A volta da jornada espiritual aos confins da Amazônia

Após 20 anos de suspensão, expedições ao ponto mais alto do Brasil retomam com foco na preservação e valorização da cultura Yanomami

Postado em: 16-07-2024 às 02h30
Por: Luana Avelar
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O Pico da Neblina fica em uma sobreposição entre duas unidades de conservação, a Terra Indígena (TI) Yanomami com quase quase 10 milhões de hectares e o Parque Nacional Pico da Neblina, com cerca de 2,2 milhões de hectares | Foto: Vivalá

Há muito tempo, na intocada floresta amazônica, os espíritos ancestrais dos Yanomami escolheram um lugar sagrado para residir: o Yaripo, conhecido por nós como Pico da Neblina, Serra dos Ventos ou a Casa dos Espíritos. Essa montanha carrega histórias que são passadas de geração em geração, e segundo as lendas, o grande Pajé Yoyoma, em uma visão espiritual, descobriu essa imponente montanha que agora abre sua temporada de visitação para 2024 e 2025.

Uma das principais crenças está relacionada ao poder de cura e proteção espiritual do Pico da Neblina. “O Pico da Neblina é a casa dos espíritos, onde fazem, às vezes, as invocações de espíritos para poder salvar uma pessoa quando ela está doente espiritualmente”, explica Renê da Cruz Pinto, Yanomami e guia turístico. É desta forma que a vida é levada no ponto mais alto do Brasil, a 2.995 metros.

Após mais de 20 anos de visitação suspensa, o retorno dos viajantes é recente, mas a vontade é antiga. Desde 2014, os Yanomami possuíam o forte desejo de tornar realidade o plano de ecoturismo na região. Para isso, alguns parceiros estratégicos passaram a fazer parte do projeto, como o ICMBio, a Funai, o Exército e o Instituto Socioambiental (ISA).

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“Chamamos a ICMBio e a FUNAI para nos apoiar nessa luta e conseguimos fazer a parceria com a ISA, que nos ajudou a construir o plano de visitação e nos apresentou a esse mundo”, relembra Renê. O plano foi feito em quatro anos, de forma colaborativa, entre organizações governamentais, não-governamentais e os Yanomami, com foco na proteção da fronteira, da sociobiodiversidade e no bem-estar dos povos.

Agora, após muitos anos de planejamento, a Vivalá começa a operar o roteiro para o Pico da Neblina pelos próximos três anos. A temporada 24 e 25 terá 12 datas de saída, nas quais mais de 120 pessoas do mundo inteiro poderão participar de experiências sustentáveis pelo Brasil. Os viajantes terão a oportunidade de conhecer comunidades indígenas e os povos originários, mas também ribeirinhos, quilombolas, sertanejos, caiçaras, entre outros grupos.

A expedição é uma jornada de 15 dias, ideal para amantes de grandes aventuras de trekking. Iniciando em São Gabriel da Cachoeira (AM), os participantes se preparam na pousada e exploram a cidade antes de embarcar numa viagem que combina estradas, voadeiras e trilhas profundamente imersivas.

“A relação do povo Yanomami com o Pico da Neblina e a região é fundamental para entendermos a profunda ligação que os povos indígenas têm com a natureza. A integração deles com o meio ambiente é muito maior do que a nossa, e eles compreendem que fazemos parte da natureza e não a dominamos”, complementa Daniel Cabrera, cofundador e diretor executivo da empresa.

Os primeiros dias são marcados por experiências autênticas, como receber bênçãos dos Pajés Yanomami e acampar em locais estratégicos. À medida que a jornada avança, os desafios se intensificam com elevações íngremes e trilhas exigentes até o acampamento Laje, a 1.600 metros de altitude, oferecendo vistas impressionantes do Pico da Neblina. O ponto alto da expedição é a ascensão final ao acampamento Base, a 2.030 metros, preparando os aventureiros para a escalada final até os 2.995 metros.

“Os cenários são deslumbrantes, e lá você encontra uma Amazônia extremamente única: cheia de serras e de endemismos da flora por conta da altitude. Todos aqueles que pretendem subir o Pico da Neblina recebem uma bênção dos caciques (os “tuxauas”) para proteção durante toda a jornada”, conta Letícia Cristina, produtora de experiências.

Após a conquista do pico mais alto do Brasil, os viajantes desfrutam de momentos de despedida com os Yanomami, compras de artesanato local e celebrações em São Gabriel da Cachoeira. Serão somente 12 saídas e 120 vagas na temporada 2024/2025, entre setembro deste ano e dezembro do ano que vem, com investimento de R$ 17.500 por pessoa.

A retomada do turismo no Pico da Neblina, após anos de suspensão, representa uma oportunidade de preservação ambiental, enaltecimento cultural e experiências inesquecíveis para aventureiros de todo o mundo. Ao mesmo tempo, é uma jornada de respeito e reconexão com a sabedoria ancestral do povo Yanomami, que guarda os segredos dessa montanha sagrada.

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