo apontam redução no nível de preços das commodities, que haviam registrado fortes altas em 2021 e 2022. “Projeta-se que a cotação do petróleo cru registrará quedas de 24,1% em 2023 e de 5,8% em 2024. Já os preços das commodities não-energéticas seguirão praticamente estáveis” registra o Iedi.
  • O baixo crescimento, mais uma vez, tenderá a influenciar num avanço mais lento do comércio mundial, que sairia de um crescimento de 5,1% no ano passado para um avanço de 2,4% neste ano, com efeitos obviamente sobre as exportações brasileiras. O FMI parece mais pessimista em relação à inflação global, estimada em 7,0% neste ano, frente a 8,7% em 2022. De toda forma, ainda de acordo com o fundo, em torno de 76% das economias “devem registrar desinflação em 2023”, mas com taxas inflacionárias acima das metas para 93% delas.