Ineficaz para Covid-19, ivermectina tem queda de 95% de vendas em Goiânia e Aparecida

Drogarias de Goiânia e Aparecida registram queda de até 95% na busca do medicamento. Profissionais da saúde apontam a redução da mortalidade por COVID-19 como um dos fatores desse declínio

Postado em: 29-08-2023 às 07h56
Por: Redação
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Drogarias de Goiânia e Aparecida registram queda de até 95% na busca do medicamento. Profissionais da saúde apontam a redução da mortalidade por COVID-19 como um dos fatores desse declínio | Foto: Yago Sales

Por Tainá Rocha

Propagado com a desinformação de que ajudava no tratamento do coronavírus, a ivermectina, conhecido remédio para piolhos, era vendido mais que máscara em farmácias pelo País desde o início da pandemia há mais de três anos, em março de 2020. 

A vacinação e as medidas sanitárias reduziram drasticamente a mortalidade em todo o mundo. Com isso, farmácias da região metropolitana de Goiânia registram queda  na procura por ivermectina.

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A reportagem do jornal O Hoje entrou em contato com dez drogarias de Goiânia e Aparecida. Funcionários e farmacêuticos afirmam que as pessoas deixaram de utilizar o medicamento para o tratamento da COVID-19. 

Naiara Menezes, proprietária e farmacêutica da Drogaria São Gabriel, localizada no Conjunto Storil, em Aparecida de Goiânia, afirma que durante a pandemia da COVID-19, o estoque de ivermectina chegou a faltar em sua farmácia, mas hoje a situação já está completamente diferente. “Aqui na drogaria, ficamos com o estoque zerado no início da pandemia, por conta da grande procura por ivermectina. Hoje em torno de 5% da população procura o medicamento, mas para o tratamento de sarnas e piolhos”, afirma.

Em outra drogaria, na avenida Paranaíba no Centro de Goiânia, as vendas do medicamento diminuíram em torno de 70%. “Aqui na nossa farmácia  a procura do medicamento gira em torno de 30%, número bem inferior ao período da pandemia”, afirma Adriano Pereira, balconista do estabelecimento.

Na região leste da capital, o medicamento é procurado esporadicamente para a prevenção de vermes. Raffaela Mesquita, farmacêutica da Droga Shop no Parque das Laranjeiras, afirma que após a pandemia,  a ivermectina está sendo usada somente para a eliminação de parasitas. “Hoje a realidade é bem diferente em relação ao período de surto da COVID-19. Acredito que tenha reduzido em torno de 80%.”

Na divisa entre Goiânia e Aparecida,  a situação é similar. Somente 10% dos clientes da Droga Vit, farmácia do Jardim Bela Vista, em Aparecida de Goiânia, procuram esporadicamente a ivermectina. “Nós tivemos uma queda  de 90% na busca do medicamento, após  o fim do período de emergência da Covid-19”, afirma Dorvalino Cruvinel, proprietário do estabelecimento.

Na região sul de Goiânia, a situação não é diferente. Uma drogaria que fica localizada na avenida T-8,  no setor Bueno, também registrou uma diminuição dos pedidos de ivermectina. “A procura pelo medicamento é a mesma do período antes da pandemia. As pessoas se conscientizarem sobre o uso do remédio”, explica a atendente, Maria do Carmo. 

Guilherme Lucas, operador de televendas da rede de farmácias da Drogaria Plus, explica que os pedidos diminuíram consideravelmente, em relação ao período mais crítico da COVID-19. “Tivemos uma redução de 80% da procura do medicamento”.

Já em uma farmácia no Parque Oeste Industrial localizada na região Sudoeste de Goiânia, ainda há pessoas que procuram pelo medicamento, mas os números são inferiores ao período da pandemia. “Nós vendemos em torno de 20%, sempre perguntamos o motivo do uso, raramente alguém diz que é para prevenir a COVID”, explica a atendente Jackeline Souza.

Conhecimento

O médico infectologista, Marcelo Daher, explica que a procura por ivermectina se deu por conta das  altas taxas de transmissão e aumento da mortalidade causadas pela COVID-19. “Nós tínhamos um cenário favorável para o uso do medicamento. Era um vírus novo, não tinha vacina, não sabíamos ao certo como era a transmissão, e muito menos tinha medicamento para tratar a doença. Por isso, qualquer medicamento que pudesse ser eficaz foi tentado, como é o caso da ivermectina.”.

Ele acredita que hoje com o fim da emergência sanitária da COVID-19, queda número de casos, diminuição da mortalidade, não há motivos para a população optar pelo tratamento do fármaco. “O conhecimento sobre a doença foi um fator determinante. Agora vivemos uma outra realidade,  com a vacina registrada,  baixos  índices de mortalidade e transmissão pela doença, além de ter medicamentos devidamente comprovados para realizar o tratamento dos infectados.”

Álvaro Paulo, membro do Grupo Técnico de Trabalho de Drogarias do   Conselho Regional de Farmácia do Estado de Goiás (CRF-GO), explica que a diminuição da procura do medicamento também afetou as indústrias farmacêuticas. “Devido a diminuição da demanda nas farmácias,  houve um recuo na fabricação do fármaco para evitar até o vencimento dos produtos.”

Ineficaz

Durante a pandemia da COVID-19, a ivermectina foi um medicamento defendido  por médicos, secretários, deputados e até mesmo pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, como parte do tratamento precoce da doença, mesmo sem comprovação científica da sua eficácia.

Em 2020, ano que foi declarada a pandemia da COVID-19, o medicamento teve um crescimento de vendas em torno de 857%  no Brasil, de acordo com o Conselho Federal de Farmácia.

Segundo estudos do Instituto Global de Barcelona (IsGlobal), realizado em 2022, cerca de 79,5% dos brasileiros que tiveram sintomas de síndrome respiratória aguda, utilizaram ivermectina como tratamento da doença.

Em maio de 2023, a Justiça do Rio Grande do Sul condenou em duas ações  o grupo “Médicos pela Vida” e as empresas  Vitamedic,  Centro Universitário Alves Faria (UNIALFA) e o Grupo José Alves, pela divulgação de publicidade que estimulava o consumo de medicamentos ineficazes para a COVID-19, como a ivermectina e a cloroquina. O grupo foi condenado a pagar R$55 milhões por danos morais e coletivos à saúde pública.

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