Inflação desaba, mas custo dos alimentos mantém-se em alta

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 10 de agosto de 2022

A redução de impostos e contribuições na antevéspera da campanha presidencial produziu os efeitos já antecipados pelos mercados, até com uma dose a mais de desafogo nas taxas de inflação, com a contribuição baixista trazida pelos preços dos combustíveis e pelas tarifas de energia elétrica residencial. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), fechou o mês de julho negativo em 0,68%, na menor taxa mensal desde o começo da série histórica, em janeiro de 1980, e ligeiramente inferior à queda de 0,64% projetada pelos mercados, na aferição feita semanalmente pelo Banco Central (BC).

Apesar de tudo, as pressões altistas continuam presentes, especialmente no setor de alimentação, refletindo em boa medida a entressafra no mercado de leite. Em parte, aquelas pressões tenderão a perder força um pouco mais à frente, com a chegada das chuvas por volta do final de setembro e começo de outubro, encerrando a entressafra na pecuária leiteira. Para os demais alimentos, no entanto, a força dos aumentos de preços só deverá refluir com a chegada da nova safra ao mercado, por volta de fevereiro ou março do próximo ano.

Até lá, diante do cenário de baixos estoques no mundo e da mais completa ausência de políticas de segurança alimentar aqui dentro, os preços devem continuar elevados, o que pode até não significar inflação em alta, mas certamente continuará representando uma fonte de incertezas e de empobrecimento relativo para as faixas de renda mais baixa da população, que já enfrentam fome ou demonstram incapacidade para suprir as necessidades diárias de suas famílias. O custo da alimentação no domicílio subiu 1,47% nas quatro semanas de julho, depois de anotar elevação de 0,63% em junho e de 1,12% nas quatro semanas encerradas em 13 de julho. A principal foco de alta veio do leite longa vida, que saltou 25,46% nos 30 dias de julho, acumulado alta de 77,84% nos sete primeiros meses deste ano. Sozinho, o leite longa vida contribuiu com quase 15,7% da inflação dos alimentos consumidos em casa no mês passado.

Continua após a publicidade

Maior peso

A alta nos custos dos alimentos e bebidas tem impactos diferentes conforme a faixa de renda avaliada, pesando mais sobre aquelas famílias de rendimentos mais baixos. No IPCA, que afere o custo de vida das famílias com renda entre um e 40 salários mínimos, a alimentação consome algo como 21,29% do orçamento familiar. O peso para as famílias com renda entre um e cinco salários mínimos, que formam a amostragem coberta pelas pesquisas de preços para cálculo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), chega a 24,25%. Hipoteticamente, uma ata de 10% nos preços dos alimentos produziria uma “inflação” em torno de 2,1% entre as famílias com renda de até 40 salários, diante de 2,4% para as mais pobres. As distorções são mais amplas quando se considera que a queda recente da inflação se deveu em grande medida à redução nos preços da gasolina, o que favoreceu em proporção maior aquelas famílias com renda média mais elevada.

Balanço

  • Conforme já anotado neste espaço, a queda dos impostos sobre combustíveis e energia terá impacto uma única vez sobre os índices inflacionários, mesmo porque dificilmente o desgoverno em Brasília conseguirá impor novas reduções caso os preços do petróleo voltem a dar sinais de alta no mercado internacional, levando a Petrobrás a rever os preços cobrados das refinarias. Por enquanto, aqueles preços continuam apontando para baixo, ainda assim em relação aos níveis mais elevados registrados a partir do final de fevereiro. O barril do petróleo tipo Brent, extraído no Mar do Norte, uma das referências para o mercado, registrou queda de quase 21,0% nos preços médios entre a primeira semana de junho e igual período de agosto, baixando de US$ 120,01 para US$ 96,43.
  • Entre janeiro e o início de junho deste ano, a cotação havia registrado elevação de 49,2% em meio ao conflito entre Rússia e Ucrânia. Num lembrete acerca da volatilidade desse mercado, sujeito a pressões de oferta e demanda e, mais do que qualquer outra commodity, a incertezas geopolíticas, o barril do tipo Brent acumulava alta de 36,61% em 12 meses até o começo deste mês.
  • Excluídos os subitens combustíveis e energia, a taxa de variação média dos demais preços anotou oscilação menos relevante, saindo de 0,71% nas quatro semanas finalizadas em 13 de julho para 0,69% nas quatro semanas do mês passado, mas abaixo da “inflação” de 0,81% observada em junho.
  • Na média dos chamados “núcleos” do IPCA, indicadores que excluem produtos e serviços mais voláteis e ainda preços com maiores altas e quedas, a taxa de variação saiu de 0,89% em para 0,53% em julho, na estimativa do Itaú BBA. O índice de difusão, que “mede” o percentual de bens e serviços em alta em relação ao total de itens pesquisados pelo IBGE, também anotou melhora, saindo de 78,2% em abril para 66,6% em junho e daí para 62,9% no mês passado.
  • Também divulgada ontem, a pesquisa mensal do IBGE sobre a produção industrial nos Estados mostrou recuo de 0,4% em Goiás na passagem de maio para junho, mas apontou avanço de 3,5% em relação a junho do ano passado, no segundo mês de elevação após dois meses de perdas. No primeiro semestre, a indústria goiana avançou 1,6% frente à primeira metade de 2021, quando a produção havia sofrido baixa de 4,1% no Estado.
  • Três setores foram responsáveis pelo incremento do setor na comparação com junho de 2021: montadoras de veículos, num salto de 49,6%; produtos minerais não metálicos, como cimento, areia, brita, com avanço de 32,5%; e a indústria de medicamentos, que apresentou alta de 21,8%. Ainda assim, a produção em Goiás mostrava-se 2,5% abaixo dos níveis de fevereiro de 2020, antes da pandemia, encolhendo 7,2% frente a outubro de 2019, melhor momento para a indústria na série histórica do IBGE.