Gasto do governo federal com juros salta 33% e investimento cai 12,5%

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 04 de outubro de 2022

As despesas com juros continuam a crescer de forma vigorosa ao longo deste ano na esfera federal, enquanto a conta dos investimentos continua a minguar. O comportamento desses dois indicadores deslinda em grande medida o real caráter da política econômica praticada pela equipe do ministro dos mercados e paraísos fiscais. De fato, a tendência expressa pelos dados oficialmente divulgados na semana que passou pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) deriva diretamente de decisões da mesma equipe, a pretexto, de um lado, de colocar em andamento uma suposta política de combate à inflação, por meio da escalada dos juros, e, de outro, uma política desastrada de obtenção de superávits primários a qualquer custo.

Apenas para registro, os saldos primários do Tesouro resultam da diferença entre receitas e despesas, com a exclusão da montanha de dinheiro gasta mensalmente com o pagamento de juros da dívida pública federal. Seguindo adiante, nos primeiros oito meses deste ano, o governo federal desembolsou perto de R$ 313,554 bilhões apenas para pagar juros aos donos da dívida pública, o que corresponde a 5,3 vezes mais toda a despesa realizada em igual período com o Auxílio Brasil turbinado.

No ano passado, os juros haviam consumido, entre janeiro e agosto, qualquer coisa ao redor de R$ 235,631 bilhões, a valores de agosto deste ano, atualizados com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Entre os dois períodos, a despesa com juros experimentou um salto de 33,07% em termos reais. Na mesma comparação, a despesa registrou elevação equivalente a R$ 77,923 bilhões, bem mais dos valores acrescidos na conta do Auxílio Brasil.

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Combinação deletéria

Aqui, há uma combinação deletéria para a tomada de decisões de investimento pelo setor privado. A alta das taxas de juros básicos obviamente encarece o custo do crédito para as empresas, especialmente nos recursos que deveriam financiar investimentos, desestimulando o setor privado. A queda do investimento público, da mesma forma, contribui para reforçar o desestímulo a decisões privadas nesta área. Ainda em valores reais, o investimento realizado entre janeiro e agosto deste ano sofreu baixa de 12,53% frente ao mesmo intervalo do ano passado, baixando de R$ 30,525 bilhões para R$ 26,701 bilhões, num corte de R$ 3,823 bilhões.

Balanço

  • Num parêntese, apenas para corrigir informações distorcidas veiculadas ao longo da campanha pelo primeiro turno das eleições presidenciais, as despesas com juros têm sido muito mais elevadas num período mais recente, sob o comando do ministro dos mercados e dos paraísos fiscais. As distorções poderiam ter sido evitadas quase a comparação tomasse períodos equivalentes no tempo, durante governos anteriores. Não foi o que ocorreu.
  • Entre janeiro de 2019 e agosto de 2022, as despesas com juros chegaram a consumir praticamente R$ 1,454 trilhão, a valores de agosto deste ano. Mas entre janeiro de 2003 e agosto de 2006, apenas para manter as mesmas bases, perto de R$ 1,077 trilhão foram desviados para o pagamento de juros. São valores excessivos? Sim. O dinheiro ajudou a amplificar a concentração de riquezas, favorecendo os donos do dinheiro e rentistas? Sim novamente. Mas os dados oficiais, da STN, mostram um aumento de 35,0% ao longo dos 44 meses iniciais do desgoverno instalado em Brasília.
  • Para tornar mais polêmica a comparação, nos mesmos 44 meses terminados em agosto de 2006, o governo federal acumulou um superávit primário de R$ 508,672 bilhões, o que se compara com o rombo superior a R$ 1,017 trilhão em igual período finalizado em agosto deste ano. Obviamente, a chegada da pandemia obrigou o setor público federal a incrementar gastos para combater o vírus e socorrer empresas e famílias.
  • Entre fevereiro de 2020 e agosto deste ano, os recursos destinados ao combate à Covid-19 somaram em torno de R$ 660,618 bilhões também a valores atualizados até agosto último. Descontados todos esses gastos, restaria ainda um déficit de aproximadamente R$ 357,0 bilhões. Fecha o parêntese.
  • Neste ano, Brasília tem celebrado os resultados positivos registrado pelo Tesouro, que refletem muito mais o salto nas receitas do governo realizado até aqui. Sempre no acumulado entre janeiro e agosto, com correção pelo IPCA, a receita líquida aumentou 13,08% ao passar de R$ 1,106 trilhão para quase R$ 1,251 trilhão, correspondendo a um incremento de R$ 144,668 bilhões.
  • A despesa total anotou variação real de apenas 2,59%, saindo de R$ 1,195 trilhão para R$ 1,226 trilhão. Houve, portanto, um acréscimo de R$ 30,938 bilhões. Como se percebe, o ganho de receita foi muitas vezes mais robusto do que os valores acrescidos às despesas, o que permitiu sair de um déficit primário de R$ 89,348 bilhões para um superávit de R$ 24,382 bilhões, numa reviravolta de R$ 113,731 bilhões.
  • A questão, já descrita neste espaço, é que grande parte dos ganhos na ponta das receitas está relacionada a recursos não recorrentes, quer dizer, que tendem a não se repetir nos anos seguintes. As receitas de concessões e permissões, dividendos e participações e aquelas derivadas da exploração de recursos naturais mais do que dobraram entre os oito primeiros meses do ano passado e o mesmo período deste ano, subindo de R$ 95,175 bilhões para R$ 200,376 bilhões (mais 110,5% em termo reais).
  • Esse tipo de receita trouxe mais R$ 105,201 bilhões para os cofres federais, enquanto a receita total, antes das transferências constitucionais aos Estados e municípios, registrou elevação correspondente a R$ 196,160 bilhões, saindo de R$ 1,361 trilhão para R$ 1,558 trilhão. Mais claramente, as receitas extraordinárias responderam por 53,6% do aumento total.