Entenda a Lei Larissa Manoela, aprovada na Câmara para proteger patrimônio de jovens artistas
Inspirado no caso da atriz, projeto define limites para pais na gestão do dinheiro de filhos menores; texto segue para o Senado
A vida de crianças e adolescentes que trabalham no meio artístico pode parecer um sonho, mas por trás das câmeras e dos holofotes, há desafios sérios — especialmente quando o assunto é o controle do próprio dinheiro. Foi nesta premissa que a Câmara dos Deputados aprovou, recentemente, o projeto conhecido como “Lei Larissa Manoela”, uma proposta que busca proteger os direitos patrimoniais de menores de idade envolvidos em atividades remuneradas. O texto segue agora para análise no Senado.
O projeto ganhou força após o caso da atriz Larissa Manoela vir à tona em agosto de 2023. Em entrevista ao Fantástico, a artista revelou que abriu mão de cerca de R$ 18 milhões para evitar um embate judicial com os pais, que cuidavam da gestão de sua carreira desde a infância.
Segundo Larissa Manoela, ela tinha apenas 2% de participação na empresa criada pelos próprios pais para administrar seus contratos e, mesmo já maior de idade, precisava pedir autorização para fazer gastos simples, como ir à praia. O projeto foi protocolado na Câmara apenas um dia depois da repercussão da entrevista.
Quem é Larissa Manoela
Larissa Manoela é uma atriz, cantora e empresária brasileira que iniciou sua carreira artística aos quatro anos de idade. Ficou nacionalmente conhecida por suas atuações em novelas infantis e adolescentes, como Carrossel e Cúmplices de um Resgate, ambas exibidas pelo SBT. Também teve passagens por produções da TV Globo e da Netflix, consolidando-se como um dos nomes mais populares de sua geração. Além do trabalho na televisão, Larissa Manoela atua no cinema, teatro, publicidade e mantém forte presença nas redes sociais, onde acumula milhões de seguidores.

Nova lei define limites para o uso do dinheiro por pais e responsáveis
O texto aprovado estabelece que, em casos de indícios de abuso na gestão do patrimônio de menores, a Justiça poderá intervir e até limitar o uso dos recursos, visando sempre o melhor interesse da criança ou adolescente. Embora os pais ou responsáveis possam ser compensados financeiramente por administrar a carreira do filho, o projeto determina que isso deve ser feito com responsabilidade, transparência e supervisão judicial.
A professora Marcela Iossi, mestra em Direito e docente da Faculdade Estácio, avalia que a medida é um avanço importante na proteção de jovens artistas. “Precisa ter um equilíbrio entre permitir que jovens desenvolvam suas carreiras e assegurar que seus direitos sejam plenamente protegidos. A supervisão judicial proposta pela lei é essencial para prevenir abusos e garantir a integridade patrimonial desses artistas e outros profissionais”, explica.
Marcela também reforça que a legislação não proíbe os pais de receberem pela administração da carreira dos filhos, desde que isso aconteça de forma legal e em benefício do menor. “Gerir a carreira de um filho que trabalha como artista é, na prática, assumir um papel de administrador. A lei não retira o direito de receber por esse serviço, desde que tudo seja feito com responsabilidade e respeito ao patrimônio da criança”, pontua.
Trabalho infantil artístico nas redes sociais levanta alerta
O crescimento do número de crianças influenciadoras digitais tornou ainda mais urgente a regulamentação do tema. Atualmente, milhares de jovens criadores de conteúdo firmam parcerias publicitárias e acumulam seguidores — muitas vezes, sem que haja qualquer controle sobre a gestão dos ganhos financeiros.
O trabalho artístico é permitido por lei mediante autorização judicial, com fiscalização do Ministério Público sobre o ambiente e a jornada. No entanto, o uso do dinheiro recebido permanece fora do alcance de fiscalização direta, sendo inteiramente administrado pelos responsáveis legais.
A advogada Ana Luisa, em entrevista para o g1, explicou que os pais podem usufruir parcialmente dos frutos do trabalho dos filhos, como os rendimentos de uma aplicação, por exemplo. “Se a criança recebe R$ 100 mil em um contrato de publicidade, o valor principal deve ser dela. Os pais podem usar os juros ou investir, desde que em benefício do menor. E só deveriam acessar o valor principal em situações excepcionais, como tratamentos médicos, por exemplo”, explica.
No caso de jovens artistas com agendas intensas, como Larissa Manoela — que começou a trabalhar aos quatro anos de idade e soma 18 anos de carreira —, é aceitável que os pais deixem outras ocupações profissionais para se dedicarem à administração da carreira do filho. Nesses casos, a lei prevê que eles possam receber uma espécie de remuneração por esse trabalho, o que precisa ser feito de forma transparente e com base em regras definidas pela Justiça.
Proposta prevê mecanismos de fiscalização e proteção judicial
A proposta em discussão também sinaliza a necessidade de aperfeiçoar os mecanismos de controle sobre o patrimônio de menores com rendimentos expressivos. Entre as medidas debatidas, estão a realização de auditorias regulares nas contas, a criação de fundos bloqueados que só possam ser acessados após a maioridade — salvo autorização judicial — e a capacitação de juízes e promotores especializados em direitos da infância para lidar com essas situações.
A professora Marcela Iossi destaca que a proposta vai além da questão patrimonial. “Mais do que uma medida pontual, a Lei Larissa Manoela precisa ser vista como parte de um conjunto de estratégias para garantir o cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente, que já determina que a prioridade deve ser sempre o melhor interesse da criança, inclusive em sua proteção econômica”, afirma.
Campanhas de conscientização também estão no radar de especialistas como ferramenta essencial para informar pais e jovens artistas sobre seus direitos e deveres. A expectativa é que, se aprovada no Senado, a Lei Larissa Manoela contribua para coibir situações de exploração e garantir um ambiente mais seguro e justo para crianças e adolescentes que trabalham — seja nas artes tradicionais, seja no universo digital.
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