Hugo Motta frustra bolsonaristas ao se aproximar do Planalto
Presidente da Câmara tem evitado pautar temas caros à base bolsonarista e acompanhado Lula em agendas internacionais

Bruno Goulart
A atuação do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos), tem causado uma insatisfação entre os parlamentares bolsonaristas. Eleito com um discurso de independência, Motta tem adotado posturas que indicam uma aproximação com o Palácio do Planalto, afastando-se das pautas defendidas pela oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A frustração entre os aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) aumentou após Motta participar de um jantar na casa do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. O encontro ocorreu pouco depois de Moraes negar um pedido de apreensão do passaporte do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). No dia seguinte, em uma sessão especial pelos 40 anos da redemocratização do Brasil, o presidente da Câmara declarou que “não existem mais perseguições políticas ou exilados políticos no Brasil”, uma fala interpretada como um aceno ao governo e ao próprio STF no mesmo dia em que Eduardo Bolsonaro anunciava auto exílio nos Estados Unidos.
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Além disso, Motta acompanha o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em uma viagem oficial pela Ásia, que incluiu visitas ao Japão e ao Vietnã, reforçando os laços comerciais com os dois países. O movimento foi visto como um gesto de cooperação com o Executivo, contrariando setores da base bolsonarista que esperavam uma postura mais combativa em relação ao governo petista.
Outro ponto de tensão foi a declaração de Motta à GloboNews, nesta quinta-feira (27), afirmando que a possibilidade de pautar o projeto de anistia aos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 é “zero” no momento. A afirmação causou insatisfação dentro do PL e entre aliados de Bolsonaro, que veem no projeto uma forma de proteger manifestantes presos pela tentativa de golpe contra o governo federal. O partido vinha articulando apoio para colocar a proposta em votação ainda na primeira quinzena de abril, mas o presidente da Câmara já sinalizou que não deve ceder às pressões.
Nos bastidores, aliados de Motta afirmam que ele considera desnecessário pautar o projeto de anistia neste momento, pois isso poderia desgastar ainda mais sua relação com o Planalto. Sua proximidade com Lula tem sido cada vez mais evidente, especialmente no contexto do julgamento de Bolsonaro no STF, onde ele se tornou réu por tentativa de golpe de Estado. O cientista político Felipe Fulquim avalia que esse contexto pode afastar ainda mais aliados do ex-presidente.
“O bolsonarismo levou um dos golpes mais duros com a declaração de Bolsonaro como réu pelo STF. Essa questão não é o único fator para a postura de Hugo Motta, mas serve como um indicativo de que ele e outros políticos com afinidade bolsonarista estão reconsiderando sua lealdade”, afirma Fulquim. “Se olharmos para o passado, Lula passou por um processo semelhante durante a Lava Jato, enfrentando denúncias, julgamentos e até prisão. A questão é se Bolsonaro terá a mesma resiliência para resistir ao processo que agora se desenha contra ele.”
Dessa forma, Fulquim entende que a postura de Hugo Motta é de consolidar sua posição no centro político, evitando o desgaste com o governo e com o Judiciário. Por outro lado, esse movimento pode resultar em um rompimento definitivo com a ala bolsonarista, que já demonstra sinais de descontentamento com o presidente da Câmara.