Os anos de chumbo em Goiás

Renato Dias retorna ao tema da ditadura militar com a história da militante Maria Augusta Thomaz, que foi morta em Goiás em 1973

Postado em: 12-06-2016 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Renato Dias retorna ao tema da ditadura militar com a história da militante Maria Augusta Thomaz, que foi morta em Goiás em 1973

Júnior Bueno

Maria Augusta Thomaz era uma estudante de Filosofia da PUC-SP. Nasceu em 1947 na cidade de Leme, em São Paulo, e morreu em Rio Verde, em Goiás, em 1973, aos 25 anos. Sua história se cruza com a do escritor e jornalista Renato Dias de uma forma trágica. Militante contra o regime militar que vigorou no País entre 1964 e1985, ela foi assassinada em uma operação comandada pelo então capitão do Exército Marcus Antônio de Brito Fleury, coincidentemente o homem também apontado como o responsável pelo desaparecimento do jovem Marcos Antônio Dias Batista, de 15 anos, em 1970, irmão de Renato. O jornalista relatou esta história no livro O Menino que a Ditadura Matou, lançado no ano passado. O tema da ditadura se tornou “uma espécie de obsessão” para Renato, como ele descreveu em entrevista a O HOJE, sobre o livro Luta Armada/ALN-Molipo – As Quatro Mortes de Maria Augusta Thomaz, que será lançado amanhã à noite.

O livro-reportagem é um thriller político que relata a Maria Augusta Thomaz que, em 4 de novembro de 1969, sequestrou, com uma bomba no colo, um avião da Varig, em Buenos Aires, desviou-o para Havana, onde fez treinamento de guerrilha, e fundou o Movimento de Libertação Popular (Molipo). O Molipo era uma dissidência da Ação Libertadora Nacional, organização de esquerda criada pelo inimigo nº 1 do regime, Carlos Marighella, que adotou a luta armada contra a ditadura civil e militar, instalada no Brasil em 1º de abril daquele turbulento ano de 1964. 

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Formado por 28 integrantes, em sua maioria ex-estudantes, o Molipo deslocou clandestinamente, em 1971, militantes para deflagrar a guerrilha rural e tentar derrubar a ditadura e construir o socialismo no Brasil. Maria Augusta Thomaz veio no primeiro comboio. A ativista soltou bomba na Esso, atacou o Consulado da Bolívia, participou de expropriações. Baleada em um tiroteio com a polícia, em 1971, recuperou-se, em um mês, e voltou à ativa. Deslocou-se, com Marcio Beck Machado, também quadro do Molipo, treinado em Cuba para o Estado de Goiás. A ordem era retomar o projeto de desenvolvimento da luta armada original da ALN. 

Os dois morreram na madrugada do dia 17 de maio de 1973, na Fazenda Rio Doce, em Rio Verde. Os seus restos mortais foram enterrados na propriedade rural. Sete anos depois, o crime foi descoberto, assim como o local onde se encontravam as ossadas. O Comitê Brasileiro Pela Anistia iria fazer a denúncia em julho de 1980. Os corpos de Maria Augusta Thomaz e Marcio Beck Machado haviam sido retirados às pressas. O ex-agente da repressão Marival Dias Chaves do Canto revelou que os restos mortais foram removidos por André Pereira Leite, codinome de ‘Dr. Edgar’, em 31 de julho de 1980. O caso virou um escândalo de repercussão nacional, mas o Brasil ainda vivia sob um regime de exceção.

O livro Luta Armada/ALN-Molipo – As Quatro Mortes de Maria Augusta Thomaz traz documento obtido com exclusividade nos Arquivos do Extinto Serviço Nacional de Informações. O dossiê mostra como começaram as quedas em série dos militantes do Molipo. Com a morte dos quatro, o Centro de Operações de Defesa Interna (Doicodi), de São Paulo, sob o comando Carlos Alberto Brilhante Ustra, montou a operação para liquidar a última célula viva do Molipo. 

Dezoito militantes do Molipo foram assassinados – seis deles em Goiás. E é disso que trata o livro do jornalista Renato Dias – “com precisão histórica”, segundo o autor.  Os militantes que foram para o exílio na Europa ou no Chile, tempos de Salvador Allende, conseguiram escapar, à exceção de Jane Vanini, morta sob a ditadura civil e militar de Augusto Pinochet, em 1974.

Comissão da Verdade

Em 2014, o procurador da República, Wilson Rocha, abriu inquérito para apurar a participação de militares, ainda vivos, na morte do casal. Já a Comissão Nacional da Verdade, criada em maio de 2012 como uma comissão de Estado, realizou operações, no local da morte, de scanner de solo para tentar encontrar restos mortais dos revolucionários do Molipo. 

Renato Dias é jornalista, sociólogo e especialista em Políticas Públicas. É autor também dos livros História – Para Além do Jornal – Um Repórter Exuma Esqueletos da Ditadura Civil e Militar e Pequenas Histórias – Cuba, Hoje – Uma Revolução Envelhecida ou a Reinvenção do Socialismo? O escritor pretende lançar dois livros neste ano. O primeiro também remonta os anos de chumbo, narrando a época de sombras no Brasil e na América Latina, e o segundo, um livro-reportagem, relata a realidade econômica, social e política da Grécia de hoje.

Incansável, Renato escreve ainda, para o ano que vem, um livro sobre o que pensam os trotskistas, hoje, no Brasil, e formula um ousado projeto dos 100 anos da primeira revolução que inaugurou a utopia socialista no mundo, a revolução russa de outubro de 1917. O escritor reflete também sobre a transição de 1985 a 1988, e abordará, em livro, o impeachment de Dilma Rousseff. Confira abaixo a entrevista dele para o Essência.

 

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