Coluna

Sete em cada 10 novos empregos foram ocupados por trabalhadores sem carteira assinada

Publicado por: Sheyla Sousa | Postado em: 29 de novembro de 2019

Ouvem-se
rojões pelos lados do Planalto Central por conta dos números recentemente
trazidos pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o que foi
entendido como um sinal de melhora no setor formal do mercado de trabalho –
aquele onde os trabalhadores ainda são contratados com carteira assinada,
direito a férias, 13º salário, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e
Previdência. Nos 12 meses encerrados em outubro, as empresas contrataram 562,2
mil trabalhadores a mais do que o número dos que foram demitidos no período,
significando uma variação de 1,45% no saldo total de ocupados com carteira (que
atingiu 39,252 milhões, ainda 2,048 milhões abaixo do número observado em
outubro de 2014, quando as empresas haviam registrado 41,3 milhões de
trabalhadores).

Os
números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNADC),
realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram
um quadro um tanto diferente e bem menos lisonjeiro. Na edição de outubro,
divulgada ontem, o número de trabalhadores com carteira somava um pouco menos
(qualquer coisa abaixo de 36,2 milhões de seres viventes), o que significou a
contratação de 231,0 mil ao longo de 12 meses, numa variação de 0,6%. Mas este
nem chega a ser o dado mais relevante para avaliar o desempenho recente e
perspectivas para o mercado de trabalho.

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O
número total de pessoas ocupadas, incluídas aquelas absorvidas pelo chamado
mercado informal (ou seja, sem direitos nem garantias), passou de 92,619
milhões no trimestre encerrado em outubro do ano passado para 94,055 milhões em
igual período deste ano. Foram contratadas, portanto, perto de 1,436 milhão de
pessoas nesses 12 meses, o que correspondeu a uma variação de 1,55%. Quase 94
em cada 100 novas vagas foram abertas pelos setores ligados à prestação de
serviços e ao comércio e praticamente 62,5% dessas novas ocupações contemplaram
trabalhadores sem carteira assinada e sem registro no Cadastro Nacional de
Pessoa Jurídica (CNPJ). O número de “sem carteira e se CNPJ” avançou de 38,394
milhões (41,45% do total de ocupados) para 39,291 milhões (41,77%), num
acréscimo de 897,0 mil (2,34% a mais).

A recaída

A
análise de dados em períodos mais longos ajuda a der uma visão de processo, mas
muitas vezes não permite perceber mudanças de tendências no curto prazo e que
poderão influir, mais adiante, na definição de cenários mais amplos, qualquer
que seja o setor da economia avaliado. Não é diferente no mercado de trabalho.
No curtíssimo prazo, parece ocorrer uma piora, depois de modesta melhoria nos
trimestres anteriores, quando parecia que o emprego formal estaria engatando
uma reação. Na passagem do trimestre maio-julho para o seguinte
(agosto-outubro), foram incluídos mais 470,0 mil trabalhadores entre os
ocupados, numa variação de 0,50%. O ponto é que sete em cada 10 “novos”
ocupados não tinham carteira assinada, mostrando uma recaída, com nova deterioração
nas condições de emprego.

Balanço

·  
Aos
números, então. O número de ocupados sem carteira, incluindo empregados dos
setores público e privado e empregados domésticos, passou de 18,691 milhões
para 19,027 milhões, crescendo 1,80%. Ou seja, mais 336,0 mil trabalhadores
passaram a engrossar as fileiras da informalidade, sujeitando-se a ocupações de
baixa remuneração, sem direitos e sem cobertura da Previdência.

·  
Isso
significa que o emprego sem carteira respondeu por 71,5% do crescimento das
ocupações na passagem de um trimestre para o seguinte. O número de vagas sem
carteira cresceu mais no setor privado, com entrada de 255,0 mil novos
trabalhadores sem registro (avanço de 0,60% frente ao trimestre imediatamente
anterior).

·  
Na
mesma comparação, os trabalhadores com carteira virtualmente não cresceram (na
verdade, recuaram levemente, com corte de 51,0 mil vagas, de 36,235 milhões
para 36,184 milhões).

·  
Comércio
e serviços foram os setores que mais contrataram (mais 204,0 mil no primeiro
caso e outras 199,0 mil vagas adicionais no segundo). A construção civil, em
lenta reação, aumentou seu efetivo com a contratação de mais 197,0 mil
empregados (3,0% mais do que no trimestre maio-julho), passando a empregar
6,846 milhões de pessoas.

·  
Embora
a informalidade tenha avançado, refletindo-se no aumento dos trabalhadores sem
carteira e sem CNPJ, a subutilização da força de trabalho recuou de 24,6% para
23,8% (saindo de 28,106 milhões de pessoas entre maio e julho para 27,134
milhões entre agosto e outubro, em queda de 3,5%).

·  
Pode
parecer um tanto paradoxal, mas o avanço da informalidade ajudou a aumentar o
total de ocupados em um número superior ao crescimento da força de trabalho
(470,0 mil a mais diante do incremento de 268,0 mil no número de pessoas com
mais de 14 anos que buscaram emprego na semana da pesquisa). O resultado foi
uma redução de 1,6% no total de pessoas desocupadas, que recuou de 12,569
milhões para 12,367 milhões (menos 202,0 mil). A taxa de desemprego manteve-se
estagnada em torno de 11,6%.

·  
A
perspectiva (ou necessidade) de conseguir alguma ocupação, ainda que informal,
parece ter ajudado a reduzir o número de pessoas em desalento e aquelas na
força de trabalho potencial (que haviam deixado de buscar um emprego, mas ainda
estavam dispostas a trabalhar).