Mostra individual da artista Miriam Inez da Silva chega em Goiânia

Cerrado Galeria sedia, de forma inédita, cerca de 80 obras da artista goiana, com curadoria de Divino Sobral

Postado em: 26-04-2024 às 10h00
Por: Letícia Renata
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Divididas em cinco grupos temáticos – ‘Memórias de Trindade’, ‘Estórias de amor’, ‘A poética do voo’, ‘A vida é festa’ e ‘O show tem que continuar’, a mostra reúne obras datadas entre 1963 e 1995 | Foto: Malu Carvalho

Com o objetivo de resgatar o legado cuja criação, apesar de realizada na capital fluminense, é profundamente enraizada no solo da cultura goiana, a Cerrado Galeria recebe neste sábado (27), das 10h às 13h, com entrada gratuita, a primeira exposição individual da artista Miriam Inez da Silva, realizada em Goiás. Com a curadoria de Divino Sobral, a exposição intitulada ‘Miriam Inez da Silva: A Sala dos Milagres e As Crônicas Fabulosas da Alegria’, conta com cerca de 80 obras da artista goiana.

Divididas em cinco grupos temáticos – ‘Memórias de Trindade’, ‘Estórias de amor’, ‘A poética do voo’, ‘A vida é festa’ e ‘O show tem que continuar’, a mostra reúne obras datadas entre 1963 e 1995. O curador Divino Sobral explica que o nome da exposição foi inspirado na relação da obra da artista com a Sala dos Milagres do Santuário do Divino Pai Eterno de Trindade, primeiro acervo de obras com o qual ela manteve contato e que influenciou sua obra.

“Os nomes dos grupos temáticos foram inspirados nos próprios temas que Miriam trabalhou. Por exemplo, ‘Estórias de amor’ reúne cenas de casais de namorados, noivados, casamentos e festas de casamentos”, afirma.

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As cenas pintadas pela artista se assentam em telas quase sempre pintadas num fundo de branco encardido, contornado por faixas de cores que formam a moldura da própria pintura. “As figuras de Miriam Inez possuem marcada linha de contorno e têm seus rostos exageradamente maquiados. A cor tem papel simbólico em sua obra, que transita entre a crônica e a fabulação, o real e o imaginário, o cotidiano e o fantástico, criando um universo particular marcado pela liberdade, pelo desejo de transgressão e pelo desbunde”, descreve.

Segundo a diretora da Cerrado Galeria em Goiânia, Júlia Mazzutti, o fato dessa ser a primeira exposição individual de Miriam Inez em Goiânia mostra o desconhecimento do trabalho da artista em sua terra natal, o que reforça ainda mais a importância de sua expressão. “Como artista reconhecida nacionalmente e natural do Centro-Oeste do país, com obras permeadas por temáticas muito caras à cultura goiana, é de extrema relevância para o programa da Cerrado. Inspirados pela riqueza cultural e artística da região em que estamos, aspiramos não apenas promover a produção artística regional, mas também a expandir o alcance geográfico e impacto nacional desses artistas”, explica.

Inspiração goiana

Nascida no ano de 1937, em Trindade (GO), um dos locais mais importantes de peregrinação religiosa do Brasil, a formação artística de Miriam Inez foi realizada em Goiânia e no Rio de Janeiro, cidade onde construiu sua carreira e viveu até o fim da vida, em 1996. Ao longo de cinco décadas de trabalho, elaborou uma obra complexa e original em xilogravura e pintura, geralmente estruturadas em pequeno formato, em madeira e com suas molduras coloridas características. 

“Miriam gostava de representar em suas pinturas, feitas sobre tábuas de madeira, temas relacionados com a cultura popular do povo brasileiro, especialmente da cultura particular formada na cidade de Trindade, onde ela nasceu e viveu até os 18 anos de idade. Sua pintura foi erroneamente chamada de ‘primitivista’ por adotar linguagem popular e por representar temas ligados aos modos de viver do povo. Sua mensagem é que cada dia de nossa vida é um milagre que deve ser vivido com alegria”, explica Divino.

A artista começou seus estudos formais na Escola Goiana de Belas Artes (EGBA). No início da década de 1960, foi aluna de cursos livres ministrados por Ivan Serpa no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-Rio).

Entre as exposições mais relevantes de sua trajetória, contam-se a participação em duas edições da Bienal de Arte de São Paulo (7ª, em 1963, e 9ª, em 1967), exposições em que apresentou suas xilogravuras. Além disso, fez mostras na Jovem Gravura Nacional, organizada por Walter Zanini, no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), na Bienal da Bahia (1966 e 1968) e na Bienal de Gravura de Santiago do Chile (1969). Ao longo dos anos 1970, Miriam expôs continuamente dentro e fora do país, participando de mostras na Inglaterra, França, Itália, Iugoslávia, Marrocos e Canadá.

Mazzutti reitera que a obra de Miriam Inez é uma referência na arte contemporânea mundial. “O trabalho da artista vai ao encontro de todos os interesses da Cerrado Galeria – com um acervo singular e diversificado, nossa galeria é um ponto de encontro, fora do eixo tradicional, para mentes criativas e interessados pela arte, inspirando aqueles que já a conhecem e acolhendo os que buscam uma expressão cultural autêntica”, garante a diretora do espaço em Goiânia.

O curador Divino Sobral reforça essa influência, assegurando a relevância do trabalho de Miriam no cenário artístico brasileiro e goiano. “A importância da obra de Miriam para a arte brasileira é grande, pois ela é a artista que vai problematizar de maneira mais contundente a questão problemática das relações entre arte erudita e arte popular. Ela foi uma artista erudita, formada por Confaloni, Gustav Ritter, Luiz Curado e Ivan Serpa (nomes de grandeza no modernismo local e nacional), que optou por pintar como um artista anônimo, criador de quadros de ex-votos. Ela dissolveu a separação entre essas categorias. Para a arte goiana sua relevância é enorme por criar sempre inspirada em sua infância na cidade de Trindade, potencializando o rico imaginário lá contido, redirecionando nosso olhar para as narrativas e visualidades lá produzidas”, confirma.

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