Mudanças climáticas começam a afetar o comércio global marítimo

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 18 de novembro de 2023

As mudanças no clima global, determinadas pelo aumento das temperaturas médias como resultado direto de intervenções humanas em todo o planeta, vêm desencadeando eventos climáticos devastadores em série e impactos em cadeia sobre a economia, afetando mesmo os fluxos do comércio internacional. Responsável por quase 5% do comércio marítimo global, num exemplo mais recente, o Canal do Panamá enfrenta a pior seca em seus 143 anos de história, o que derrubou os níveis de água em uma das principais ligações entre os oceanos Atlântico e Pacífico para índices críticos, segundo relatório recentemente elaborado por economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Nos dados do fundo, perto de mil navios cruzam canal mensalmente, movimentando em torno de 40,0 milhões de toneladas de bens e mercadorias. Esse fluxo terá que ser reduzido aproximadamente pela metade até fevereiro do próximo ano, numa limitação imposta pela administração do canal exatamente para assegurar a “segurança, eficiência e competitividade” da operação. No Aviso às Companhias de Navegação n.º A-48-2023, a administração do canal comunicou uma escala de reservas a vigorar a partir deste mês de novembro, autorizando o trânsito de 25 navios por dia entre os dias 3 e 7 de novembro, reduzindo esse número para 24 diariamente entre os dias 8 e 30 e limitando a trânsito a 22 embarcações em dezembro e a 20 em janeiro, também diariamente. A partir de 1º de fevereiro, o trânsito estará limitado a 18 navios por dia, o que se compara com uma média diária de 36 embarcações em tempos de normalidade.

Reserva mínima

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Conforme o FMI, outubro foi o mês mais seco desde que esse tipo de registro foi iniciado, há 73 anos, como efeito do fenômeno El Niño, num processo agravado pela tendência de aquecimento global, afetando “gravemente o sistema de reservatórios” que alimentam o canal, reduzindo a disponibilidade de água. Naquele mês, a precipitação foi 41% menor do que a média histórica, atingindo o Lago Gatún e reduzindo o reservatório para “níveis sem precedentes para esta época do ano”, registra o FMI. Detalhe nada desprezível: a região está em plena época de chuvas. “Portanto, faltando aproximadamente 50 dias para o final da estação chuvosa, o canal e o país (Panamá) enfrentam o desafio de iniciar a próxima estação seca com uma reserva mínima de água, que deve garantir o abastecimento a mais de 50% da população e, ao mesmo tempo, tempo, manter as operações da hidrovia interoceânica”, anota o fundo.

Balanço

  • As restrições impostas pela seca, nas contas do FMI, causaram uma redução nos fluxos de cargas pelo canal de aproximadamente 15,0 milhões de toneladas, com navios sendo obrigados a despender seis dias a mais para cruzar a via. “Os portos do Panamá, Nicarágua, Equador, Peru, El Salvador e Jamaica são os que mais sofrem com estes atrasos, com 10% a 25% do total dos seus fluxos comerciais marítimos afetados. Mas os efeitos da seca são sentidos em lugares tão distantes como a Ásia, a Europa e a América do Norte”, ressalta o fundo, antecipando efeitos em cadeia sobre o comércio global enquanto persistirem as restrições ao trânsito de embarcações ao longo do canal.
  • No texto divulgado na quarta-feira, 15, no Blog do FMI, economistas da instituição observam ainda que “no contexto das alterações climáticas, as secas, as inundações, as tempestades tropicais e outras catástrofes estão a tornar-se mais comuns e representam uma séria ameaça às infraestruturas marítimas”.
  • A despeito dos problemas gerados pelo aquecimento global no transporte marítimo, a tendência sugere que o Brasil deverá exportar volumes recordes de grãos neste ano, conforme dados da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), baseados nos dados de embarques agendados nos portos brasileiros. Somando as vendas externas de soja em grão, farelo de soja, milho e trigo, as exportações acumuladas entre janeiro e outubro já foram maiores do que o total embarcado ao longo dos 12 meses do ano passado e novembro sinaliza novo avanço.
  • Nos primeiros 10 meses deste ano, as exportações daqueles cereais atingiram 155,345 milhões de toneladas, em torno de 6,3% acima das 146,101 milhões de toneladas despachadas para o mercado internacional entre janeiro e dezembro do ano passado. Em novembro, a considerar os manifestos de carga e a programação dos portos, mais 15,837 milhões de toneladas devem deixar o País rumo principalmente à China, Japão, Vietnam, Irã e outros mercados.
  • Para comparar, em novembro do ano passado, os embarques havia somado perto de 8,853 milhões de toneladas. Como resultado, haveria um salto de quase 80% em novembro deste ano, sob a liderança da soja. As vendas externas do grão tendem a alcançar 5,107 milhões de toneladas em novembro, o que significaria um salto de 166,2% diante de pouco menos do que 1,919 milhão de toneladas em novembro do ano passado.
  • No acumulado nos 11 primeiros meses deste ano, as exportações de soja em grão devem alcançar 98,108 milhões de toneladas, com previsões que sugerem um volume próximo de 100,0 milhões de toneladas exportadas até o final deste ano, frente a 77,805 milhões de toneladas em 2022. Até novembro do ano passado, haviam sido embarcadas 76,289 milhões de toneladas, indicando que as vendas do grão tendem a aumentar 28,6% nos 11 meses iniciais deste ano. Perto de 74,0% da soja terão a China como destino.
  • As vendas externas de milho, também considerando os primeiros 11 meses de cada ano, devem ser elevadas de 37,406 milhões de toneladas em 2022 para 50,427 milhões de toneladas neste ano, em alta de 34,8%. Ao longo de todo o ano passado, o País havia exportado 44,696 milhões de toneladas.