Apenas 27% das mulheres negras têm acesso ao pré-natal
A assistência do pré-natal bem estruturada pode promover a redução dos partos prematuros e de cesáreas desnecessárias
O racismo e a desigualdade social são barreiras enfrentadas por mulheres negras, que precisam de estímulo no combate ao racismo na área de saúde. De acordo com dados do Ministério da Saúde (MS), apenas 27% das mulheres negras têm acesso ao pré-natal, que é a assistência na área da enfermagem e da medicina prestada à gestante durante os nove meses de gravidez.
Segundo a Secretaria de Estado da Saúde (SES-GO), o pré-natal deve começar assim que a mulher descobre que está grávida. “No Brasil, a partir desse momento, o Ministério da Saúde recomenda que sejam realizadas no mínimo seis consultas (uma no primeiro trimestre da gravidez, duas no segundo e três no terceiro)”, informa.
O órgão ressalta que o ideal é que a primeira consulta aconteça no primeiro trimestre e que, até a 34ª semana, sejam realizadas consultas mensais. “Entre a 34ª e 38ª semanas, o indicado seria uma consulta a cada duas semanas e, a partir da 38ª semana, consultas toda semana até o parto, que geralmente acontece na 40ª semana, mas pode durar até 42 semanas”.
Preventiva e terapêutica
A Dra. Ana Cristina Fernandes, obstetra da Federação Brasileira de Ginecologia (Febrasgo), explica que a relação médico-gestante é fundamental, principalmente, em meio a tantas informações disponíveis. “A assistência pré-natal é uma assistência preventiva e terapêutica, pois visa manter o bem-estar durante todo o período gravídico, culminando com assistência ao parto adequado e menores índices de morbidade e mortalidade materno-fetal. Em seu conjunto, envolve avaliação clínica e procedimentos complementares de laboratório e imagem direcionados ao binômio materno-fetal”.
De acordo com ela, as consultas de pré-natal devem começar logo que o casal deseje engravidar. Nessa consulta, vão ser discutidas dúvidas e verificados a presença de doenças prévias ou condições que possam oferecer risco à sua gestação e ao seu bebê. São avaliados o uso de medicações para evitar doenças no feto, e abolir maus hábitos na gravidez.
A bióloga Marta Zesaria de Oliveira, uma das sócias-fundadoras da ONG Grupo de Mulheres Negras Dandara no Cerrado, afirma que o país precisa discutir a questão da igualdade racial. “Se a situação das mulheres já é difícil, imagina da mulher negra. Por mais que ascenda socialmente, ela sempre ocupa lugares com menos acesso. Posso ser uma doutora, mas se eu sou negra, a minha pele já me coloca na base da pirâmide social. Isso é ser mulher negra nesse país”, observou.
Consultas
A obstetrícia da Febrasgo esclarece que “devem ser feitas no mínimo no mínimo seis consultas pré-natais ao longo da gravidez, mas o ideal é que haja consultas mensais até o sétimo mês de gestação, depois quinzenais e, chegando perto do parto, após o oitavo mês, essas consultas devem se tornar semanais. O agendamento pode se adequar às condições e complicações maternas.
Durante a gravidez aconteceu diversas transformações, a exemplo de modificações físicas, psicológicas, metabólicas e endócrinas muito importantes, que devem ser avaliadas e acompanhadas. Na consulta pré-natal, é realizada anamnese e exame clínico geral, avaliando as modificações e adaptações do corpo da gestante, avaliação de risco gestacional e prevenção de intercorrências mórbidas para o binômio materno-fetal.
“São verificados os batimentos cardíacos do bebê e a pressão arterial, o incremento de peso e acompanhado as queixas comuns da gravidez, estando atento às intercorrências, ao histórico da paciente e às mudanças relatadas”, revela.
Mercado de trabalho
Uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Indicadores Sociais das Mulheres no Brasil, a participação das mulheres sem filhos na força de trabalho é 35,2% maior em relação à participação daquelas com filhos. Ao contrário, os homens que têm filhos não enfrentam nenhuma desvantagem.
Entre as iniciativas a serem implementadas para reverter este cenário de desigualdade estão a ampliação dos horários de atendimentos nas creches, aumento no número de vagas disponíveis no mercado de trabalho e fim das demissões após o término da licença maternidade. É o que aponta a técnica da subseção da Central Única dos Trabalhadores (CUT) Nacional, Adriana Marcolino.
Casos de racismo e injúria racial aumentaram
Os casos de racismo registrados em Goiás tiveram crescimento de 28% nos últimos anos, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO). Desde 2019, foram registrados mais de 1,2 mil casos de injúria racial. Conforme definição do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a injúria racial está contida no Código Penal e o racismo é previsto na Lei 7.716/1989, que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor.
A injúria racial consiste em ofender a honra de alguém a partir de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião ou origem. Já o crime de racismo atinge uma coletividade indeterminada de indivíduos.
Iêda Leal, Coordenadora Nacional do Movimento Negro Unificado (MNU), explica que os dois termos representam o mesmo significado: racismo. “Se você somar os casos de injúria e racismo, você vai ter um número muito alto de casos, não o suficiente para traduzir o quanto o nosso Estado é racista. Eu acho que falta uma política desenvolvida pelo Estado para incentivar as pessoas a registrarem os casos de racismo. É necessário um movimento da Segurança Pública e prefeitura no sentido de dizer para as pessoas que elas tem o direito de viver em um país em que a Legislação será cumprida e que racismo é crime”, diz.
Embora reconheça que as pessoas têm denunciado com maior frequência, Iêda alerta que o número poderia ser ainda maior. “A gente vive em uma sociedade que está estruturada no racismo e o dia a dia da população negra é sofrido. Sofremos essas perseguições raciais o tempo todo”, lamenta.
Desigualdades sociais
Para o mestre em sociologia e doutorando em ciências sociais da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Evandro Cruz Silva, o racismo estrutural atua como indutor das desigualdades sociais. “Temos de lembrar que o Brasil é um país em que as desigualdades raciais e sociais geralmente se acompanham, de modo que os menos brancos são geralmente os mais pobres e desiguais. Num momento como o atual, em que a pandemia produz uma diminuição geral da produtividade esperada para a próxima geração, vemos que justamente os indígenas e negros são os mais afetados”, aponta.
As denúncias relacionadas ao racismo podem ser recebidas através do Disque 100 ou Disque Direitos Humanos, que é uma central de atendimento nacional. O Disque 100 é um serviço de atendimento telefônico gratuito, que funciona 24 horas por dia, nos 7 dias da semana. As denúncias recebidas na Ouvidoria dos Direitos Humanos e no Disque 100 são analisadas, tratadas e encaminhadas aos órgãos responsáveis.