Consórcio da Paz quer integrar polícias e agilizar ações entre Estados
Com sede no Rio de Janeiro, o pacto liderado por Cláudio Castro e articulado por Caiado vai permitir troca automática de informações, operações conjuntas e criação de protocolos unificados de segurança pública
Bruno Goulart
Após reunião no Rio de Janeiro com governadores aliados na quinta-feira (30/10), o governador Cláudio Castro (PL-RJ) anunciou a criação do Consórcio da Paz, um pacto interestadual voltado à segurança pública. A proposta, que conta com a adesão de Ronaldo Caiado (União Brasil-GO), Romeu Zema (Novo-MG), Eduardo Riedel (PP-MS), Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e Ibaneis Rocha (MDB-DF), busca institucionalizar a cooperação entre as forças policiais dos Estados e enfrentar o avanço das facções criminosas no País.
Interlocutores do governo goiano explicaram que o Consórcio da Paz funcionará como uma entidade formal de cooperação interestadual para facilitar o compartilhamento automático de informações sobre facções, fugitivos e crimes interestaduais. A intenção é eliminar a burocracia que hoje atrasa a comunicação entre as forças de segurança. “Não vai mais precisar mandar ofício ou esperar autorização. A troca de informações será imediata”, detalhou uma fonte ao O HOJE.
Sobre o papel de Ronaldo Caiado no Consórcio da Paz, deverá ser o mesmo dos demais governadores, o de comandante das forças estaduais e articulador político da adesão de novas unidades federativas. Segundo auxiliares, Caiado foi um dos principais entusiastas da criação do grupo. Além disso, o governador aposta, neste momento, na visibilidade nacional da segurança goiana, frequentemente usada pelo chefe do Palácio das Esmeraldas como vitrine de gestão.
Defesa do Consórcio da Paz

A iniciativa, contudo, divide a opinião de especialistas e profissionais da área. Para o coronel Almeida, presidente da Associação dos Veteranos do Estado de Goiás (Avego), que atua há décadas na segurança pública, a criação do Consórcio da Paz representa um passo importante. “Não tem como combater bandido com flores. É preciso planejamento e integração. As facções se infiltram nas comunidades, cooptam famílias e até entram no comércio. Essa união entre os Estados é essencial”, disse.
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Almeida, no entanto, fez críticas à ausência de resultados do governo federal. “Se os governadores estão criando esse consórcio, é porque o Ministério da Justiça e a Senasp [Secretaria Nacional de Segurança Pública] não estão fazendo o que deveriam”, afirmou. Para o militar, a cooperação deve ser permanente, mas acompanhada de políticas públicas de prevenção. “Não é só operação policial. O Estado peca muito. No passado, ao invés de mandar escolas, mandou policial”, relembra Almeida, ao afirmar que isso colabora com mais violência nas comunidades.
Aprofundar a militarização
Na visão da antropóloga Yasmin Rodrigues, pesquisadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) e do Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre Criminalidade e Violência da Universidade Federal de Goás (Necrivi/UFG), o Consórcio da Paz pode aprofundar a lógica de militarização. “Estamos investindo em armamento e em operações letais que paralisam cidades inteiras. O Rio de Janeiro vive um trauma coletivo. As pessoas ficam em pânico, o comércio fecha, escolas interrompem aulas e serviços de saúde param”, criticou.
Segundo Yasmin, o modelo atual de enfrentamento apenas repete ciclos de violência sem resultados concretos. “O crime e o Estado se misturam no cotidiano das favelas. Não adianta reunir governadores para criar planos isolados, enquanto se boicota o projeto nacional de segurança [PEC da Segurança Pública] que está em tramitação. É preciso cooperação dos governadores com o governo federal e vice-versa”, defendeu.
A antropóloga também destacou os impactos psicológicos e sociais das operações. “Uma pesquisa do CESeC em 2023 mostrou que moradores de favelas com mais confrontos policiais têm índices de depressão de 30% e de ansiedade de 25%. Isso afeta a saúde, a educação e a economia local.” (Especial para O HOJE)