Filiais brasileiras no exterior ajudam a engordar investimento “estrangeiro”

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 25 de outubro de 2022

O investimento realizado por estrangeiros diretamente no País cresceu vigorosamente no terceiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado, saltando de US$ 16,473 bilhões para US$ 25,758 bilhões, resultando numa variação de 56,36%. Nessa comparação, entraram a mais no Brasil em torno de US$ 9,285 bilhões teoricamente trazidos por estrangeiros para explorar negócios aqui dentro. Por que teoricamente? Precisamente porque todo o crescimento pode ser explicado, até com sobras, pelos bilhões de dólares injetados por filiais brasileiras no exterior em suas matrizes no País – o que só ganha a definição de “investimento estrangeiro” porque os dólares vieram de fora, de negócios tocados no exterior por empresas com sede no Brasil.

Levando-se em conta a conjuntura doméstica e a escalada dos juros desde março do ano passado, não se pode desprezar o risco de esses dólares terem entrado no País para lucrar com o diferencial entre as taxas de juros aqui dentro e aquelas praticadas lá fora. Segundo dados do Banco Central (BC), entre julho e setembro do ano passado, as matrizes brasileiras haviam destinado a suas filiais no exterior em torno de US$ 2,451 bilhões. Quer dizer, esses dólares deixaram o Brasil, ajudando a reduzir o investimento estrangeiro total aqui dentro.

No terceiro trimestre deste ano, entraram perto de US$ 10,628 bilhões a título de investimentos realizados pelas filiais em suas matrizes. Registrou-se uma reviravolta nesta área, com os dólares passando a engrossar o investimento “estrangeiro” total num total de US$ 13,079 bilhões. Descontados os dólares das filiais, o restante do investimento direto sofreu baixa de 20,0%, caindo de US$ 18,924 bilhões para US$ 15,130 bilhões, numa perda de US$ 3,794 bilhões entre o terceiro trimestre do ano passado e igual período deste ano.

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Concentração

Não por coincidência, o crescimento concentrou-se, até aqui, precisamente no terceiro trimestre. Quando se avaliam os dados acumulados em todo o período, quer dizer, entre janeiro e setembro, o investimento cresceu 63,2% na comparação entre 2021 e 2022, subindo de US$ 43,296 bilhões para US$ 70,666 bilhões (ou seja, US$ 27,370 bilhões a mais). Nos mesmos nove meses, as filiais com matrizes no Brasil, que haviam recebido US$ 2,586 bilhões em 2021, “investiram” US$ 4,250 bilhões em suas matrizes, numa “virada” equivalente a US$ 6,836 bilhões. Assim, essa modalidade foi responsável por um quarto do aumento acumulado pelo investimento direto no período analisado.

Balanço

  • Os dados acumulados entre janeiro e setembro mostram que as filiais continuavam a receber dólares de suas matrizes até pelo menos junho. Contabilizados os números do BC, as filiais haviam “desinvestido” em torno de US$ 6,378 bilhões no primeiro semestre. A mudança de sinais ocorreu no terceiro trimestre, concentrando-se precisamente em setembro, quando esse tipo de “investimento” atingiu US$ 5,930 bilhões, representando 55,8% de todo o saldo registrado no trimestre.
  • O déficit na conta de transações correntes, que resume as relações entre o Brasil e o restante do mundo, cresceu também fortemente nos nove meses iniciais deste ano em relação a idêntico período do ano passado, saltando de US$ 11,356 bilhões para US$ 29,583 bilhões. O crescimento foi de 160,5% nessa comparação, puxado principalmente pelo aumento nas remessas de lucros e dividendos auferidos aqui dentro e distribuídos na fora.
  • As remessas de lucros e dividendos resultantes de investimentos diretos, ou seja, gerados pelas operações e negócios conduzidos no País por empresas estrangeiras, cresceram 56,65% frente aos nove primeiros meses de 2021. Saltaram de US$ 14,351 bilhões para US$ 22,481 bilhões, quer dizer, em torno de US$ 8,130 bilhões a mais, o que representou 44,6% do aumento acumulado pelo déficit em transações correntes.
  • As remessas de ganhos com “investimentos em carteira” (ou seja, compra e venda de ações, títulos públicos e privados e outras operações no mercado financeiro) dobraram, passando de US$ 5,319 bilhões para US$ 10,686 bilhões – um aumento de 100,9% (mais US$ 5,367 bilhões). Na soma daqueles dois itens está a explicação para 74,0% do aumento no rombo em transações correntes.
  • No setor de serviços, o déficit aumentou de US$ 12,153 bilhões para US$ 19,849 bilhões, numa variação de 63,32% (acréscimo de US$ 7,696 bilhões). O avanço podia ser mesmo antecipado diante da liberação das atividades e deslocamentos de pessoas com a redução e mesmo eliminação das medidas de restrição e distanciamento social. A normalização crescente no transporte de cargas e de pessoas igualmente contribuiu para ampliar as despesas do País.
  • Os gastos líquidos com transporte, já excluídas eventuais receitas do País nesta área, mais do que dobraram no acumulado entre janeiro e setembro, subindo de US$ 2,757 bilhões para US$ 5,848 bilhões, numa alta de 112,1%. As viagens internacionais consumiram US$ 5,363 bilhões nos primeiros nove meses deste ano, quadriplicando em relação às remessas de US$ 1,326 bilhão realizadas no mesmo intervalo de 2021 para pagar despesas no setor. A variação, portanto, atingiu 304,45% entre aqueles dois períodos.
  • Embora em forte crescimento, o aumento do déficit em transações correntes deve ser relativizado por conta da conta de investimentos, que ainda supera o rombo em 2,39 vezes. O desempenho recente da balança comercial, no entanto, deveria ser fonte de preocupações neste momento. O saldo entre exportações e importações não saiu do lugar no acumulado até setembro e tem sofrido baixas num período mais recente, acionando um sinal amarelo nesta área.