Pilhagem e desmatamento: fauna e flora goianas sob ameaça

Professor da UFG comenta sobre o impacto do agropecuaria e transportes no Cerrado

Postado em: 11-03-2023 às 08h30
Por: Everton Antunes
Imagem Ilustrando a Notícia: Pilhagem e desmatamento: fauna e flora goianas sob ameaça
O MapBiomas estima que, a nível nacional, mais de 14.2 milhões de hectares foram acometidos por queimadas em 2020 | Foto: Divulgação

O artigo “Vulnerabilidade dos Mamíferos Ameaçados do Cerrado: Modelos de Distribuição Integrando Clima e Paisagem” – publicado em 2018 pelo professor do Departamento de Ecologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), Paulo de Marco – dá conta do cenário de degradação do Cerrado goiano. Conforme o estudo, metade desse bioma encontra-se comprometido pela ação humana para atender a fins econômicos. 

Entre as atividades que ameaçam a existência dos animais do Cerrado, o artigo ressalta a “combinação de múltiplas atividades humanas, embora duas atividades se destacam: a agricultura e a infraestrutura de transportes”. O estudo também atribui a criação de gados e a produção de cana-de-açúcar e soja como práticas que podem pôr em risco a sobrevivência de alguns mamíferos deste bioma. 

Diante desse contexto, dados de instituições, agências e sistemas de mapeamento dão conta do quadro de devastação ambiental sofrida pela fauna e flora goianas. Além disso, especialistas suscitam a discussão sobre o equilíbrio entre as atividades econômicas e a necessidade de preservação do Cerrado, por meio de políticas públicas, a fim de conservar as diversas espécies de animais que habitam o estado. 

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Habitat

O MapBiomas estima que, a nível nacional, mais de 14.2 milhões de hectares foram acometidos por queimadas em 2020

Dados da Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma) informam que, no ano passado, 455 animais silvestres foram resgatados pela Prefeitura de Goiânia. Neste ano, até o momento, foram contabilizados 97 ocorrências de bichos em residências e estabelecimentos da capital – 39 em janeiro, 48 em fevereiro e outras 10 até a última quinta-feira (09) deste mês.

De Marco explica que espécies com maior capacidade de movimentação – principalmente mamíferos e aves – buscam outros locais quando seu habitat natural é comprometido, o que favorece a ocupação de animais em áreas urbanas. “Nesse sentido, a recuperação de áreas de Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanente (APP) dentro das propriedades rurais pode ser uma medida importante, aumentando a quantidade de habitat nessas áreas”, considera.

Ameaças

Números do estado de Goiás revelam que, nesse mesmo ano, quase 373 mil hectares sofreram com as ações das queimadas

O professor da UFG afirma: “em Goiás, e no Cerrado como um todo, a maior parte da perda de habitat pode ser atribuída à conversão de áreas nativas para a agropecuária”. Dados do projeto MapBiomas reforçam essa tendência crescente de ocupação do bioma: no ano de 2021 as áreas de pasto em Goiás correspondiam a, aproximadamente, 12.6 milhões de hectares; já a extensão das terras destinadas à agricultura, a mais de 5.2 milhões. 

Não somente a perda dos habitats mas também o atropelamento de animais silvestres é mencionado por De Marco como uma das causas de aumento do risco de extinção. Contudo, essa perda pode ser mais ou menos significativa conforme o animal: “o grande problema é que as espécies ameaçadas tendem a ser exatamente aquelas com baixa fecundidade, o que torna a perda de um único indivíduo como um perda muito relevante.

A respeito das queimadas, que chamaram a atenção do país nos últimos quatro anos, o MapBiomas estima que, a nível nacional, mais de 14.2 milhões de hectares foram acometidos por queimadas em 2020. Números do estado de Goiás revelam que, nesse mesmo ano, quase 373 mil hectares sofreram com as ações das queimadas.

Ainda, estatísticas levantadas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação pela Biodiversidade (ICMBio), por meio do Sistema de Avaliação do Risco de Extinção da Biodiversidade (SALVE), relatam que, no bioma Cerrado, pelo menos 74 espécies encontram-se Criticamente em Perigo (CR) e outras 158, vulneráveis (VU). O Tamanduá-bandeira, o Veado-campeiro, o Macaco-prego, a Onça-pintada, o Tatu-canastra e o Boto-do-Araguaia são algumas das espécies vulneráveis.

Soluções

“A implantação de uma política pública eficiente para o meio ambiente pode ser também uma estratégia relevante para o próprio agronegócio”, ressalta o professor  da UFG. Segundo ele, conciliar as práticas agrícolas e a proteção das reservas é benéfica, uma vez que a natureza contribui para as atividades econômicas na polinização e mitiga a quantidade de agrotóxicos nos corpos d’água, por exemplo.

De Marco fala sobre outras perspectivas de rentabilidade aliada a um modelo sustentável para o Cerrado. “O estado de Goiás poderia considerar que há um grande potencial muito pouco explorado de turismo, que também envolve desfrutar de paisagens naturais não alteradas. Parques, como o Parque Estadual da Serra de Caldas, atraem muita gente interessada em desfrutar de uma natureza protegida”, diz.   

A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) também observa que: “é importante que os estados realizem suas próprias avaliações.  Em posse da informação, podemos direcionar melhor recursos e esforços”. Em nota, a pasta menciona que já executa um projeto, juntamente com a UFG, para reunir dados sobre a fauna goiana e avaliar os riscos de extinção.

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