Nova política industrial fixa metas e define rumos para a reindustrialização

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 23 de janeiro de 2024

A Nova Indústria Brasileira (NIB), um conjunto ambicioso de medidas para promover a reindustrialização do País anunciado ontem pelo governo federal, parte das quais já em andamento, despertou a “ira sagrada” de conservadores, analistas alinhados com as correntes mais retrógradas do pensamento econômico, consultores manjados e lobistas – palavras sinônimas em vários casos. Em síntese, a “velhacaria” de sempre. A grande imprensa, em sua cegueira habitual, recebeu o programa com paus e pedras, classificando-o como uma tentativa de reeditar políticas “velhas”, intervencionistas e fadadas ao fracasso, pois não teriam dado certo lá atrás, sempre na sua visão distorcida.

Apenas para relembrar, os mesmos analistas não tiveram o menor pudor ao bombardear o anúncio da descoberta das reservas do pré-sal, “denunciado” como mero fruto de propaganda, uma enganação destinada a enganar trouxas e engabelar investidores. Uma “enganação” que, ano passado, trouxe para o País em torno de US$ 55,6 bilhões em exportações. Objetivamente, a nova política industrial combina políticas de compras governamentais, com prioridade para a produção local, linhas de crédito a juros competitivos internacionalmente, recursos não reembolsáveis para fazer frente aos riscos inerentes a investimentos em inovação, além de projetos de inserção “qualificada” das empresas no mercado internacional e de desburocratização. O objetivo central é promover o que os especialistas têm chamado de “neoindustrialização”, baseada em inovação, ganhos de produtividade e numa indústria mais verde, alinhada à transição energética colocada em marcha globalmente diante da necessidade de conter o aquecimento e as mudanças no clima.

Novidades

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Há pelo menos três novidades a serem consideradas na política recém-anunciada, a começar por uma diferença básica em relação a outros programas na mesma linha: a NIB nasce já com metas definidas e recursos disponíveis. Outra, já mencionada, diz respeito à decisão de utilizar as compras do setor público como ferramenta para estimular a produção local e, portanto, a geração de empregos aqui dentro. Não se trata exatamente de uma novidade, já que o caminho foi tentado outras vezes, mas timidamente, no caso brasileiro ao menos, já que países “ comunistas” como Estados Unidos, Alemanha, Japão e outros historicamente sempre recorreram às compras realizadas por seus governos para apoiar a produção industrial nos seus países. E a terceira diz respeito à execução, que ficará a cargo de instituições públicas e privados, a exemplo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii).

Balanço

  • Ao contrário de uma das críticas que têm frequentado o noticiário recorrentemente, a nova política industrial não é uma formulação “tecnocrática” e “autoritária”, nascida da cabeça de uns poucos iluminados, mas resulta de meses de discussões no âmbito do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), composto por representantes do governo, sim, mas também do setor privado.
  • Da mesma forma, o governo e sua equipe não estão “reinventando a roda”. Pelo contrário. Seguem uma tendência e estratégias em plena aplicação nas maiores economias do planeta, envolvendo razões associadas à defesa nacional, à própria transição energética e à necessidade de reconquistar espaço perdido pelas indústrias em cada um daqueles países por diferentes motivos, mas principalmente por conta da “financeirização” da economia, que acabou expulsando empresas industriais, atraídas principalmente pela China.
  • Para relembrar, em agosto de 2022, o governo dos Estados Unidos lançaram o “Inflation Reduction Act”, com medidas protecionistas, sim, com intervenção do Estado, sim, e com recursos estimados então em US$ 369 bilhões, algo como 1,7% do Produto Interno Bruto (PIB) do país no mesmo ano, caso o investimento previsto fosse integralmente contratado e realizado em um único ano, o que obviamente não é o caso.
  • Mais ou menos na mesma época, a União Europeia lançou sua política industrial, com recursos ainda mais amplos, na faixa de € 800,0 bilhões, mais próximo de 5,0% do PIB da região.
  • A nova política, no caso brasileiro, trabalha com prazo até 2033, num horizonte mais longo, portanto, para reconverter a indústria e contribuir para seu ressurgimento no País, “com sustentabilidade e inovação”. Numa primeira fase, as seis “missões” definidas pela política, com metas específicas para cada uma, serão financiadas por recursos estimados em R$ 300,0 bilhões, qualquer coisa próxima a 2,8% do PIB, recursos que integram o Plano Mais Produção, gerido em conjunto pelo BNDES, pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e pela Embrapii.
  • A maior parte daqueles recursos, algo em torno de R$ 250,0 bilhões, serão mobilizados pelo BNDES. No ano passado, de acordo com o banco, já haviam sido aprovados R$ 77,5 bilhões para projetos agora consolidados na nova política industrial, dos quais R$ 67,0 bilhões serão financiados pelo banco e R$ 10,5 bilhões virão da Finep. Num detalhe adicional, o Programa Mais Inovação, parte do Plano Mais Produção, já está em andamento, tocado pelo BNDES e pela Finep, com financiamentos a juros de 2,0% ao ano mais a Taxa Referencial (TR), atualmente próxima de 1,76% também ao ano (perto de 3,8% em 12 meses) e ainda com recursos não reembolsáveis.
  • As metas da nova política industrial foram antecipadas ainda sem detalhamento no Plano de Ação 2024-2026, mas serão ainda submetidas ao CNDI nos próximos 90 dias. A definição das metas em detalhes será essencial para o sucesso da “neoindustrialização” buscada, mas terá que vir acompanhada de mecanismos de avaliação e de prestação de contas, como parece ser a intenção do Ministério de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic).