Crise nos cemitérios faz com que sepultamentos sejam realizados à base de vaquinha
Falta de cimento, tijolos e areia obriga servidores a improvisar enterros com doações e reaproveitamento de materiais

A Prefeitura de Goiânia tem enfrentado dificuldades para realizar sepultamentos nos cemitérios públicos por falta de materiais básicos como cimento, tijolos, areia e vergalhões, essenciais para a construção e fechamento de túmulos. A escassez tem sido contornada com doações e até vaquinhas entre secretários municipais.
Durante visita ao Cemitério Municipal Parque, localizado no Setor Gentil Meireles, a equipe do jornal O Hoje se deparou com um cenário de abandono, precariedade e improviso. Funcionários relataram uma rotina marcada pela ausência de insumos, uso de ferramentas improvisadas e reaproveitamento de materiais encontrados entre os túmulos. Segundo eles, há apenas um carrinho de transporte em funcionamento e, com frequência, é preciso “buscar cimento emprestado” para concluir enterros.
“Às vezes temos que catar tijolo entre as quadras ou pedir doação. Agora tem um pouco de material, mas o cimento mesmo falta bastante”, relatou um trabalhador que atua no local há 17 anos. “Está tudo largado. A gente faz o que pode com o que tem.”
Além da escassez de materiais, o local sofre com estrutura precária, túmulos depredados, lixo acumulado, falta de iluminação e insegurança. O mato alto e a ausência de muros facilitam a ação de vândalos, e ossadas expostas não são uma cena incomum.
Segundo o decreto municipal 2.813/2019, a conservação dos túmulos é responsabilidade das famílias. No entanto, à Prefeitura cabe garantir segurança, higiene e limpeza permanentes nos cemitérios públicos, como o Parque e o Santana. A prática, porém, está longe da teoria.
O drama atinge diretamente as famílias, que, em momentos de dor, enfrentam ainda mais sofrimento ao enterrar seus entes queridos em meio ao descaso. A falta de materiais básicos compromete o fechamento adequado dos túmulos, gerando insegurança quanto à preservação dos restos mortais.
Em um caso recente, uma família precisou solicitar a exumação de um corpo após o túmulo ter sido violado. A perícia confirmou que os restos mortais permaneciam no local, mas a violação revelou o risco da ausência de manutenção e fiscalização.
Infraestrutura abandonada e insegurança total
As obras de calçamento e construção de muros, iniciadas há anos, permanecem inacabadas, sem previsão de conclusão. À noite, o cemitério se transforma em terra sem lei: sem guardas, sem iluminação e com acesso totalmente aberto. Túmulos danificados e lixo espalhado se tornam parte da paisagem.
“Aqui não tem guarda, não tem muro, não tem luz. Entra quem quer e faz o que quiser”, disse outro servidor. “A Comurg vem de vez em quando, roça o mato e vai embora.”
Durante a visita da reportagem, foi possível ver infiltrações na área administrativa, espaços cobertos com lonas e equipamentos quebrados. Além do único carrinho de sepultamento funcional, veículos maiores estão parados por falta de manutenção.
Enquanto a administração pública aguarda a conclusão de processos licitatórios e tenta dar respostas burocráticas, servidores e famílias lidam com a realidade: um cemitério sem estrutura, sem segurança e sem dignidade.
Resposta da Prefeitura de Goiânia
A Prefeitura de Goiânia reconhece as dificuldades enfrentadas na manutenção e operação dos cemitérios municipais, agravadas pela ausência de contratos de manutenção que não foram deixados pela gestão anterior. Essa situação resultou na escassez de materiais básicos, como cimento, areia, tijolos e vergalhões, essenciais para a realização de sepultamentos.
Diante da urgência, a Secretaria Municipal de Gestão de Negócios e Parcerias (Segenp) iniciou um processo de compra emergencial no valor de R$ 62 mil, com previsão de suprir a demanda por aproximadamente seis meses das unidades geridas pela pasta. Paralelamente, uma licitação definitiva para aquisição desses insumos está em andamento na Secretaria Municipal de Administração (Semad).
Enquanto a compra emergencial não é concluída, os sepultamentos estão sendo viabilizados por meio de doações e ações solidárias. A Segenp também conta com o apoio da Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana (Seinfra), que tem colaborado com o fornecimento de materiais, como caminhões de areia.
A gestão municipal reforça que, conforme o Decreto nº 2.813/2019, a conservação dos túmulos dos cemitérios Parque e Santana é de responsabilidade das famílias, cabendo ao Poder Público a manutenção da infraestrutura, limpeza e segurança dos cemitérios.