Especialistas propõe novo sistema para pesquisa e inovação no campo

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 21 de novembro de 2023

O Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária passará nos próximos meses por um processo amplo de reestruturação, com o objetivo de reforçar investimentos no setor e acelerar a geração de inovações que tornem mais sustentáveis os sistemas de produção de alimentos no País. Formado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), organizações estaduais de pesquisa, universidades, organizações públicas e privadas com atuação no setor, o sistema deve se consolidar como “uma grande plataforma colaborativa, integrada e articulada com o setor produtivo”, resume Clenion Pillon, diretor de pesquisa e inovação da Embrapa. A 

comissão de cinco especialistas criada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para reformular o sistema, sob liderança do ex-presidente da Embrapa, Sílvio Crestana, entregou seu relatório ao ministério no começo de outubro, segundo Pillon.

A proposta é assegurar maior robustez ao sistema e já está sendo discutida internamente pela Embrapa, que ao mesmo tempo iniciou o processo de atualização de seu planejamento estratégico. As mudanças de rumo começaram antes, no entanto. Neste ano, o orçamento da empresa para ações de pesquisa, desenvolvimento e inovação saltou praticamente cinco vezes, saindo de apenas R$ 20,0 milhões no passado para algo próximo a R$ 100,0 milhões, lembra Pillon. Além disso, a nova diretoria executiva da Embrapa negociou o ingresso da empresa no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), assegurando o acesso a quase R$ 985,0 milhões, dos quais R$ 150,0 milhões serão direcionados para as organizações estaduais de pesquisa agropecuária. “Isso vai nos permitir fazer uma modernização dos nossos laboratórios, dos nossos campos experimentais. Há muito tempo a Embrapa não acessava recurso tão importante”, anota Pillon.

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Agricultura de conservação

Neste momento, a empresa desenvolve um robusto portfólio de projetos voltados para a agricultura de conversação, como estratégia para entregar tecnologias que permitam ao agronegócio enfrentar as mudanças no clima e produzir mais alimentos de forma sustentável, sem pressionar os biomas. Além de segurança alimentar, acrescenta Pillon, o propósito é assegurar soberania na produção de alimentos e ainda na área do conhecimento aplicado à agropecuária. A área de melhoramento genético desenvolve 93 projetos para a agricultura e a pecuária. A plataforma de bioinsumos, envolvendo bioinoculantes, biofertilizantes, biofungicidas e outros produtos de base biológica, prossegue Pillon, inclui em torno de 110 projetos para desenvolvimento de mil insumos para uso agrícola.

Balanço

  • O desenvolvimento de bioinsumos, entre outros propósitos, busca reduzir a dependência a fertilizantes importados. “Até temos segurança alimentar, já que produzimos 1,5 tonelada de grãos por habitante/ano diante de apenas meia tonelada na década de 1970. Mas não temos soberania alimentar”. O uso eficiente da água pela agropecuária, da mesma forma, ocupa espaço relevante na estratégia da Embrapa, o que inclui sistemas de reservação, conservação e utilização eficiente de recursos hídricos.
  • A necessidade de dar maior visibilidade aos produtores sobre os resultados a campo dos produtos biológicos aproximou a Corteva Agriscience da startup Auravant, responsável pelo desenvolvimento de uma plataforma de monitoramento de plantios por meio de imagens de satélites. No momento, detalha Cristiane Delic, líder do portfólio de biológicos da Corteva Agriscience para o Brasil e Paraguai, 48 propriedades estão sendo monitoradas “para avaliar diferenças vegetativas nas áreas de milho onde foram aplicadas as soluções biológicas”.
  • Metade daquelas áreas recebeu um fixador biológico de nitrogênio foliar, que recorre à bactéria Methylobacterium symbioticum para converter o nitrogênio disponível no ar em nitrogênio amônio para o milho durante todo o ciclo de vida da planta. As demais 24 áreas receberam um inoculante solubilizador que aumenta a disponibilidade de fósforo retido no solo e na matéria orgânica para culturas de milho e soja.
  • A tecnologia incorpora duas cepas distintas e exclusivas de bactérias – Bacillus subtilis e Bacillus megaterium –, desenvolvidas por pesquisadores da Embrapa nos últimos 18 anos, que favorecem a solubilização do fósforo, tornando-o disponível para a planta, “maximizando sua eficiência nutricional por meio de melhor aproveitamento da adubação fosfatada”, descreve Cristiane. Realizada neste ano, a primeira rodada em campo mostrou um aumento na produtividade de 7,5 sacas por hectare nas áreas monitoradas, quando comparadas aos cultivos sem a aplicação dos mesmos produtos biológicos. 
  • Fundada em fevereiro de 2022, a startup InEdita Bio desenvolveu uma rota tecnológica inovadora no uso de enzimas nuclease para a edição genômica de plantas e já depositou dois primeiros pedidos de patente na United States Patent and Trademark Office (USPTO), agência norte-americana de registro de marcas e patentes. Os processos, ainda sob sigilo, conforme adianta o biólogo Paulo Arruda, CEO da InEdita e coordenador do Centro de Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas da Unicamp, envolvem novas variedades de milho e soja resistentes a pragas e doenças.
  • Em parceria com a Vesper Ventures, a InEdita instalou seu laboratório de pesquisas em Florianópolis, no mesmo edifício que abriga o fundo, apostando numa interação maior entre cientistas e investidores, na visão de Arruda. A conciliação entre a necessidade de produzir alimentos em larga escala e preservar o meio ambiente, entende ele, passa pelo aumento da produção por hectare cultivado e a edição genômica deve contribuir duplamente, ao promover ganhos de produtividade e reduzir o uso de fertilizantes e pesticidas de origem química. Na sua previsão, as primeiras variedades de soja e milho resistentes respectivamente à ferrugem e à lagarta produzidas pela InEdita deverão iniciar a fase de testes de campo entre o final de 2024 e começo de 2025.