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sábado, 23 de novembro de 2024
Mudança de cor

Candidatos alteraram autodeclaração de cor da pele entre 2020 e 2024

A maioria dos candidatos que se declararam brancos em 2020 agora se autodeclara parda

Postado em 19 de agosto de 2024 por Herbert Alencar
candidatos
Foto: Divulgação/TSE

Ao menos 42 mil candidatos nas eleições municipais deste ano alteraram a autodeclaração de cor e raça em relação ao que declararam no último pleito, em 2020. Essa mudança impacta um em cada quatro (24%) postulantes que concorreram nas eleições municipais anteriores e solicitaram registro para a disputa de 2024.

Esses candidatos, que apresentaram novas autodeclarações, correspondem a 9,3% do total de 454 mil candidaturas inscritas e incluídas no sistema do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até as 16h30 desta sexta-feira (16). Os números ainda podem variar, já que os pedidos feitos presencialmente ainda estão sendo adicionados à plataforma.

A maioria dos candidatos que se declararam brancos em 2020 agora se autodeclara parda. Esse grupo representa 40,4% de todos os que alteraram o registro de raça, totalizando 16,9 mil pessoas. Esse tipo de alteração no cadastro étnico-racial da Justiça Eleitoral concede ao candidato o direito de usufruir das cotas eleitorais para candidatos negros.

Movimentos inversos e análise regional

O movimento inverso, de pardo para branco, aparece em seguida, com 27,6% das alterações, ou seja, 11,5 mil mudanças. Outros 14,8% dos inscritos mudaram de pardo para preto (6.221) e 11,2% de preto para pardo (4.729). Ambas as alterações não afetam a distribuição de recursos do fundo eleitoral, uma vez que a regra considera pretos e pardos como negros.

Para essa análise, a Folha considerou apenas os candidatos que concorreram tanto em 2020 quanto em 2024 e que forneceram informações sobre raça em ambas as inscrições. O Mobiliza Nacional é o partido que, proporcionalmente, mais teve candidatos que mudaram de autodeclaração: 30,2%. Em termos absolutos, essa porcentagem representa 576 nomes. As maiores alterações entre os candidatos dessa legenda foram de branco para pardo (43,1%) e de pardo para branco (28,1%).

Em números absolutos, o partido com o maior número de mudanças na declaração racial foi o MDB, com 4.324 alterações. Esse valor representa 22,3% dos inscritos da sigla que disputaram em 2020 e se inscreveram neste ano. Por estado, as maiores mudanças ocorreram na Paraíba, onde 32,4% dos inscritos registraram alterações na autodeclaração para a disputa de 2024. Segundo dados do IBGE, o estado é majoritariamente composto por pardos (55,5%), seguido por brancos (35,72%) e pretos (7,96%). Amarelos e indígenas somam 0,7%.

Histórico de mudanças e resoluções do TSE

Entre as eleições de 2016 e 2020, o percentual de mudanças na autodeclaração de cor foi semelhante, atingindo 26% dos candidatos. Na época, foi constatado que muitos candidatos preenchiam o registro de cor de maneira descuidada, ou deixavam essa tarefa a cargo do partido.

Em fevereiro deste ano, o TSE acolheu sugestões na resolução referente ao registro de candidaturas para evitar fraudes. No formulário, o candidato deve declarar ciência sobre informações como “nome social, identidade de gênero, cor ou raça, etnia indígena, pertencimento a comunidade quilombola, deficiência e estado civil”.

A resolução determina que, em caso de divergência, as autoridades intimarão os responsáveis para confirmar a declaração racial e notificarão o Ministério Público Eleitoral para fiscalização. Se houver erro admitido ou ausência de manifestação, as autoridades ajustarão a cor ou raça conforme o Cadastro Eleitoral ou registro anterior, proibindo a transferência de recursos públicos.

Opiniões de especialistas sobre a mudança

Doutor em ciência política, o professor da UFBA (Universidade Federal da Bahia) e membro da Abrapel (Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais) Cloves Oliveira enfatiza que, desde os anos 2000, a classificação racial se tornou um critério essencial no acesso a políticas públicas. “Não é algo subjetivo se classificar como preto, pardo, branco, indígena ou quilombola no Brasil hoje. Isso representa uma disputa por recursos e é nesse sentido que surgem todos os debates que estão em pauta sobre até que ponto essas classificações raciais refletem a identidade social dessas pessoas.”

Cloves considera que a mudança de autodeclaração de branco para pardo indica afroconveniência, enquanto a de pardo para negro reflete um “ajuste de conduta para evitar danos de execração pública por declarar uma cor que não é socialmente reconhecida.”. Já a mudança de pardo para preto aponta para a afirmação da identidade política.

O professor da UnB e um dos autores do livro “Raça e Eleições no Brasil”, Carlos Machado, oferece uma perspectiva diferente.

Discussão sobre acesso a recursos e PEC da Anistia

Ele considera a informação sobre raça subjetiva e alterável pelo reconhecimento de identidade, pressão de grupos ou busca de algum benefício. “A maior parte dessas mudanças ocorre de brancos para pardos, sugerindo possível viés por ganho eleitoral. Contudo, há pardos se identificando como brancos, indicando um processo não unilateral.”

Machado também questiona a interpretação de que a mudança visa o acesso a recursos, uma vez que a distribuição não tem sido cumprida pelos partidos. Na última quinta-feira (15), o Senado aprovou a chamada PEC da Anistia, que, entre outros pontos, revoga a determinação de que negros devem receber verba eleitoral proporcional ao número de candidatos, conforme decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) válida desde 2020.

Impactos futuros das mudanças na legislação

Na disputa de 2022, por exemplo, os partidos descumpriram de forma generalizada a determinação de que pretos e pardos deveriam receber 50% da verba eleitoral de R$ 5 bilhões.Com a PEC, as legendas devem aplicar 30% dos recursos nas candidaturas de negros, reduzindo o percentual de cerca de 50% para 30%. O projeto permite que partidos que descumpriram a cota racial em 2020 e 2022 compensem nas quatro disputas seguintes, a partir de 2026, evitando punição.

Fonte: Folha de S. Paulo

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