Juros e inflação em alta fazem vendas do varejo derraparem

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 14 de julho de 2022

A política de arrocho ao crédito, refletida na elevação da taxa básica de juros para 13,25% desde meados de junho, partindo de apenas 2,0% ao ano em 17 de março do ano passado, já parece influenciar para baixo as vendas de bens e mercadorias que mais dependem de financiamento no comércio varejista. Esse comportamento tem sido acirrado ainda pela inflação persistente, que tem contribuído para corroer os salários e reduzir o poder de compra das famílias.

Os números do comércio em maio vieram muito mais modestos do que no mês imediatamente anterior em todo o País e se mantiveram em terreno negativo em Goiás, segundo a pesquisa mensal realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Até aqui, como ressalta o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento da Indústria (Iedi), a grande exceção tem sido o setor de serviços, já que tanto a produção industrial quanto a venda de bens têm apresentado resultados “anêmicos” e “ficaram estagnadas em maio último”.

Na hipótese trabalhada pelo instituto, o desempenho relativamente melhor dos serviços pode estar associado, em primeiro lugar, à normalização das atividades naquela área, um dos últimos setores a conseguir voltar a operar dentro da “nova” normalidade ditada pela pandemia. Num segundo ponto, anotado igualmente pelo Iedi, os serviços em geral “são consumidos proporcionalmente mais por famílias de maior renda”, supostamente menos afetadas pelo desgaste causado sobre a renda pela onda inflacionária ou pelo menos com reservas para atravessar esse período.

Continua após a publicidade

Em reforço a seu argumento, o Iedi avalia que inflação mais alta “tem prejudicado o poder de compra, sobretudo, das famílias de menor renda, cuja cesta de consumo é formada basicamente por bens, e o aumento recente das taxas de juros atinge em cheio os mercados de bens duráveis e alguns semiduráveis, cujos mercados dependem mais do crédito”. O aperto ao crédito, nesse sentido, seria um dos fatores atuando para derrubar as vendas de móveis, eletrodomésticos e de veículos, mercadorias de valor agregado mais alto e que dependem mais da oferta de empréstimos e financiamentos pelo sistema financeiro, que começa a amarrar a liberação de crédito às famílias na medida em que seu custo sobe e os riscos de inadimplências tornam-se mais visíveis.

Varejo restrito

As vendas do varejo restrito, que inclui estabelecimentos tipicamente varejistas, como hiper e supermercados, postos de combustíveis, lojas de vestuário, eletrodomésticos, móveis, magazines, farmácias, livrarias e papelarias, saíram de uma variação positiva de 0,8% na saída de março para abril e derraparam em maio, numa oscilação de 0,1% em relação ao mês imediatamente anterior. Na prática, não houve crescimento. Em Goiás, as vendas naquele mesmo setor recuaram 0,8% em maio depois de queda de 1,3% em abril, já descontados fatores sazonais (como feriados, num exemplo).

Balanço

  • Na comparação mês a mês, as séries de dados do IBGE não trazem dados desagregados por segmento do varejo por Estado, ao contrário do que ocorre com os números nacionais, consolidados por setor. Na passagem de abril para maio, em todo o País, as vendas de combustíveis, tecidos, vestuário e calçados, artigos farmacêuticos e cosméticos e de produtos de livraria e papelaria experimentaram altas de 2,1%, de 3,5%, de 3,6% e de 5,5% (depois de terem caído 5,2% em abril).
  • Da mesma forma, lojas de equipamentos e materiais para escritório, artigos de informática e de comunicação registraram elevação de 2,0%, o que não repôs o tombo de 5,7% registrado um mês antes. As vendas no segmento de hiper e supermercados, que chegaram a baixar 0,9% em abril, cresceram 1,0% em maio, encerrando um período de três meses virtualmente sem crescimento efetivo, já que não haviam saído do lugar em março.
  • No varejo ampliado, que inclui ainda lojas de materiais de construções, concessionárias de veículos e motos e lojas de autopeças, a taxa de crescimento desacelerou ao passar de 0,5% em abril para 0,2% em maio, com recuo de 0,2% nas concessionárias e baixa de 1,1% para materiais de construção.
  • Como relembra o Iedi, o comércio praticamente não reagiu às medidas adotadas pelo desgoverno a partir de março. Numa tentativa de “dinamizar a demanda das famílias”, foi autorizada nova liberação de recursos das contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e a antecipação do pagamento do 13º salário de aposentados e pensionistas da Previdência. As estimativas iniciais sugeriam um impacto ao redor de R$ 86,7 bilhões. “Inflação, juros e incertezas podem ter corroído boa parte destes estímulos”, sugere o instituto.
  • Na comparação com maio do ano passado, as vendas recuaram 0,2% no varejo restrito e 0,7% no comércio varejista ampliado, com perdas de 0,5% nos supermercados, tombo de 12,6% para as lojas de móveis e eletrodomésticos, quedas de 7,7% nas lojas de materiais de construção e de 7,1% para artigos de uso pessoal e doméstico. Farmácias, papelarias e postos de combustíveis anotaram altas de 9,2%, de 25,8% e de 7,1%, com elevação de 8,3% para vestuário e calçados – lembrando que as vendas de combustíveis e de artigos de papelaria vinham em baixa acentuada até recentemente.
  • Em Goiás, o comércio varejista tradicional encolheu 1,4% em maio, devolvendo toda a alta registrada em abril, com baixas de 8,3% nas vendas de combustíveis, de 5,4% no setor de hiper e supermercados e de 9,4% nas lojas de móveis e eletrodomésticos. O varejo amplo conseguiu respirar, avançando 2,3% em função de um incremento de 12,4% nas vendas de veículos, motos e autopeças, já que o setor de materiais de construção mergulhou em queda de 13,6%.