A feia mais bela

Há 100 anos, nascia a atriz Zezé Macedo, um ícone do humor nacional, dona de uma trajetória de sucessos, apesar da vida sofrida

Postado em: 06-05-2016 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Há 100 anos, nascia a atriz Zezé Macedo, um ícone do humor nacional, dona de uma trajetória de sucessos, apesar da vida sofrida

Júnior Bueno

Pequena, franzina, de olhos grandes e expressão debochada, Zezé Macedo se orgulhava de ser a atriz mais feia dos palcos brasileiros. É a recordista feminina no Brasil em participações de cinema, tendo feito 108 filmes. Seu tipo físico, magra e baixa, sempre lhe garantiu papéis cômicos, apesar de ter sempre afirmado que também gostaria de representar papéis dramáticos em novelas. Oscarito dizia que ela era a maior comediante do cinema brasileiro. Grande Otelo chamava-a de Carlitos de saia e, Ivan Cardoso, de primeira-dama do cinema brasileiro. Mas a carreira exitosa de Zezé contrastava com uma vida sofrida, repleta de eventos tristes.

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Nascida Maria José de Macedo, no dia 6 de maio de 1916 – há exatos 100 anos – no município fluminense de Capivari, hoje chamado Silva Jardim. Seu padrasto, Columbano Santos, tabelião e prefeito da cidade, era simpatizante das artes e dos atores. Estreou no teatro aos 4 anos de idade, interpretando a protagonista na peça As Pastorinhas. Na época, como não sabia ler, decorava os textos ao ouvi-los lidos pelo padrasto, que lhe encorajava bastante. A pequena Zezé também desde cedo manifestou inclinação pela poesia. 

Aos 15 anos, casou-se com um mecânico e eletricista, desistindo de ser atriz e mudando-se para Niterói. Com ele, teve seu único filho, Hércules, morto com apenas 1 ano de idade ao cair do colo da avó paterna e fraturar o crânio. O casal separou-se pouco depois. O trauma fez com que ela ficasse muda por meses. Zezé se separou e virou funcionária pública. Mas o desejo de interpretar continuava sussurrando. E lendo seus próprios poemas em uma rádio conseguiu chamar a atenção de diretores.

Aos poucos, porém, foi começando a fazer pontas nos programas de rádio, substituindo atrizes, lendo poemas, e, por conta disso, publicou seu primeiro livro de poesias, Coração Profano, em 1954, um grande êxito de vendas. Publicou ainda mais três livros de poesia. Por essa época, participou do programa Lar, Doce Lar, substituindo a atriz que fazia a empregada doméstica, agradando bastante o público, e, logo no dia seguinte, foi convidada por Paulo Porto e Olavo de Barros a se transferir para a Rádio Tupi, o que lhe possibilitou o ingresso para a televisão.

Foi por meio da TV que Watson Macedo a conheceu e a convidou para estrelar no filme O Petróleo É Nosso, em 1954. A partir de então, Zezé tornou-se presença marcante no cinema, atuando primeiramente para diversas produtoras, como a Watson Macedo Produções Cinematográficas, Cinelândia Filmes, Cinedistri, Brasil Vita Filmes, Flama Filmes, UCB, celebrizando-se como comediante. Dentre os vários filmes de que participou nessa época, merecem destaque De Vento em Popa, de Carlos Manga, no qual interpreta uma cantora de ópera, fugindo da imagem estereotipada de empregada doméstica; O Homem do Sputnik, considerado pelos cinéfilos uma das melhores chanchadas, e Esse Milhão É Meu. Nesses três filmes, atuou ao lado de Oscarito, que fez questão presença de Zezé nos filmes.

Com o declínio da chanchada no começo da década de 1960, Zezé passou a se dedicar mais ao teatro e à televisão, mas sem se afastar do cinema. A partir de 1965, tornou-se contratada da Rede Globo de Televisão, onde atuaria até o fim de sua vida. No cinema, estrelou, dentre outros, Lana – Königin der Amazonen, filme alemão feito no Brasil em parceria com a Atlântida, e Macunaíma, um grande sucesso do cinema brasileiro.

Zezé voltou a se casar novamente, em 1961, com o ator e cantor Victor Zambito, dez anos mais novo, o qual conheceu enquanto atuava no Teatro Recreio. Ficaram juntos até o fim da vida da atriz. Na década de 1970, sua carreira no cinema foi impulsionada com o surgimento da pornochanchada. Chegava a fazer três filmes por ano. Enquanto isso, na televisão, dava início à parceria com Chico Anysio, que lhe rendeu seus dois personagens mais emblemáticos: Biscoito e Dona Bela. 

A primeira era a esposa feia, porém rica, do bêbado Tavares, e a segunda era uma aluna da Escolinha do Professor Raimundo que, acreditando ser pornografia tudo que o mestre lhe perguntava, jogava-se ao chão histérica e acusava-o: “Só pensa naquilo!”. Foi seu papel mais notório e a tornou conhecida em todo o Brasil. Outra participação marcante dessa época na televisão foi no Sítio do Picapau Amarelo, no qual interpretou a Dona Carochinha.

Nos anos seguintes, passou a diminuir seu ritmo de trabalho, dedicando-se cada vez mais à televisão. Em 1983, estrelou como a protagonista em Eteia, a Extraterrestre em Sua Aventura no Rio, de Roberto Mauro, uma sátira ao E.T., de Steven Spielberg. Três anos depois, ganhou um prêmio especial do júri no Festival de Gramado por sua atuação em As Sete Vampiras, de Ivan Cardoso. Seu último filme longa-metragem foi O Escorpião Escarlate, de Ivan Cardoso, em 1990, mais uma vez interpretando uma secretária do lar. Todavia voltou às telas de cinema quatro anos depois, no curta-metragem Jaguardarte, de André Klotzel, no qual aparece declamando versos de Lewis Carroll.

Dedicou seus últimos anos a programas humorísticos na televisão, tendo atuado até pouco antes de falecer. Em 26 de agosto de 1999, Zezé sofreu um derrame cerebral e foi internada na Clínica Bambina, no bairro carioca do Botafogo. De acordo com os médicos, ela tinha um aneurisma cerebral que havia se rompido. Ela iria ser operada, mas, devido ao seu estado fragilizado, os médicos optaram lhe fazerem uma drenagem de coágulo. Depois de 46 dias de internação, a atriz veio a falecer,   em 9 de outubro, aos 83 anos. 

Apesar de ser um sonho de criança, Zezé Macedo só virou atriz aos 38 anos. O sonho dela era ser uma grande atriz trágica. Mas a atriz nunca faria um papel trágico, apenas comédias. Sempre a viam como uma mulher feia e com voz esquisita. Mas sua verve cômica, sua aptidão para fazer as pessoas rirem apenas com um virar de olhos e sua figura física, que não se importava em também ser a piada, fizeram de Zezé Macedo uma das comediantes mais amadas do País. Foi a feia mais bela do Brasil. 

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