Novas estimativas agora sugerem dois anos de recessão para o País

O comportamento da economia brasileira no curto e médio prazo dependerá da capacidade de coordenação do governo federal - Foto: Divulgação

Postado em: 31-03-2020 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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O comportamento da economia brasileira no curto e médio prazo dependerá da capacidade de coordenação do governo federal - Foto: Divulgação

Lauro Veiga

O
comportamento da economia brasileira no curto e médio prazo dependerá da
capacidade de coordenação do governo federal, da extensão e amplitude das
medidas de socorro, com uso massivo de recursos fiscais, e expressamente da
disposição da equipe econômica de abandonar os dogmas fiscais que amarram
decisões nesta área. Descontados, obviamente, fatores que estão além do
controle dos governos e que poderão alterar radicalmente os prognósticos já
desenhados para a atividade econômica nos próximos meses e ainda em 2021 –
aliás como já vem ocorrendo desde o começo da pandemia, com instituições
multilaterais e centros de pesquisas econômicas alterando rapidamente suas
estimativas, invariavelmente para pior.

Salvo
alterações pressentidas, mas ainda não totalmente evidentes, o Banco Fator foi
mais um a revisar suas projeções para 2020 e 2021. Na visão do banco, em seu
cenário intermediário, o Produto Interno Bruto (PIB) tende a cair 3,1% neste
ano, diante de um recuo modesto de 0,48% aguardado pelo mercado financeiro em
conjunto, segundo o relatório Focus do Banco Central (BC). Ainda conforme
assinala o Fator, em relatório distribuído ontem e assinado por seu economista
chefe, José Francisco de Lima Gonçalves, a recessão deverá se alongar até 2021,
com nova queda do produto, agora na faixa de 1,8%.

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Na
avaliação de Gonçalves, “a reação do governo federal tem sido tímida e
contraditória. A coordenação dos esforços com Estados e municípios não vai bem.
Programas de emergência via gasto público são indispensáveis para minimizar os
riscos de ruptura do tecido social e de interrupção do circuito econômico e
financeiro”.Em outras palavras, o uso intensivo de recursos fiscais, ainda que
isso exija uma combinação de maior emissão de moedas e maior endividamento
(palavrões para a ortodoxia ultraliberal instalada no Planalto), poderá ainda
evitar uma deterioração mais severa das condições econômicas e sociais.

Gonçalves
recorre ao exemplo da Alemanha, que anunciou um pacote equivalente a 20% do PIB
durante a recente reunião dos líderes dos países que formam o G20. “O pacote
fiscal alemão bem que poderia ser um exemplo para governos mais amedrontados do
que o mandato exige”, comenta. Transposto para a realidade brasileira, aquele
percentual corresponderia a algo em torno de R$ 1,5 trilhão ou duas vezes os
valores que o superministro Paulo Guedes tem alardeado.

Muito barulho

Ao
falar para o mercado financeiro, na semana passada, Guedes chegou a estimar uma
ajuda da ordem de R$ 728,0 bilhões, o que poderá ainda atingir R$ 750,0 bilhões
a considerar a inclusão dos municípios na proposta de renegociação das dívidas
dos governos regionais. No entanto, pouco mais de um quarto daqueles recursos,
qualquer coisa próxima a R$ 200,0 bilhões, lembra Gonçalves, correspondem à
entrada na economia de recursos verdadeiramente novos. Boa parte das medidas
limita-se a antecipar despesas que já iriam ocorrer mais adiante, renegociação
de dívidas e empréstimos.

Balanço

·  
Na
visão de Gonçalves, o governo e sua equipe econômica parecem relutar em
realizar uma política fiscal de fato “contracíclica” (ou seja, que atue como
estímulo para a economia num momento de emergência) e a abandonar as restrições
que têm determinado extrema timidez no enfrentamento da crise.

·  
O
momento, lembra ele, citando o então presidente do Banco Central Europeu, Mario
Draghi, de fazer o que for preciso (“do whatever it takes”) para combater a
pandemia e seus efeitos. “A política monetária, nos marcos atuais, é a que
tenta ajudar o crédito, tarefa inglória em situação de crise de liquidez
pronunciada e global”, sustenta Gonçalves.

·  
Obviamente,
isso não significa relaxar nas medidas de isolamento e de restrição a
aglomerações e à circulação de pessoas como forma de conter o contágio em nome
de uma enganosa preservação da atividade econômica. Exatamente por isso, a
atuação coordenada dos governos, sob a liderança (hoje inexistente) do governo
central, ganha importância fundamental.

·  
O
economista chefe do Fator elogia o que considera como “competentes medidas”
adotadas pelo BC, que anunciou uma injeção de R$ 1,2 trilhão no mercado
financeiro para reforçar a liquidez do setor e coordenou um pacote (modesto) de
ajuda financeira a pequenas e médias empresas, em parceira com o Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da Caixa. Mas ressalva: “Medidas
ligadas ao crédito têm efeito muito limitado em situação de elevada incerteza”.

·  
“O
caminho para recuperar efetividade da política monetária é a criação de
oportunidades de investimento, de gasto de capital com rentabilidade acima da
inflação – que é baixa – e risco passível de mitigação pelo Estado”, acrescenta
Gonçalves. Isso exigiria a retomada dos investimentos públicos em projetos mais
simples no setor de infraestrutura (e, portanto, de realização mais rápida) e
ainda uma atuação orquestrada dos bancos públicos em “programas emergenciais e
de médio prazo para viabilização do horizonte de investimentos privados”. Até
onde a vista alcança, no entanto, nenhuma dessas alternativas parece fazer
parte do cardápio do superministro e de sua equipe.

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