Anitta: cantora, empresária e orientadora financeira

A funkeira foi anunciada nesta semana como parte do conselho administrativo do Nubank

Postado em: 28-06-2021 às 08h45
Por: Alice Orth
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A funkeira foi anunciada nesta semana como parte do conselho administrativo do Nubank | Foto: Divulgação

A nomeação da cantora Anitta para o conselho de administração do Nubank não foi recebida calmamente nas mídias sociais nem no mundo financeiro. Enquanto uns celebraram a notícia como inovadora e perspicaz, outros chamaram o novo posto de “futuro ex-emprego” e “um grande erro”. As opiniões variam mas a pulga é a mesma atrás da orelha de todos: competência técnica não seria mais um fator determinante para integrar o painel de uma empresa?

A resposta parece ser sim e não ao mesmo tempo, uma espécie de decisão de Schrödinger. Para o empreendedor e investidor Anderson Godz, autor de “Governança & Nova Economia” e fundador da fintech Gonew.co, “Anitta representa o conceito de diversidade. E tem competência técnica, sim, em um assunto que considero o principal ativo no mundo digital, que é a disputa pela atenção. Ela lida com 50 milhões de seguidores, tem ideia do que é mobilização. Me parece haver um encaixe”.

De acordo com Godz, esta é uma das situações em que a formação acadêmica importa muito menos do que a conexão com o público e o impacto publicitário. A cantora não apenas é uma empresária de sucesso como é também uma ponte entre a instituição financeira e uma nova geração que procura se afastar da postura sisuda e regrada que um banco transmite. Em linguagem jovem: banco é cringe.

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O modelo tradicional tornou-se obsoleto e fugir dele é uma das principais apostas do Nubank. “O nome do banco já instaura uma importante ruptura”, comenta Clotilde Perez, professora da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). “Nu é estar desprovido de vestimentas, ou seja, sem a cobertura das convenções sociais mais elementares, estar na condição de origem, sem proteção, disfarce ou adorno”.

Na campanha em que lançou o cartão de débito, em dezembro de 2018, o Nubank transformou sua proposta em performance artística. Na Pinacoteca, um dos mais importantes museus de arte do Brasil, a marca instalou uma porta giratória, comum em agências bancárias, mas que lembra o entrave e a burocracia que precisa ser enfrentada nesse tipo de lugar. “O caminho está livre”, anunciou. “Transformamos a porta giratória em peça de museu de verdade. Você pode se despedir dela pra sempre na agência mais próxima”.

O pioneirismo, porém, não é do Nubank: em setembro de 2019, a Girl from Rio já havia sido contratada pela Ambev para encabeçar a área de criatividade e inovação da marca Skol Beats. Mesmo participando da mesa de debate de marketing, ela havia sido posta muito mais no holofotes do que nos bastidores. 

Outra estratégia que conquista os consumidores mais jovens é que, com a adição de Anitta, o conselho passa a ter três mulheres em seu conselho administrativo. Ainda que baixo, o número representa 37,5% do total de conselheiros, equivalente a três vezes mais do que a média das empresas brasileiras. 

Perez explica que a escolha “revela a inteligência sensível dos executivos em perceber que o que está fora da instituição e adiante é o que deve guiá-los. Anitta não é formada em finanças, direito ou tecnologia, portanto suas contribuições não serão neste caminho”. O importante não são suas soluções operacionais nem a sua música, mas o seu público: “O Nubank quer conquistar mais clientes, outros milhões de brasileiros e latino-americanos, principalmente na Colômbia e no México, justamente onde Anitta cresce como fenômeno de novos valores, ainda difíceis de enxergar para quem olha para dentro, para baixo e para trás”.

A recepção, porém, se tornou desconfortável o bastante para que o banco cancelasse uma rodada de entrevistas à imprensa com a cantora. Não houve explicação oficial para a alteração. Uma hashtag pejorativa apareceu nas redes sociais, impulsionada principalmente por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, que ficaram contrariados com o anúncio devido a posições políticas declaradas recentemente por ela.

A Coluna do Broadcast, do jornal O Estado de S. Paulo, divulgou ainda que membros do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) pretendem pedir ao Nubank que Anitta passe por um curso intensivo de formação de conselheiros antes de assumir a cadeira, alegando que o cargo exige conhecimentos específicos e técnicos.

Godz lembra que se posicionar em questões consideradas polêmicas faz parte do jogo. Elon Musk, que preside a norte-americana Tesla, se tornou conhecido por comentários pessoais no Twitter, usando sua posição de “influencer” para impulsionar o que lhe interessa, comunicando-se diretamente com uma audiência jovem. “Não é só uma questão de idade ou origens diferentes, mas uma rediscussão de modelos. Claro que em companhias de capital aberto há questões regulatórias, mas para gestões que precisam ser diferentes, as formações e o repertório também devem ser diferentes. Conselhos saudáveis demandam outras capacitações”, diz.

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