Subsídios fiscais chegam a 34,9% das receitas, aproximando-se de R$ 12,5 bi

Publicado por: Lauro Veiga Filho | Postado em: 14 de junho de 2022

Ao conceder qualquer forma de incentivo fiscal ou subsídios, o Estado está abrindo mão de receitas em favor de setores escolhidos. Os recursos transferidos por meio de renúncias fiscais, que ganham essa denominação exatamente porque o governo está renunciando a receitas que de outra forma entrariam em seus cofres, correspondem a despesas que deixam de ser realizadas em benefício da população para que empresas possam aumentar seus ganhos e, supostamente, investir mais, gerando empregos, renda e crescimento econômico.

Aqueles que defendem as políticas de benefícios fiscais argumentam que, ao final, a arrecadação também tenderia a crescer, já que as empresas estariam expandindo seus negócios e faturando mais, resultando em mais impostos arrecadados. O processo, no entanto, tende a transformar a concessão de subsídios fiscais numa grande bola de neve, trazendo o risco de erodir a base de arrecadação, reduzindo a capacidade arrecadadora do Estado e limitando também sua capacidade de realizar políticas públicas em favor dos menos favorecidos.

Os dados do relatório de renúncias fiscais de 2021, divulgado recentemente pelo Instituto Mauro Borges de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (IMB), mostram que as renúncias fiscais foram equivalentes, no ano passado, a 39,61% das receitas correntes líquidas realizadas no mesmo período, diante de 34,03% em 2020. A participação havia sido de algo em torno de 35,3% em 2017. Considerando a concessão de créditos outorgados, redução de base de cálculo, isenções e anistias fiscais, o Estado deixou de arrecadar algo em torno de R$ 12,496 bilhões no ano passado, diante de qualquer coisa abaixo de R$ 8,967 bilhões em 2020, indicando variação de 39,4% em valores nominais. Descontada a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a alta aproximou-se de 26,6% em grandes números.

Continua após a publicidade

Desempenho mais modesto

A receita líquida avançou num ritmo muito menos intenso em igual comparação, ao crescer 19,72%, saindo de R$ 26,350 bilhões para R$ 31,545 bilhões, num avanço real próximo a 8,8%. Num horizonte ligeiramente mais alongado, como apresenta o relatório, as receitas chegaram a crescer quase 50% entre 2017 e 2021, numa elevação de 19,95% em termos reais, quando se considera a arrecadação de R$ 21,034 bilhões no início da série. As renúncias fiscais, no entanto, apresentaram salto nominal de 68,4% naqueles cinco anos, partindo de alguma coisa ligeiramente inferior a R$ 7,420 bilhões. Depois de descontada a inflação, o incremento atingiu 34,70%.

Balanço

  • Proporcionalmente, as receitas têm crescido em velocidade menos significativa do que a disposição governamental em perder receitas que teriam vindo para seus cofres não fossem os incentivos fiscais concedidos. O “apetite”, supostamente alimentado pelo desejo de atrair investimentos, está registrado no próprio relatório, além de referendado por estudos anteriores.
  • Literalmente, cita o trabalho, “os dados referentes às renúncias fiscais do estado de Goiás, desde 2017 até o ano de 2021, corroboram o argumento de que tal política é usada de forma agressiva no Estado, com o intuito de atrair novos investimentos e mitigar as desigualdades regionais, caracterizando-se como o principal instrumento econômico para alavancar o crescimento econômico e, no limiar, o desenvolvimento econômico de médio e longo prazo”.
  • A ressalva vem no próprio relatório: “É importante destacar que a receita corrente líquida (RCL) é o recurso disponível pelo Estado para desenhar políticas públicas para melhorar a vida do cidadão goiano, bem como para manter em pleno funcionamento a máquina pública”.
  • Embora inclua aqueles tópicos entre os objetivos da política de benefícios fiscais, o relatório trata logo de esclarecer que os impactos e supostas vantagens daquela política não chegaram a ser amplamente analisados, até por escapar do propósito do estudo. “O presente trabalho não realiza uma discussão em termos de impacto ou custo-benefício, afinal, é necessário analisar os microdados, isto é, os valores por firma com o cruzamento de outras bases de dados. Ademais, isso é um trabalho sectário e requer maior rigor técnico-científico”, registra o IMB.
  • Ainda assim, o relatório mesmo indica efeitos muito reduzidos na redução de desigualdades sociais e de renda entre as regiões do Estado. Com base nos dados apurados, “constata-se que ao longo do período existe uma relativa concentração dos beneficiados nas regiões mais desenvolvidas do Estado”. O trabalho não diz, mas seus números sugerem a preservação e mesmo agravamento nas distorções econômicas e sociais internas, ao contribuir para alargar a distância entre regiões mais e menos desenvolvidas.
  • Considerando os benefícios distribuídos pelos programas Fomentar e Produzir, apenas 15 municípios abocanharam 70,9% dos créditos em 2021, sobrando 29,1% para todos os demais. No caso do crédito outorgado, perto de 59,0% dos benefícios foram destinados a sete municípios, ou seja, apenas 2,8% do total, cabendo 41,0% aos restantes 239 municípios (ou 97,2% do total).
  • No ano passado, o perdão de dívidas de impostos que deixaram de ser pagos apresentou aumento de absurdos 374,2% frente a 2020, passando de R$ 229,0 milhões para R$ 1,557 bilhão. Em cinco anos, a alta chegou a 580%. Na soma de todo o período (2017 a 2021), o Estado perdoou dívidas de praticamente R$ 3,123 bilhões ou quase 10% da receita corrente líquida acumulada nos 12 meses do ano passado.