Mães lutam por professores de apoio para autistas em sala de aula
Em escolas particulares os pais devem pagar o custeio da assistência terapêutica em sala de aula
A peregrinação de mães de crianças atípicas é uma jornada sem fim e muitas vezes envolta de diversos desafios. Uma mãe que não quis se identificar tem um filho de 10 anos e descobriu que ele é autista há seis anos. Desde que o menino começou a frequentar a escola, ela se depara com o desafio de não saber se o filho terá um bom apoio escolar ou não.
“Quando tem professor de apoio, são pessoas que estão começando a fazer pedagogia. Não tem preparo para trabalhar com essas crianças”. Ela conta que uma vez que um professor comentou que o filho dela usava o “autismo para o bem” ao comparar com outra criança que possuía TDAH, mas que era muito inquieta. “Uma pessoa que fala isso, que preparo tem? Autismo não é arma, existem níveis diferentes de aprendizado”, indaga.
A mãe comenta que apesar dos problemas ela não muda o filho de escola porque todas são da mesma forma. O rapaz estuda em uma escola municipal de Trindade, mas ao tentar colocá-lo em uma escola particular foi dito que não tinha mais vaga após a instituição saber a condição do menino.
Outra mãe que não quis se identificar, possui um filho de 4 anos de idade. Ele foi diagnosticado com autismo aos 2 anos. Ele conseguiu vaga em um Centro Municipal de Educação Infantil (Cmei) este ano. “Demorei para conseguir uma vaga para ele e quando consegui não tinha professor de apoio. E fomos orientados a ir em na secretaria da educação para tentar algum”.
Outro problema enfrentado por ela é que a escola é de tempo integral, ela já busca a criança mais cedo para as terapias, mas por ele ser uma criança agitada ele não consegue dormir no mesmo horário que as outras crianças então é pedido que ela busque mais cedo ainda. Contudo ela ressalta que apesar das adversidades o Cmei se preocupou em conseguir uma professora que já trabalhava lá para ficar com o filho.
Garantia de direito
A fonoaudióloga especialista em crianças atípicas, Daniella Sales, afirma que conseguir vagas nas escolas e a garantia do direito à educação inclusiva é um dos maiores desafios das famílias.
Sales ressalta que a grande dificuldade é porque o país em si ainda não considera a inclusão como ponto principal e não tem escolas como modelos ideais.
“A maior dificuldade dos pais de crianças atípicas ao longo dessa caminhada é justamente encontrar a vaga porque a escola geralmente fala que tem vaga, mas quando fica sabendo que a criança tem um laudo ou diagnóstico a própria escola nega e aí se inicia uma batalha da família”.
Já no que se refere a diferença entre escola pública e particular nesse quesito, ela afirma que em Goiânia, as escolas estaduais ou municipais estão mais organizadas porque o próprio município precisa encontrar um profissional de apoio. Contudo, nas escolas particulares, têm o contraponto do custo alto. “Por lei, é a escola que precisaria pagar esse profissional, mas a família acaba pagando e ainda precisa encontrar uma equipe para dar supervisão para essa assistente escolar e isso inicia todo um problema”.
A fonoaudióloga desabada ainda afirmando que “as famílias estão nas mãos das escolas. É uma luta diária, uma corrida sem fim. Mesmo com o nosso apoio, as famílias recebem ‘não’ o tempo todo. Normalmente, a criança atípica já tem acompanhamento de uma equipe multidisciplinar, porque iniciamos a intervenção precoce, então a busca pela escola tem esse nosso apoio”.
Para ela, nas escolas particulares, os pais muitas vezes devem pagar o custeio da assistência terapêutica em sala de aula para o acompanhamento de atividades da criança. Segundo ela, em Goiânia esse serviço extra pode variar entre R$ 1.500 e R$ 2.000.
As frases como “Não temos mais vaga” ou “já fechamos a turma” é bem comum quando determinadas instituições tomam conhecimento de algum diagnóstico que a criança tenha, conforme declara a psicóloga infantil especialista em ABA, Letícia Alvarenga.
“Quando as escolas ficam sabendo que a criança tem diagnóstico de atraso no desenvolvimento, a vaga some no mesmo momento, ou dizem que podem até pegar a criança, mas não disponibilizam a AT escolar. Outra dificuldade frequente é com a adaptação dos materiais: eles aceitam a matrícula da criança, mas não adaptam às atividades pedagógicas, não auxiliam na interação social com as outras crianças, não dão abertura para reunir com a equipe (psicóloga, fonoaudióloga, terapeuta ocupacional e musicoterapeuta), o que prejudica muito o plano de desenvolvimento da criança”.
Políticas públicas
Em 2021, o decreto 10.502/2020 que foi sancionado pelo governo federal foi suspenso pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Na época isso foi considerado discriminatório e um retrocesso nas políticas de inclusão. O motivo foi a criação de escolas especializadas para atender pessoas com deficiência. Agora, o governo de Goiás propôs mudanças do cargo de professor de apoio para a figura do “profissional de apoio escolar” na rede estadual de ensino (projeto de lei nº 10.882/22).