Sem descontos: impacto da alta do dólar vai interferir na Black Friday, em remédios e carros; entenda
Empresas que possuem dívidas em dólar ou com insumos cotados na moeda americana têm seu planejamento comprometido
Um sinal de alerta no setor privado foi aceso devido a recente dispara do dólar, em que a moeda fechou em R$ 5,573, na última terça-feira (26/10), acumulando a alta de quase 13%. Sem previsão de onde o câmbio pode chegar, as empresas que possuem dívidas em dólar ou com insumos cotados na moeda americana têm seu planejamento comprometido.
A importação também fica comprometida, uma vez que quem compra produtos importados para revender no Brasil precisa tomar cuidado para não repassar todo o aumento ao consumidor final e atrapalhar as vendas. Segundo o diretor institucional da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), Luiz Augusto Ildefonso, parte dos lojistas estão com o estoque limitado para a Black Friday, principalmente nos setores eletroeletrônicos, uma vez que vários itens são importados.
De acordo com Ildefonso, em alguns casos não vale a pena abastecer as lojas com o dólar tão alto, já que não será possível repassar tudo ao consumidor, o que geraria prejuízo. Para ele, no dia 26 de novembro, data da Black Friday, os consumidores podem não encontrar os descontos desejados devido ao câmbio. Além disso, afirma que a disponibilidade de estoque tende a ser afetada pelo nó logístico que envolve a falta de contêineres.
Segundo Ulisses Ruiz de Gamboa, economista da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), o atual cenário, que aumenta risco fiscal e turbulência política, influencia na cotação monetária. “Os lojistas estão preocupados em relação a quanto do aumento de custos pode ser repassado ao consumidor agora, quando a demanda ainda não se fortaleceu”, diz.
Gamboa ressalta ainda que alguns setores estão se recuperando enquanto outros tiveram queda. Em relação aos que estão se recuperando ele cita vestuário e calçados, mas que supermercados, móveis e eletrodomésticos sofrem queda.
Como consequência, o consumidor tende a encontrar menor diversidade de produto com uma faixa de preço alta, já que varejistas buscam manter as margens. O empresário Deusmar Queiroz, principal acionista e fundador da rede de farmácias Pague Menos, afirma que o reajuste de preços de medicamentos em abril de 2022 vai ser influenciado pela alta do dólar.
“A variação cambial não interfere diretamente no caixa da nossa empresa, no entanto, vai influenciar no reajuste de preço da indústria farmacêutica, cuja matéria-prima é predominantemente importada”, afirmou Queiroz à Folha.
Entretanto, Luiz Carlos Moraes, presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anafavea), diz que a entidade parou de fazer conta do impacto do câmbio sobre o setor em março de 2020. Ao destacar que no ano passado as importações de componentes somaram cerca de US$ 13 bilhões, ele diz que a pressão atual sobre os custos é incalculável e que não foi repassada totalmente aos preços dos veículos.
“Essa questão nos preocupa tanto quanto a escassez de componentes, como os semicondutores. Além disso, a desvalorização impacta ainda mais a inflação e provoca aumento da taxa de juros, reduzindo substancialmente a chance da retomada de crescimento”, diz o presidente da Anfavea.
Outra indústria que se preocupa com a pressão que a volatilidade da moeda exerce sobre a inflação é a da construção civil. De acordo com Ieda Vasconcelos, economista da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), pode significar maior incremento nos juros e desestímulo aos investimentos. “Isso pode significar maior incremento na taxa de juros e, consequentemente, um desestímulo aos investimentos nas atividades produtivas, como a construção civil”.
Além disso, a economista ressalta que o principal problema enfrentado pelo setor é o aumento do preço de insumos, impactados pela alta do dólar.