Marconi Perillo deverá ser julgado pela Justiça Eleitoral

Decisão do Supremo gerou revolta no procuradores da Lava-Jato. Casos deverão ser analisados separadamente para análise de competência

Postado em: 16-03-2019 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
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Decisão do Supremo gerou revolta no procuradores da Lava-Jato. Casos deverão ser analisados separadamente para análise de competência

Raphael Bezerra*

Processado por Caixa 2 e lavagem de dinheiro pela Operação Cash Delivery, o ex-governador, Marconi Perillo (PSDB), deverá ser julgado pela Justiça Eleitoral e não mais pela comum. Isto porque, após o acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre envio dos processos de certos crimespara a Justiça Eleitoral,a decisão deve interferir no andamento dos processos contra políticos processados por caixa 2. Advogado do ex-governador tucano, Antônio Carlos de Almeida, o Kakay, acredita que o próprio juiz e o Ministério Público de Goiás (MP-GO) devem pedir a remessa à Justiça Eleitoral.

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Segundo Kakay, caso o MP-GO não remita o caso para à Justiça Eleitoral, como ficou decidido pelo plenário do Supremo, a defesa deverá enviar uma petição solicitando o envio do processo ao órgão competente. “A decisão do Supremo nada mais fez do que cumprir o que está na constituição e assim deveria ter sido feito desde o início. O argumento do Ministério Público Federal, especialmente a força tarefa de Curitiba, de que a Justiça Eleitoral não tem condições estruturais para fazer a instrução dos processos não é um argumento jurídico”, afirma.

Ele diz que a força tarefa nos últimos anos cometeu uma série de abusos infringindo normas gerais e constitucionais. “É como se houvesse uma Constituição do Paraná. Eu fico extremamente estarrecido ao ver alguns ministros endossarem esse argumento de que a Justiça Eleitoral não tem condições de instruir esses casos”, completa. 

O advogado Pedro Paulo de Medeiros explicou que a maioria dos casos investigados na Lava-Jato tem como objeto de investigação o envio de dinheiro para partidos políticos fora da contabilidade da campanha, o que consiste em Caixa 2. “A pergunta que fica é, o juiz vai enviar os casos diretamente? Vai haver algum recorte ou uma modulação no sentido de: a acórdão só passa a valer a partir de agora”, explica.

Segundo ele, será preciso esperar a decisão do julgamento realizado na quinta-feira (14). “A decisão deve demorar para ser publica, mas só após esse documento é que saberemos todos os detalhes dos procedimentos a serem tomados. As defesas devem pedir pela anulação dos processos já julgados por Caixa 2 devido a competência exclusiva”, ressalta.

Os dois advogados concordam que os casos deverão ser repassados automaticamente para a Justiça Eleitoral em casos que envolverem repasses ilegais para campanhas eleitorais. Além disso, para os dois advogados, haverá um processo de análise caso-a-caso quanto aos processos que já foram julgados. Kakay, diz defender vários casos que envolvem Caixa 2 e que já pediu um levantamento para avaliar quais processos poderão ser aplicados com a decisão do Supremo. “Quando o Supremo define uma questão, resta cumprir. Simples assim. No caso específico do Marconi, não tenho a menor dúvida que há uma delação que imputa Caixa 2 contra ele, o que a defesa nega, mas a investigação tem que se dar na justiça eleitoral”, completa.

Os reflexos da decisão do Supremo ainda não formam um consenso, e não devem ter efeito imediato, já que os processos terão de ser analisados caso a caso. O que deve ocorrer é a formulação de diversas reclamações de investigados que respondiam a processos na Justiça federal. Eles podem argumentar que os atos praticados não são legítimos, porque o juiz deveria ser eleitoral. (* Especial para O Hoje) 

Decisão do STF pode anular sentenças já proferidas, diz Marco Aurélio 

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio disse na quinta-feira (14) que as sentenças que foram proferidas antes da decisão da Corte sobre a competência da Justiça Eleitoral podem ser anuladas. Na avaliação do ministro, as condenações podem ser afastadas diante da decisão do Tribunal. 

O ministro ressaltou, no entanto, que, nestes casos, o andamento do processo não é anulado e pode ser aproveitado por um outro magistrado que vir a analisar a investigação. “Porque nós temos já os elementos coligidos no processo. Então esses elementos que servem à instrução criminal são aproveitados”, disse o ministro, que votou pela competência da Justiça Eleitoral processar os delitos eleitorais e conexos, como corrupção e lavagem de dinheiro.

Na sessão de quinta-feira, o Supremo decidiu que a Justiça Eleitoral deve julgar casos de corrupção quando envolverem simultaneamente caixa 2 de campanha e outros crimes comuns, como lavagem de dinheiro, que são investigados na Operação Lava Jato. 

Segundo o ministro, que proferiu um dos votos a favor da medida, os atos processuais, como buscas e apreensões, realizadas pela Justiça Federal, poderão ser aproveitadas pela Justiça Eleitoral, no entanto, os demais atos decisórios devem ser anulados.

“A instrução processual é aproveitada pela jurisdição eleitoral. Agora, decisões proferidas por órgão incompetente sob ângulo material, se tem a incompetência absoluta e esses atos decisórios não subsistem”, disse. 

O procurador DeltanDallagnol, responsável pela força-tarefa da Operação Lava Jato no Paraná, lamentou a decisão do STF de transferir crimes comuns envolvendo campanhas à Justiça Eleitoral. Em entrevista ao Jornal da Manhã desta sexta (15), ele afirmou que o Ministério Público não pode “fazer mais nada” em relação ao julgamento.

“Não podemos fazer mais nada a respeito disso”, afirmou Dallagnol. “Nosso dever foi informar a sociedade sobre o que estava acontecendo. Agora, talvez, só uma mudança legislativa.”

O promotor afirmou ainda que punições no âmbito da Lava Jato podem ser revistas após o entendimento do Supremo. “Vários casos podem ser anulados aos poucos, em diferentes tribunais. Réus passarão a pedir habbeas corpus alegando que repassaram dinheiro a campanhas. E a própria natureza dos casos que estamos investigando mostra que esses valores iam para o bolso dos corruptos e para caixas eleitorais”.

Com o fim do julgamento, os processos contra políticos investigados na Lava Jato e outras apurações que envolvam simultaneamente esses tipos de crimes deverão ser enviados da Justiça Federal, onde tramitam atualmente, para a Justiça Eleitoral, que tem estrutura menor para supervisionar a investigação, o que pode resultar em condenações mais leves. 

Após o julgamento, o procurador DeltanDallagnol, chefe da força-tarefa de investigadores da Lava Jato, disse, em mensagem publicada no Twitter, que a decisão do STF vai ter impacto nos processos que estão em tramitação. “Hoje, começou a se fechar a janela de combate à corrupção política que se abriu há 5 anos, no início da Lava Jato”, afirmou.

Processos anulados

Na quarta-feira (13), o procurador regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima disse que, caso o STF decidisse pela competência exclusiva da Justiça Eleitoral para julgar casos em que crimes comuns estiverem atrelados a crimes eleitorais, todos os condenados até aqui na Lava Jato – foram 159 – poderiam ter seus processos anulados, inclusive o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Lula não foi condenado por crime eleitoral na Lava Jato. A condenação do ex-presidente nos casos do triplex do Guarujá e do sítio de Atibaia foram por corrupção e lavagem de dinheiro, competência da Justiça Federal.

 

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