Como influencer da periferia dribla depressão com humor nas redes sociais

Marcos, conhecido nas redes sociais como PeriferÍndio, usa as redes sociais para alegrar as pessoas, mas também para falar sobre depressão sem tabu

Postado em: 18-09-2023 às 08h21
Por: Tathyane Melo
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Marcos, conhecido nas redes sociais como PeriferÍndio, usa as redes sociais para alegrar as pessoas, mas também para falar sobre depressão sem tabu | Foto: Leandro Braz/O Hoje

Marcos Vinícius Pereira, conhecido como PeriferÍndio, de 34 anos, tem sido um instrumento contemporâneo para arrancar risadas de quem o acompanha nas redes sociais. Humorista por acaso, passa mais tempo em suas duas lojas – uma que conserta celulares e oferece videogames para quem quiser jogá-los e outra que vende milkshakes.

 Acostumado com a vida da periferia, onde tudo acontece, ele teve a ideia de gravar vídeos contando a realidade de outros bairros da cidade. O resultado é a fama que tem batido cada vez mais à porta. Por trás dos vídeos, no entanto, esconde uma fratura comum no gene de muita gente: a depressão.  

Ao longo do ano, a campanha do Setembro Amarelo destaca a importância de pedir ajuda e promover a conscientização sobre saúde mental. A iniciativa liderada pela Associação Brasileira de Psiquiatria e pelo Conselho Federal de Medicina busca combater o estigma associado à saúde mental e promover o entendimento de que a vida é a melhor escolha. O lema de 2023, “Se precisar, peça ajuda!”, reforça a mensagem de que todos precisam desempenhar um papel na prevenção ao suicídio. 

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Nesse contexto, é importante destacar histórias de superação e resiliência, como a de Marcos Vinícius, que encontrou no mundo digital uma forma de lidar com seus próprios desafios mentais. Marcos compartilha sua jornada nas redes sociais, usando o humor como uma válvula de escape e, ao mesmo tempo, promovendo a conscientização sobre a depressão.

“A ideia surgiu quando eu me encontrava em uma situação desconfortável mentalmente e escolhi filmar para distrair a mente. A comédia era inevitável, eu já era trágico e cômico”, diz. Em um dos vídeos ele fala de sua condição, mesclando seriedade e humor, quando classifica, ironicamente, que a “doença de cabeça” é coisa de “rico”. Uma forma de conscientizar uma camada menos informada sobre o problema. 

Marcos, cujos primeiros vídeos foram sobre o cotidiano engraçado de feiras e mercados, percebeu que a comédia era uma ferramenta poderosa para enfrentar seus próprios problemas mentais. Seus vídeos viralizaram, e ele encontrou uma comunidade de apoio online.

No que diz respeito à produção de conteúdo, Marcos Vinícius não segue uma programação rigorosa. Ele cria seus vídeos durante os intervalos de sua agitada vida, muitas vezes chamando amigos para aparecerem nas produções. Marcos conta que faz questão de abordar questões importantes, como a depressão, para quebrar tabus e oferecer suporte emocional a outros.

Em suas palavras, “rir é sempre o melhor remédio”, e um aliado para ajudar as pessoas a perseverar, mesmo nas situações mais difíceis. “A depressão é uma luta diária com nossa própria mente dia após dia. Procure algo que te faça continuar. Eu sei que é muito difícil e a gente quer desistir da vida, eu sei que é torturante, é cruel, mas procure um motivo.”, aconselha Marcos.

Em um mundo cada vez mais complexo, onde as pressões da vida moderna podem sobrecarregar as mentes mais resilientes, profissionais da área de saúde mental desempenham um papel crucial. Entre esses especialistas, encontramos a doutora em psicologia Ariana Fidelis, o médico psiquiatra e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Ciro Vargas, a psicóloga Maris de Oliveira e Leonardo Faria, psicólogo forense. Juntos, esses profissionais têm dedicado suas carreiras à avaliação psicológica.

A tristeza é um sentimento que todos nós, como seres humanos, experimentamos em algum momento de nossas vidas. O sofrimento é uma condição inerente à existência humana, mas como lidamos com esse sofrimento determina nossa relação com a tristeza. Para Ariana Fidelis, psicóloga e doutora em psicologia, a tristeza é um estado natural, mas quando persistente, pode evoluir para a depressão, uma síndrome que demanda atenção e cuidados específicos.

Ela acredita que um dos maiores obstáculos no enfrentamento da depressão é a falta de compreensão. Muitas vezes, a sociedade em geral confunde a depressão com tristeza comum, o que pode levar ao estigma e ao atraso no tratamento. Ariana destaca a importância de se evitar comentários insensíveis ou desinformados sobre a depressão, como rotulá-la como “frescura”.

No que diz respeito ao gênero, os registros médicos muitas vezes indicam que as mulheres têm taxas mais altas de depressão em comparação com os homens. No entanto, Ariana pontua que esse dado deve ser analisado com cautela: “As mulheres são, em geral, mais propensas a buscar ajuda e intervenção, o que pode explicar o registro de casos mais frequentes em comparação com os homens. Além disso, as mulheres enfrentam pressões sociais desiguais e muitas vezes precisam superar obstáculos adicionais em suas vidas, o que pode levar a um desgaste maior e, por consequência, a problemas depressivos”, explica.

A questão que surge é: como podemos distinguir a tristeza comum da depressão? Para esclarecer ainda mais essa condição debilitante, conversamos com Ciro Vargas, médico psiquiatra de renome, professor da UFG, e especialista em psiquiatria clínica e forense, que trouxe um olhar científico informativo sobre essa doença que afeta tantos indivíduos ao redor do mundo.

“A depressão é diferente da tristeza”, explica Ciro Vargas, que continua: “A tristeza é uma emoção comum na vida de todos, mas a depressão é um transtorno de humor que envolve uma constante sensação de tristeza, acompanhada por sintomas como desânimo, anedonia, mudanças no sono e apetite, entre outros.”

Navegando na era digital: uma forma de ajuda

Quanto às redes sociais, Ariana Fideles adverte que, embora possam proporcionar algum suporte e conhecimento sobre os sintomas da depressão, também podem ser uma armadilha. Leonardo Faria concorda e observa que as redes sociais muitas vezes projetam uma imagem irreal de sucesso e felicidade, o que pode levar as pessoas a se compararem e se sentirem inadequadas. Ele enfatiza a importância de equilibrar a vida online e offline, bem como buscar atividades que promovam o bem-estar mental.

“As redes sociais podem ter coisas muito boas, pessoas que conseguem ajudar outras que estão passando por esse momento, textos, vídeos que falam, que ajudam, isso existe e pode ser bom”. O médico alerta contudo para o risco que o uso das tecnologias pode causar por causa do isolamento. “Essa pessoa pode ser desviada para ostentação e atividades compulsivas na internet. Então, nesse momento, o contato social é mais valioso”, esclarece.

A Psicóloga Maris Eliana Dietz de Oliveira, uma renomada profissional de 52 anos de idade, atua como defensora da saúde mental e bem-estar e destaca a importância do apoio da comunidade no enfrentamento da depressão. Ela compreende que muitas pessoas que enfrentam a depressão se sentem isoladas e incapazes de buscar ajuda. É aqui que a Jornada de Saúde Mental e Fé Cristã, evento educativo promovido pelo Instituto Gartrell, no qual Maris é uma das principais organizadoras, desempenha um papel significativo.

A Jornada de Saúde Mental e Fé Cristã está em sua sétima edição e tem contado com a participação de profissionais de diversas regiões do país, abrangendo uma variedade de áreas do conhecimento científico dedicadas ao estudo e tratamento do cérebro e da saúde mental. Este evento, que já se tornou uma tradição, tem recebido amplo apoio de diferentes setores, incluindo educação, empresas e acadêmicos.

O engajamento de diversos setores da sociedade tem sido fundamental para tornar a Jornada acessível a um público mais amplo. A programação abrangente inclui palestras, painéis e workshops abordando temas como desenvolvimento integral, cognição, emoção, formação de crianças e adolescentes, além de outros tópicos relacionados ao desenvolvimento pessoal e bem-estar.

Para Maris, a jornada não é apenas um evento educativo, mas um espaço onde indivíduos podem compartilhar suas experiências e desafios sem o medo de serem julgados. O evento tem como lema “servir pessoas e promover saúde integral”.

Os participantes da Jornada não apenas têm a oportunidade de aprender com especialistas, mas também podem fazer perguntas e receber orientações personalizadas para suas necessidades. O evento se compromete a oferecer apoio e dicas valiosas, especialmente durante o Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio.

A busca por ajuda é fundamental para enfrentar a depressão. Isso inclui contar com o apoio de amigos e familiares, procurar profissionais qualificados, como psicólogos e psiquiatras, e adotar um estilo de vida saudável, que inclui atividades físicas e boa nutrição. A depressão pode ser uma jornada desafiadora, mas com o apoio adequado e uma abordagem multidisciplinar, é possível superá-la e encontrar um equilíbrio emocional duradouro.

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