Serviços e setor externo explicam grande parte do avanço do PIB

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 03 de junho de 2022

O crescimento da economia no primeiro quarto do ano veio muito concentrado no setor de serviços, o que se explica pela liberalização das atividades nesta área, resultado, por sua vez, da maior circulação de pessoas depois de derrubadas as medidas de distanciamento em que vigoraram lá atrás e consequente incremento dos serviços presenciais. Adicionalmente, o avanço relativo refletiu a maior concentração da renda, o que aqueceu o consumo de serviços e de outros bens associados às faixas de rendimentos mais elevados. Em menor medida, registrou-se alguma melhoria no mercado de trabalho, sustentada em parte pelo crescimento das ocupações informais.

Num terceiro fator, a escalada das commodities nos mercados internacionais ajudou a alavancar as exportações, ao mesmo tempo em que as importações de bens e serviços entraram em baixa. As exportações líquidas (ou seja, excluídos os gastos com importações) teriam contribuído para agregar em torno de 0,5% ao Produto Interno Bruto (PIB) trimestral, que anotou variação de 1,0% na passagem do quarto trimestre do ano passado para os primeiros três meses deste ano e elevação de 1,7% em relação a idêntico período do ano passado.

Desde o final de 2019, a soma de todas as riquezas produzidas pelo País mostrou avanço em torno de 1,6% nas séries de dados dessazonalizados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sustentando um padrão de baixo crescimento, depois do tombo registrado ao longo de 2020. Como exemplo, no segundo trimestre daquele ano, a economia havia encolhido algo ao redor de 11,0% frente ao trimestre final de 2019. Embora a “normalização” da vida econômica nos meses seguintes tenha contribuído para determinar alguma reação, frente aos níveis historicamente muito baixos observados nos primeiros meses da pandemia, o PIB mantinha-se, no primeiro trimestre deste ano, ainda 1,7% abaixo dos volumes produzidos pela economia brasileira como um todo no começo de 2014. Em oito anos, portanto, embora a população tenha crescido, o volume de riquezas geradas pelo País encolheu.

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Nada animador

Daqui para frente, há algum consenso nos mercados em torno de algum crescimento adicional no segundo trimestre, com perdas projetadas para a segunda metade do ano. A inflação persistente e seus efeitos sobre a renda da grande massa de trabalhadores, a elevação das taxas de juros e as incertezas sempre geradas por períodos eleitorais desestimularam previsões mais otimistas para o terceiro e quarto trimestres deste ano, evidentemente porque tendem a desestimular o consumo – um dos objetivos do aumento dos juros –, desaquecendo a economia como um todo. Os juros básicos, a se considerar os ânimos prevalecentes no mercado financeiro, podem subir mais do que o Banco Central (BC) chegou a antecipar, tornando o crédito ainda mais caro, afetando o consumo de bens de maior valor e penalizando mais fortemente as decisões de investimento, que já vem em baixa neste começo de ano.

Balanço

  • Na comparação com o último trimestre do ano passado, na prática, apenas as atividades no setor de serviços registraram variação, num avanço de 1,0%. Afetada pelo clima e pela alta de custos trazida pela guerra entre Rússia e Ucrânia, conforme avalia o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), a agropecuária recuou 0,9% entre aqueles dois trimestres, enquanto a indústria praticamente não saiu do lugar ao apresentar uma variação de somente 0,1% – resultado de uma queda de 3,4% no PIB da indústria extrativa, em função da retração no setor de produção de minério de ferro, e de elevação de 1,4% na indústria de transformação.
  • A comparação com o primeiro trimestre do ano passado mostra um incremento de 1,7% para o PIB como um todo, mais uma vez concentrado no setor de serviços, que avançou 3,7%. Essa variação foi puxada pelo segmento de outras atividades de serviços, que incluem principalmente aqueles serviços prestados presencialmente, com salto de 12,6% diante do primeiro trimestre de 2021, seguido por altas de 9,4% e de 5,5% para serviços de transportes, armazenagem e correios, no primeiro caso, e para os segmentos de informação e comunicação, no segundo.
  • A agropecuária encolheu 8,0% entre os três meses iniciais de 2021 e o mesmo intervalo deste ano, com baixa de 1,5% para a indústria em geral. A atividade industrial continua rodando em níveis inferiores àqueles registrados há um ano, com o setor de transformação caindo 4,7% e a extrativa encolhendo 2,4%. Para se ter uma visão mais realista da crise na indústria de transformação, comparada ao segundo trimestre de 2013, quando havia alcançado seu melhor resultado na série histórica, o setor encolheu nada menos do que 16,8%.
  • Pelo lado da demanda, a “formação bruta de capital fixo”, quer dizer, o investimento em novas máquinas, equipamentos, programas de computador, novas edificações, instalações e produção de caminhões e ônibus, entre outros ativos fixos, caiu 3,5% na saída do quarto trimestre de 2021 para o primeiro trimestre deste ano, e desabou 7,2% frente ao trimestre inicial do ano passado. A taxa de investimento baixou de 19,7% para 18,7% do PIB entre o final do ano passado e o início deste ano. Os avanços mais recentes, influenciados pelos números distorcidos da produção e exportação de plataformas de petróleo, não conseguiram fazer o investimento retomar seus melhores momentos, com o indicador anotando ainda retração de quase 15,0% frente ao terceiro trimestre de 2013.
  • Respondendo por 61% do PIB, o consumo das famílias variou 0,7% entre o final do ano passado e o primeiro trimestre deste ano, avançando 2,2% em relação ao primeiro trimestre de 2021. As famílias chegaram a reduzir seu consumo em 12,2% entre o final de 2019 e o segundo trimestre de 2020, persistindo ainda um recuo de 0,7% quando considerados os níveis alcançados no primeiro trimestre deste ano em relação aos três últimos meses de 2019.
  • Na avaliação do Iedi, “não é certo, porém, que esta evolução do consumo das famílias tenha continuidade, já que a inflação continua elevada e a alta da taxa de juros pelo Banco Central ainda não foi repassada integralmente aos juros dos empréstimos. São fatores que tendem a reduzir o poder de compra da população”, acrescenta o instituto.