Cada vez mais empoderadas, mulheres ocupam mercado da construção civil

Nos últimos 12 anos, presença de mulheres cresceu mais de 100% na área de construção civil, aponta o IBGE| Foto: Wesley Costa

Postado em: 10-08-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Nos últimos 12 anos, presença de mulheres cresceu mais de 100% na área de construção civil, aponta o IBGE| Foto: Wesley Costa

Daniell Alves

Cada vez mais empoderadas, as mulheres hoje estão inseridas em qualquer tipo de trabalho – mesmo aqueles que exigem bastante força física. A presença feminina na construção civil, por exemplo, cresceu 120% nos últimos 12 anos, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Há quase 110 mil trabalhadoras que foram registradas entre os anos de 2007 e 2018.

A vontade de trabalhar faz com que qualquer serviço seja uma oportunidade para aprender. Na Capital, diversas obras têm mulheres no quadro de funcionários, como é o caso de Luciléia Lima de Mota, que atua como sinaleira de grua em uma obra no Parque Areião. A profissão de sinaleiro de grua geralmente é dividida entre duas pessoas. Uma delas fica no térreo da construção, para fazer e conferir a amarração dos carregamentos que serão transportados, e a outra fica no pavimento onde esse material será descarregado, para recebê-lo.

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Os operários orientam o operador da grua, que fica no topo do prédio, e se comunicam entre si via rádio. Portanto, a função de sinaleiro requer muita atenção e grande responsabilidade. Luciléia chegou do Pará há poucos meses, mas já exerce a função por cerca de cinco anos. Além de ser sinaleira, ela também é operadora do equipamento. “Acho que ser operadora é mais fácil, apesar de lidar com várias opções da máquina e precisar usar os pés e as mãos. A responsabilidade do sinaleiro é maior, sou os olhos do operador, tenho que orientá-lo em seus movimentos”, destaca.

Orientado pela sinaleira, o operador de grua, Carlos dos Santos Silvas, explica que a função de sinaleiro exige confiança, pois os operadores dependem do sinaleiro para manusear a máquina. “Percebo que as mulheres nessa função são mais cuidadosas e até melhores que alguns homens, pois existem os que são mais imprudentes para fazer o transporte do material e pode ser perigoso”, diz.

Respeito acima de tudo

Mesmo trabalhando em um ambiente em que o sexo masculino é predominante, a sinaleira afirma que nunca enfrentou problemas nas obras por ser mulher. Ela diz que é respeitada pelos homens operadores, que seguem as orientações com confiança. “Eu amo minha profissão de operadora e amo também minha profissão de sinaleira de guindaste ou grua”, sublinha.

Luciléia iniciou a profissão como ajudante em uma construção de usina hidrelétrica. Na época, ela estava desempregada e, ao entrar no serviço, foi para a área de movimentação de carga. “Como meu encarregado me viu muito esforçada, ele me classificou de sinaleira de guindaste. Eles me deram o curso na obra. Depois me deram a oportunidade de operar a grua, fiz curso também para ser uma operadora de máquinas, todas na área de movimentação de carga”, detalha.

Preconceito

No entanto, nem todas as mulheres são respeitadas no ambiente de trabalho e/ou acadêmico. Isabela Coimbra, de 26 anos, se formou recentemente em Engenharia Civil e afirma que já sofreu bastante preconceito apenas por ser mulher dentro da sala de aula. “O pior são as piadinhas. Muitas vezes alguns meninos duvidavam da nossa capacidade de executar as mesmas atividades que eles. Era eu e mais três meninas na sala e os outros 30 eram homens”, relembra.

Ela conta que sempre se viu dentro da profissão e pretende quebrar os estereótipos. “Não é preciso dizer nada. Está mais do que comprovado que nós somos capazes, independente de sexo. Todas as pessoas que se dedicam naquilo que fazem e amam conseguem sim fazer com perfeição”. Após entrar no mercado de trabalho, ela percebeu que a realidade na área de Engenharia Civil mudou, mas ainda tem muitos desafios pela frente. Um deles é a questão do machismo.

Mulheres ainda recebem menos que os homens 

Mesmo ocupando as mesmas funções que os homens, as mulheres ainda recebem menos. Segundo relatório do IBGE, os homens tiveram rendimento médio mensal 28,7% maior do que das mulheres em 2019, considerando os ganhos de todos os trabalhos. Enquanto eles receberam R$ 2.555, acima da média nacional (R$ 2.308), elas ganharam R$ 1.985.

No ano passado, havia no mercado de trabalho brasileiro 92,5 milhões de pessoas ocupadas com 14 anos ou mais, uma alta de 2,6% em relação a 2018. Mais da metade da população em idade de trabalhar era formada por mulheres (52,4%), no entanto, os homens representavam 56,8% da parcela da população que efetivamente trabalhava. Parte das mulheres não pode trabalhar porque não conta com creche para deixar os filhos.

Impeditivos

Vânia Mahnic, que trabalha na área de Gestão de Pessoas, diz que as mulheres, de forma geral, são mais atenciosas e detalhistas na entrega de seus trabalhos. “Quando se dá a oportunidade a uma mulher de ocupar cargos de gerência, supervisão ou direção, na maioria das vezes os resultados apresentados pela mulher são iguais ou superiores aos dos homens”, explica ela.

Por outro lado, no dia a dia das empresas, muitas vezes é considerado o custo de reposição desta mulher nos casos de licença maternidade e outros afastamentos inerentes ao gênero. Segundo ela, outro fator que prejudica uma igualdade de gênero dentro do mercado de trabalho é a cultura machista em que estamos inseridos, onde a mulher muitas vezes é subjugada, deixando de se avaliar suas competências profissionais. Tudo isso acaba refletindo em seu desenvolvimento. As oportunidades acabam sendo restritivas, muitas mulheres são desmotivadas a buscar seu desenvolvimento, seja no campo profissional ou mesmo em seu ambiente familiar”, destaca.

“A desigualdade é uma realidade, sim, na vida das mulheres. E isso acontece porque o ego e machismo falam mais alto e as mulheres são vistas como incapazes de realizar algum determinado serviço que supostamente foi feito para o homem”, diz a vendedora Lorayne Castro, de 19 anos. Ela, que trabalha desde cedo, conta que já viu mulheres desistirem de suas funções por não acreditarem no próprio potencial.

Ela ressalta que a população feminina é capaz de prestar qualquer tipo de serviço seja qual for. “O homem só por ser homem tem uma renda maior em algumas empresas. Esta é uma realidade que precisa mudar. A prova disso é que as mulheres estão inseridas em todas as áreas do mercado de trabalho e executam trabalhos brilhantes que merecem ser reconhecidos”, enfatiza a vendedora.

Possibilidades de ação

O Relatório de Desenvolvimento Humano, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), faz um chamado para a ação e recomenda políticas públicas que podem apoiar os governos de todo o mundo no combate às novas e variadas formas de desigualdade, que vão para além da renda e das médias.

Políticas, por exemplo, que auxiliam os países a progredir em equidade e eficiência ao mesmo tempo. Elas restringem a capacidade das empresas, nivelando o campo de atuação e aumentando a eficiência, e levam a resultados mais equitativos, reduzindo a concentração da renda. O caminho é fortalecer o arcabouço regulatório, garantindo o funcionamento do mercado concorrencial. Tais medidas contribuem para a redução da pobreza e para impulsionar o crescimento e a produtividade.

A mudança depende não só de políticas públicas que incentivem e/ou desonerem os afastamentos citados acima, mas principalmente de uma mudança cultural, explica Vânia. “É preciso trabalhar a concepção de que homens e mulheres são iguais em suas capacidades, dependendo exclusivamente do desenvolvimento e desempenho de cada um, no intuito de entregar resultados”. (Especial para O Hoje)

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