Falta de qualificação deixa milhares de vagas de trabalho em aberto

Roberto Parizotti/Fotos Públicas

Postado em: 17-10-2022 às 06h30
Por: Alexandre Paes
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Desemprego cai de 11,1% para 9,3%, mas o Brasil é o 5º país com maior número de desempregados | Foto: Roberto Parizotti/Fotos Públicas

A falta de emprego ainda persegue os brasileiros, mas a situação fica pior para 30% da população desempregada do país. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) mostram que três a cada dez desempregados buscam por uma vaga há pelo menos dois anos.

Segundo a pesquisa, pouco mais de 2,9 milhões de pessoas estavam em busca de um emprego há mais de dois anos no segundo trimestre. O IBGE já tinha estimado que a população desempregada ultrapassa os 10 milhões de brasileiros.

Em um ano, a taxa de desemprego do Brasil teve a queda mais intensa de uma lista com 40 países, conforme ranking da agência de classificação de risco Austin Rating. Ainda assim, o indicador local está entre os mais elevados. É o quinto maior do levantamento, que avalia o comportamento de nações com dados já divulgados até julho.

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A taxa de desemprego brasileira estava em 11,1% no primeiro trimestre de 2022, quando a economia ainda era afetada por restrições para frear a Covid-19. No entanto, o indicador recuou para 9,1% no segundo trimestre deste ano. A queda foi de 2 pontos percentuais.

Mesmo com o alto desemprego no Brasil, as empresas têm relatado problemas na hora de preencher as vagas. Um dos desafios é encontrar trabalhadores qualificados. “Muita gente não possui sequer um curso de computação, e não entende muito bem ferramentas básicas como as plataformas da Microsoft por exemplo. Aqui na empresa 80% dos serviços ofertados dependem destas ferramentas, e sem qualificação acabamos dispensando”, afirmou Débora Oliveira, gerente de RH.

O economista Celso Bissoli Sessa destacou que a pandemia piorou essa questão, mas se comparar com cenário antes e depois, já existia um problema muito grande no país. “Quando a gente fala de qualificação, é muito importante investir em qualificação, se o crescimento econômico não é constante ao longo do tempo, o esforço em qualificar é jogado no lixo. Temos que conseguir um acesso maior, principalmente, para os jovens à educação formal”, pontua Sessa.

Não diferentemente dele, o também especialista Diego Dias acredita que o mundo passa por um período de grandes mudanças provocadas por avanços tecnológicos que modificam, criam e extinguem atividades. “As pessoas mais qualificadas tecnicamente, com qualificações bem específicas, também encontram dificuldade no Brasil e até saem do país. São dois os problemas, um é a falta de remuneração adequada, e o outro são as informalidades trabalhistas. Muita gente prefere não ter vínculo empregatício e continuar fazendo os chamados bicos de freelancers ou contratos temporários”, explica Dias.

Desistência na busca

O número de desalentados (pessoas que desistiram de procurar emprego) no segundo trimestre de 2022 atingiu a marca de 4,3 milhões, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). A pesquisa, no entanto, não revelou os motivos que fizeram a população desempregada desistir das buscas.

Mas de acordo com os economistas e especialistas em recursos humanos, esse número pode aumentar nos próximos meses, motivado, principalmente, pela falta de qualificação profissional dos candidatos. Segundo os profissionais, empresas buscam funcionários dispostos a acumular funções e que sejam especializados nos cargos que vão ocupar.

Nem com experiência

Isso foi o que aconteceu com Danielly Brandão, 48, que mesmo possuindo formação superior em Publicidade, e tendo diversas experiências na área, tem enfrentado a falta de oportunidade no mercado, e permanece tecnicamente desempregada. 

“Já estou a 4 anos parada. De lá pra cá vem fazendo bicos no comércio de alimentos, vendendo sazonalmente doces típicos festivos como bolos de aniversário e bombons. Essa foi a única maneira de buscar uma renda para viver, já que na minha área de formação os contratantes buscam por um funcionário dez em um”, expôs a publicitária.

Vendo o grande número de vagas ofertadas diariamente, ela comenta ter vontade de voltar para o mercado formal, mas muitas empresas colocam um salário relativamente fora do proporcional à profissão. “Eu sempre estou buscando conhecimento e atualizações na minha área. Eu vejo que muitas vagas exigem qualificação, mas quando encontram alguém capacitado, as empresas não se propõem a pagar o justo. Na minha opinião o mercado quer mão de obra qualificada e barata”, desabafa Danielly.

Aos 56 anos, dona Kátia de Almeida Melo Lemos teve uma enfermidade que a forçou a parar com a confeitaria. Ela que empreendeu durante 10 anos, hoje não vê saída e não busca mais por uma vaga de emprego. “Para não ficar sem renda, eu faço de vez em quando um bolo ou outro pra arcar com meus custos de vida. É complicado viver dessa maneira, mas de pouco em pouco a gente busca melhorar e tentar se aprimorar”, conta.

De lá pra cá ela não conseguiu mais trabalhar, e as vagas que o mercado oferece acabam não atendendo o perfil dela por conta da falta de experiência. “Na idade que estou as oportunidades são bem mais restritas, e sem muita experiência profissional em outras áreas, os únicos cargos e vagas que me enquadram são voltadas a nível médio e fundamental. Minha vontade mesmo seria investir em algo voltado à floricultura e paisagismo”, finaliza Kátia. 

Qualificação profissional pode melhorar o cenário 

Os economistas explicam que são necessárias ações dos dois lados, da oferta e da demanda, sendo preciso reforçar as ações de qualificação dos profissionais, aumentar a oferta de cursos, ofertar bolsas de estudo para que o estudante possa se dedicar ao ensino, aperfeiçoar programas de treinamento e para estágios, e outros.

“Do ponto de vista da demanda, o governo deve focar suas atenções nas políticas que garantam o crescimento econômico. Se vai romper o teto de gastos, os juros estão elevados, a inflação em alta, se continuarmos com estas incertezas, o problema do desemprego no Brasil vai continuar se repetindo por anos”, destaca Celso.

“Por um lado, existem empregadores, mas por outro, trabalhadores sem atitude. O jovem precisa entender que existe esta demanda. É uma questão mais comportamental do que técnica. Se esses brasileiros que estão desempregados buscarem cursos online gratuitos ou até mesmo órgãos de encaminhamento a emprego, muitos encontrarão alguma vaga no mercado. Vagas existem, o que falta é vontade e qualificação básica”, complementa Diego. (Especial para O Hoje)

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