Massa de rendimentos do trabalho atinge menor nível em cinco anos

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 03 de novembro de 2021

Puxado pela informalidade e por colocações de baixa qualificação, como mostrou a coluna (O Hoje, 28.10.21) ao analisar os números trazidos pela mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o avanço do emprego não tem sido suficiente para assegurar retomada proporcional dos salários. Na verdade, como mostra o acompanhamento do IBGE, a massa de rendimentos totais habitualmente recebidos pelos trabalhadores tem murchado e a massa efetiva (que soma os rendimentos reais efetivamente recebidos) ainda está longe de repor as perdas sofridas ao longo da pandemia.

Nitidamente, o tipo de ocupação que o mercado de trabalho tem conseguido oferecer tem sido insuficiente para engrenar um processo de recomposição real das perdas salariais e, de fato, tem causado queda no rendimento médio. A dinâmica (ou, mais apropriadamente, o baixo dinamismo) no mercado de trabalho deflagrou um processo de redução dos rendimentos, mesmo em termos nominais, agravado severamente pela escalada da inflação, que tem atingido mais duramente as faixas de renda mais baixa.

A desidratação da renda e do emprego, cabe anotar mais uma vez, tende a ser acelerada como resultado do “choque de juros” detonado pelo Comitê de Política Monetária (Copom), que aumentou a taxa básica de 2,0%, em vigor até o começo da segunda metade de março, para os atuais 7,75% ao ano. Na reunião programada para os dias 7 e 8 de dezembro, o Copom já antecipou nova elevação de 1,5 ponto de porcentagem, o que elevaria os juros básicos para 9,25% – a depender do comportamento da atividade econômica e, sobretudo, de como os preços tenderão a reagir daqui em diante.

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Arrocho

Apenas para relembrar, na comparação entre os trimestres finalizados em agosto de 2020 e no mesmo mês deste ano, a informalidade respondeu por praticamente 71,1% do crescimento observado para o total de ocupações. Na mesma comparação, quase três em cada quatro novos empregos criados foram ocupados por trabalhadores de qualificação mais baixa (mais precisamente, a participação chegou a 72,5%). Esse contingente passou a representar 52,5% do total de ocupados frente a 50,4% no ano passado.

Essa combinação de fatores – tibieza do mercado de trabalho e aceleração inflacionária – reduziu a massa de rendimentos em 0,7% em termos reais, de R$ 220,731 bilhões para R$ 219,164 bilhões entre o trimestre encerrado em agosto de 2020 e o mesmo intervalo deste ano, numa perda de R$ 1,567 bilhão. Foi o menor valor real registrado para o mesmo trimestre desde 2016, quando a massa salarial habitual havia somado R$ 217,802 bilhões.

Balanço

  • A série de dados da PNADC sugere que nem mesmo o auxílio emergencial e a sua versão mitigada oferecida neste ano pelo governo conseguiram repor as perdas impostas pela pandemia e pela crise econômica causada primordialmente pelos efeitos da crise sanitária e das medidas adotadas para tentar conter o vírus. A massa habitual havia alcançado R$ 239,125 bilhões trimestre entre setembro e novembro de 2019 e já vinha registrando certo recuo mesmo antes da chegada da pandemia, atingindo R$ 237,731 bilhões entre dezembro daquele ano e fevereiro de 2020.
  • A explosão dos casos de contágio e das mortes de março em diante, seguida de medidas de distanciamento adotadas pelos governos estaduais, derrubou a atividade e afetou o emprego, reduzindo a massa de rendimentos habitualmente recebidos pelos trabalhadores para R$ 220,731 bilhões no trimestre entre junho e agosto do ano passado. Comparada a novembro de 2019, a queda chegou a 7,7%, com perdas de R$ 18,394 bilhões a valores de agosto deste ano.
  • No trimestre seguinte, quer dizer, entre setembro e novembro do ano passado, diante do relaxamento das medidas de distanciamento, a massa elevou-se ligeiramente para R$ 224,929 bilhões, numa variação de 1,9% e um acréscimo de R$ 4,198 bilhões frente aos três meses imediatamente anteriores. O ganho registrado, no entanto, correspondeu a apenas 22,9% das perdas registradas desde novembro de 2019.
  • Nos trimestres seguintes, a tendência de baixa voltou a prevalecer e a massa de rendimentos caiu mais 2,9%, até R$ 218,340 bilhões nos três meses encerrados em abril deste ano. O valor chegou a apresentar variação de 0,8% no trimestre março-maio, o que elevou a soma de todos os rendimentos habitualmente recebidos pelos trabalhadores para R$ 220,085 bilhões.
  • Na medição mais recente, entre junho e agosto, a massa de rendimentos recuou 0,4% e alcançou aqueles R$ 219,164 bilhões registrados mais acima. Em relação ao trimestre setembro-novembro de 2019, no entanto, as perdas sofreram piora adicional, atingindo R$ 19,961 bilhões, num tombo de 8,4% em termos reais.
  • A massa de rendimentos efetivos chegou a despencar 24,9% entre o trimestre finalizado em janeiro de 2020 e o trimestre maio-julho do ano passado, desabando de R$ 270,147 bilhões para R$ 202,979 bilhões – o menor valor em toda a série histórica iniciada em 2012. Muito provavelmente favorecida pelo pagamento do auxílio emergencial, a massa efetiva chegou a saltar 18,3% desde seu nível mais baixo até o trimestre entre novembro de 2020 e janeiro deste ano, quando alcançou R$ 240,090 bilhões – num acréscimo de R$ 37,111 bilhões (o que correspondeu, por sua vez, a 55,25% das perdas anotadas a partir de janeiro de 2020).
  • O fim do auxílio, ao que parece, determinou queda de 9,6% entre janeiro e o trimestre encerado em abril deste ano, com a massa efetiva chegando a R$ 216,950 bilhões. O pagamento do auxílio mitigado a um número mais reduzido de famílias do que na fase anterior levou a ligeira elevação da massa efetiva, para R$ 220,14 bilhões no trimestre junho-agosto (alta de 1,5%). Na comparação com novembro de 2019 a janeiro de 2020, persiste uma perda de R$ 50,003 bilhões, refletindo o tombo de 18,5% acumulado desde lá.