Deputado Zacharias Calil entende que não é hora de afrouxar o isolamento social
Ao comentar a realidade goiana, em que o setor produtivo pede a retomada das atividades econômicas, o parlamentar usa a história e a pesquisa para embasar| Foto: Cristovão Matos
Rubens Salomão
O médico e deputado federal Zacharias Calil (DEM) entende que não é hora de afrouxar o isolamento social. Ao comentar a realidade goiana, em que o setor produtivo pede a retomada das atividades econômicas, o parlamentar usa a história e a pesquisa para embasar. Segundo ele, a experiência com a gripe espanhola de 1918 mostra que os estados que optaram pelo fechamento antecipado tiveram sucesso na retomada econômica. Outra preocupação de Zacharias é com a falta de oferta de respiradores no mercado, o que poderia agravar ainda mais a crise.
Ao O Hoje, Zacharias Calil ressalta a preocupação com os profissionais de saúde, que têm se contaminado durante o trabalho de enfrentamento ao novo Coronavírus.
Você participa da Comissão Externa de Atividades e Ações Preventivas ao Coronavírus e a comissão está conversando pela primeira vez com o novo ministro da saúde Nelson Teich. Como o senhor está vendo o ministério e a atuação do novo ministro?
Acho que ele ainda está numa fase de adaptação, ele tem que ter um conhecimento geral do ministério, mas tenho acompanhado e ele tem progredido porque não é possível uma pessoa que às vezes vem de fora da iniciativa privada e entra de repente e saber de tudo, assimilar todo aquele processo que nós estamos acompanhando desde dezembro com o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta. Ele [Nelson Teich] é um pouco mais reservado, mas ainda por não ter entender o SUS, a gente sabe que ele tem dificuldade em entender o SUS e precisa se resolver, porque está, inclusive, os técnicos estão ali para ajudar no que for preciso, eu acho que pelo que eu vi dele, é uma pessoa extremamente séria, comprometido, tem tudo para fazer um bom trabalho pelo Brasil.
Você me adiantou que ele vai percorrer os Estados com lideranças regionais, certo?
É, isso é importantíssimo. O que ele fez lá em Manaus foi quando nós conversamos na convenção, falei: “Escuta aqui, o ministro vai lá visitar Manaus, espera aí, ele vai visitar para quê?” Todos nós aqui sabemos o que está acontecendo lá, ele tem que dar soluções e recursos, que foi o que ele fez. Ele pegou o avião da FAB, médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, equipamentos e levou para lá. Então essa é uma atitude correta de um político parlamentar, de um ministro. Você não apresentar teorias, você tem que dar resultados, você tem que ter resultados e apresentar o que você veio fazer aqui: ‘Vim entregar equipamentos’, ótimo. É o que a gente precisa, nós não queremos ‘blábláblá’ aqui não. A população não precisa disso.
Você acha que a flexibilização das normas estaduais e jogar a responsabilidade para os municípios é certo? Ou manter as rédeas e manter o isolamento em favor dos números?
Eu sou a favor do isolamento horizontal, não sou a favor por ouvir dizer não, eu sei que a Economia está sofrendo, eu sei que todo mundo está sofrendo em relação a isso. Mas veja bem, os estudos científicos mostram que os Estados, por exemplo, citam muito a gripe espanhola de 1918, que ela entrou nos Estados Unidos através da Filadélfia. Então por exemplo, quando eles perceberam que aquilo poderia causar uma epidemia na época, os Estados se isolaram, e os Estados que fizeram o isolamento precoce e por maior tempo, ele recuperou mais a Economia e em um tempo melhor. Então veja bem, vamos citar a Europa agora, enquanto a Espanha e a Itália estão naquela marca de mais de 10 mil mortos, o quê que Portugal fez? Antecipou. Principalmente entre os idosos, porque Portugal tem uma taxa de idosos de mais ou menos 20%. E a Alemanha também. Então eles se isolaram e hoje, Portugal teve 200 casos de mortes, então não causou um colapso na saúde. Então o problema nosso, aqui, que o governador fez e eu acompanhei muito bem quando ele inaugurou o Hospital de Campanha, a preocupação nossa aqui é que nós não tínhamos equipamentos, não tinha EPIs, não tinha álcool em gel disponível em grande quantidade, respiradores, uma série de outros equipamentos. Ele falou ‘eu vou fechar, porque se não fechar, vai colapsar’, então vai chegar um ponto que nós já estamos chegando hoje, eu conversei com a secretária de saúde do município hoje cedo, Fátima Mrué, e ela estava me explicando que tem dinheiro hoje, mas não tem como comprar respirador, porquê não tem no mercado. Isso aí vai chegar num ponto que se tem dinheiro, tem estrutura e não tem o equipamento e os pacientes estão aumento a cada dia.
O governador tem falado sobre retomar essa flexibilização e voltar o isolamento. Você acha que essa é a solução?
Pelo que eu estou vendo nos jornais, nós tivemos um aumento e chegamos a mil casos e o número de mortes aumentaram. Eu estou falando como médico, não estou falando como político, a gente tem que ver a saúde da população porque vai aumentar e a curva vai embora, mais tem um detalhe, a curva de Goiânia está achatada e isso é um fator positivo porque as pessoas tem que se conscientizarem.
Qual é a preocupação em relação aos profissionais que estão na linha de frente ao combate do Coronavírus?
O Índice de contaminação do profissional da área de saúde está muito alto, mas eu não digo o profissional da área da saúde, mas as pessoas que estão em contato direto com a Covid-19. Por exemplo, você chega a um hospital aí e quem que vai te atender na porta de entrada? É o agente de segurança, ele que tem o primeiro contato com você e ele precisa ter os equipamentos de proteção individual, ele tem que ser testado e não só ele, mas hoje em dia tem um pessoal que também está lá, não adianta pensar só no médico, na enfermeira… E a pessoa que está lá na limpeza? A pessoa da limpeza é essencial na atuação de uma UTI, de um centro cirúrgico, entendeu? Eu sou cirurgião, faço aquelas cirurgias grandes e quando termina as cirurgias e se não são elas ali, o hospital entra num índice de contaminação altíssimo.
É possível saber quando vai ser o pico da doença no Brasil ou isso é impossível devido ao tamanho das situações diferentes em cada região? O pico em Goiás vai ser muito diferente do pico do Brasil?
Pelo que eu vi na fala do ministro, ele diz o seguinte, eles estão fazendo a coisa por etapa, se aparece mais casos ali, eles vão lá e tratam, é como você falou, regionalização do Coronavírus, vai depender da maneira que o Estado agiu. Depende muito de cada região, ele é um vírus totalmente desconhecido, ninguém sabe muito como ele agiu nos países, será que ele vai ter o mesmo comportamento aqui no Brasil?
Você tem destinado emendas para a Saúde. Esse trabalho continua?
Continua, eu recebi um telefonema do meu líder que me deixou muito feliz, vão ser disponibilizados 10 milhões e eu teria até as 14h de hoje [quarta-feira] para decidir quais seriam os municípios que nós vamos atuar na distribuição desse dinheiro que só pode ser utilizados no combate ao Covid-19. Não vai ser utilizado para alta-complexidade e ações básicas, apenas para o Covid-19. Então nós já decidimos 41 municípios. Às vezes você não pode destinar a um município que só tem um posto de saúde, o prefeito ali e eu trabalho assim, eu mando uma cópia da emenda, do valor e da destinação para o município e o Ministério Público emite um documento pedindo informação a respeito dessa emenda, porque esse dinheiro não pode ser desviado como tem acontecido em alguns outros Estados, então eu acho que Goiânia vai ser, mais uma vez, contemplada. Essa semana foram R$ 1,87 milhão e eu falo Goiânia porque nós estamos mais aqui, 500 mil para o Banco de Olhos que presta um serviço muito grande à sociedade e mais 200 mil para a Associação dos Surdos e Mudos, que eu acho que é algo muito importante, às vezes são pessoas que estão ali esquecidos.
Mesmo com a agenda lotada você continua trabalhando no HMI?
Sim, agora mesmo eu vou visitar duas irmãs gêmeas siamesas que vieram de São Paulo, elas conseguiram alojamento para ficar ali na Casa de Apoio da Igreja Santo Expedito, ali no Jardim América e agora a gente pode ajudar a igreja – tem muitas coisas que eles precisam e nós iremos ajudar também. Elas vão ficar lá vão fazer exames, já está tudo agendado.
Acha que o governo deveria criar uma força-tarefa com especialistas aqui em Goiás?
Olha, eu não sei te dizer com sinceridade, eu não participo de nada, eu não sei como que é está, mas pelo jeito está indo bem, acredito que o governo tenha seus especialistas e sua força-tarefa que atua nessa área, mas os deputados não participam, não sei por qual motivo, mas meus parabéns, acho que nós estamos conseguindo ser uma referência no Brasil. Inclusive eu chamei a atenção do ministro hoje, porque nós estamos lidando com duas coisas sérias no Brasil: uma é a epidemia da dengue, será que todo mundo esqueceu da dengue? Mas a dengue teve um aumento de quase 300%. Outra coisa que eu cobrei do ministro hoje é que ele tem que fazer campanha de isolamento, o próprio Ministério da Saúde tem que fazer campanha de isolamento, se hoje é a principal medida preventiva, porque não fazer?
Mas o presidente não defende.
E ele está vendo o prejuízo, hoje tem mais de 8 mil mortes. Você fala de mortes, 8 mil, você não está falando de números, você está falando de pessoas. Eu vi esses dias uma matéria de uma técnica em enfermagem que perdeu o irmão e ela falou: ‘Vocês estão falando milhões, bilhões, e eu estou falando de um número, o ser humano não é um número, quando acontecer na sua família você vai ver o drama que é, o que isso causou, a repercussão que isso causou e a consequência posterior’. Então acho que é uma conduta que o presidente talvez, acha que é dono do nariz dele e ele vai fazer do jeito dele, mas ele tem que preocupar que ele é o presidente da República.
E a preocupação dele com a Economia? Muita gente concorda.
Eu também concordo, tem essa preocupação, mas o que você prefere: amanhã ter condições de trabalhar ou não ter condições por você estar doente? E o custo disso na sua família? Uma pessoa próxima a você, irmão ou marido, isso é muito sério.