Por que Lula insiste em manter Bolsonaro vivo?

Essa, por sinal, não é uma característica exclusiva do atual gestor. Bolsonaro também utilizou da artimanha para atacar por reiteradas vezes as gestões petistas logo que assumiu o governo, em 2019

Postado em: 20-07-2023 às 08h30
Por: Felipe Cardoso
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Essa, por sinal, não é uma característica exclusiva do atual gestor. Bolsonaro também utilizou da artimanha para atacar por reiteradas vezes as gestões petistas logo que assumiu o governo, em 2019 | Foto: Divulgação

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), insiste em manter viva a imagem de seu antecessor, Jair Bolsonaro (PL). Mais de seis meses depois de recuperar a cadeira mais importante da política brasileira, diversas foram as ocasiões em que o petista resgatou o nome de seu principal adversário político para golpeá-lo nas cordas. 

Em entrevista recente, ao ser questionado, por exemplo, por que ele e os demais integrantes de seu governo não reconheciam que o regime Nicolás Maduro, na Venezuela, não era uma democracia, Lula rodeou, rodeou, até chegar ao ex-presidente.

“Não tivemos um cidadão aqui, um sabidinho, que não quis aceitar o resultado eleitoral? Nós não tivemos um cidadãozinho aqui que quis dar golpe dia 8 de janeiro? Tem gente que não quer aceitar o resultado eleitoral. Nem todo mundo é como Lula, que perdeu do Collor e aceitou o resultado. Que perdeu duas vezes do Fernando Henrique Cardoso e aceitou o resultado”, argumentou. 

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Em outra oportunidade, o presidente comparou o governo Bolsonaro a um terremoto. A situação ocorreu durante a cerimônia de relançamento do programa Mais Médicos. “Não temos feito outra coisa a não ser tentar recuperar aquilo que tinha sido feito de bom, que tinha dado certo, e foi destruído. É como se você voltasse para sua casa das férias e tivesse dado um terremoto”, afirmou. 

Lula também disse que a Lei de Acesso à Informação (LAI) foi “estuprada” no governo do ex-presidente e acrescentou que o sigilo de 100 anos foi banalizado. Em outro episódio, o petista considerou que a gestão bolsonarista se assemelhava a uma “praga de gafanhotos”. Para ele, nos últimos anos, o país foi “desgovernado”. “Foi como uma praga de gafanhotos que conseguiu destruir o que estava construído”. 

O petista disse também que “o governo que saiu não conversava” com governadores, prefeitos e sindicatos. Que havia um “gabinete do ódio” para cuidar o “tempo inteiro” de mentiras proferidas nas redes sociais e ainda que Bolsonaro teria responsabilidade pela morte de milhares de brasileiros. 

Essa, vale destacar, não é uma característica única e exclusiva do petista. Pelo contrário, Bolsonaro também utilizou da artimanha para atacar por reiteradas vezes as gestões petistas logo que assumiu o governo, em 2019. E não cessou fogo até seu último dia no Alvorada. Trata-se, na verdade, de uma característica comum entre aqueles que assumem cargos no Executivo. A ciência política tem, inclusive, nome para esse comportamento: diferencial partidário.

À reportagem do O HOJE, o cientista político Guilherme Carvalho explicou a situação. Trata-se, segundo ele, de uma tentativa de apontar para o eleitor a diferença, em termos qualitativos, da atual gestão em relação à anterior. 

“Principalmente se o gestor anterior puder figurar como um concorrente futuro ou se puder trabalhar para fazer que alguém de seu grupo seja candidato. Isso é absolutamente natural. É a tentativa de marcar posição. É também uma peça de marketing, onde se tenta mostrar para o eleitor que você entregou, entrega e entregará muito mais do que o seu adversário”. 

Prova disso é que o governador goiano, Ronaldo Caiado (UB), só deixou de mencionar seu principal adversário político, o ex-governador Marconi Perillo (PSDB), após ter sido reconduzido ao segundo mandato nas eleições de 2022. O tucano, diferentemente de Bolsonaro — que apesar de inelegível tem se mostrado um político em potencial para a formação de uma nova liderança — já não representa uma ameaça direta ao caiadismo. 

O cientista Lehninger Mota, por sua vez, avalia que gestores comumente atribuem o cenário de “terra arrasada” para mostrarem, no futuro, que todas as conquistas alcançadas se tornaram possíveis apesar do cenário ruim em que chegaram ao poder. 

“Quando você entra numa gestão que é muito bem avaliada, que não tem nenhum problema latente, como, por exemplo, o prefeito de Goiânia, Rogério Cruz (Republicanos) recebeu o Paço de seu antecessor, o Iris Rezende (MDB), cria-se uma obrigação de se fazer um bom governo. Por isso a necessidade desses gestores em delinear uma situação de terra arrasada”, disse. 

E acrescentou: “Quando você entra e mostra que a situação está ruim, tudo que você construir será feito apesar da ‘má’ gestão que o antecedeu. Ou seja, a intenção não é manter seu adversário vivo, e sim mantê-lo na UTI, em voga simplesmente como responsável pela má situação”. 

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