Projeto de ciências para mulheres ganha prêmio internacional

Projeto brasileiro "Tem Menina no Circuito" recebe prêmio "Mulheres Inspiradoras na Ciência" da revista Nature.

Postado em: 22-10-2022 às 16h23
Por: Maria Gabriela Pimenta
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Projeto brasileiro "Tem Menina no Circuito" recebe prêmio "Mulheres Inspiradoras na Ciência" da revista Nature. | Foto: reprodução

O projeto Tem Menina no Circuito foi criado em 2013 pelas professoras da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Elis Sinnecker, Tatiana Rappaport e Thereza Paiva, que notaram a baixa presença feminina nos cursos de física. Este ano, com quase uma década de história, o projeto foi premiado como vencedor da categoria Divulgação Científica do Prêmio Nature Mulheres Inspiradoras na Ciência.

O prêmio foi entregue às pesquisadoras do Instituto de Física no dia 11 deste mês, em solenidade ocorrida em Londres. A revista Nature é uma das principais publicações científicas do mundo. “Esse prêmio é muito importante para a gente, é um reconhecimento internacional, é um prêmio de muito prestígio”, diz Thereza.

O Projeto

O projeto promove uma série de atividades voltadas para as meninas. “A gente não chama nossas atividades de aula, fazemos questão de não ir para o quadro. As atividades são mão na massa”, explica Thereza. Elas reúnem materiais usualmente usados em circuitos elétricos, como baterias, fitas condutoras e leds com objetos lúdicos de artesanato e trabalho manual, como papel, tecido e massa de modelar e colocam em prática o que aprendem.  

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Além das atividades nas escolas regulares, o projeto promove atividades extras levando as meninas para espaços de ciência, como os laboratórios da própria UFRJ e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O projeto também realiza ações nas escolas voltadas para os estudantes em geral, como palestras, oficinas de robótica e feiras de ciências, que incluem os meninos.

Mulheres na ciência

A América Latina e o Caribe atingiram a paridade de gênero na ciência, com mulheres representando 46% do total de pesquisadores da região. Os dados foram divulgados em relatório do British Council, em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Por outro lado, quando se trata da área de exatas, a participação feminina cai. Considerados apenas os estudos em STEM, sigla em inglês para ciência, tecnologia, engenharia e matemática, o estudo mostra que a porcentagem de mulheres investigadoras que trabalham em engenharia e tecnologia na região é muito mais baixa do que a dos homens. Em alguns países, como Bolívia e Peru, esta porcentagem é inferior a 20%.

Para incentivar as mulheres a participarem dos estudos no campo das ciências exatas e dar oportunidades para que elas sigam carreira na área, o projeto foi idealizado. “A ciência precisa de diversidade. Para a ciência, é melhor que haja pessoas diversas trabalhando, isso aumenta a chance de resolver problemas”, diz Thereza.  

Outro impacto observado no projeto é uma maior busca pelo ensino superior. A partir do momento que as estudantes se aproximam das universidades, elas percebem esse espaço como um lugar que pode ser ocupado por elas. “A gente está fazendo inclusão pela ciência. Motiva as meninas e o entorno delas, fomenta feira de ciência, motiva a busca pelo ensino superior” afirma a pesquisadora.  

Um artigo publicado por Thereza e outros pesquisadores no início deste ano, mostra que existe uma disparidade na quantidade de mulheres que ensinam matemática, física e química quando comparada ao número de professores homens. Na área de matemática, são 104 mulheres e 275 homens e na de química, 167 mulheres e 219 homens. No caso da física, o estudo identifica um abismo ainda maior: 66 mulheres e 258 homens. Quando considerada a raça, a diferença aumenta. Segundo a publicação, entre os 324 docentes e pesquisadores em física nas instituições consideradas, foi encontrada apenas uma mulher não branca.

A influência do projeto

Gabriella Galdino, em 2014, quando cursava o segundo ano do Ensino Médio no colégio estadual Alfredo Neves, em Nova Iguaçu, foi uma das primeiras integrantes do Projeto.  Ela conta que sempre se interessou pela área de exatas, mas foi com o Tem Menina no Circuito que pôde conhecer melhor os campos de atuação.

“O diferencial para mim, além das atividades de física, foram as visitas às universidades. Com o projeto, consegui ter acesso, visualizar como era a rotina de aluno na universidade e perceber que é acessível”, diz.

Gabriella, por influência do projeto, escolheu a carreira de física e hoje é professora em três escolas. Na turma, na UFRJ, ela era uma das poucas meninas e também uma das únicas a se formar em física. Outras acabaram mudando de curso ao longo da formação.

Ela, ainda, conta o motivo pelo qual mulheres não são tão engajadas nos cursos de ciências exatas. “Acho que as meninas acabam não indo para a área de exatas pela falta de modelos, pela falta de exemplos do que seria trabalhar em uma área dessas e por uma questão cultural. Desde pequena a gente é criada para cuidar das pessoas, por isso vão para as áreas de cuidado, educação infantil, saúde”, diz.

O projeto tem apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e do Instituto Reditus e ampliou suas atividades em 2019, passando a atuar também na Universidade Federal de Uberlândia, em Minas Gerais.

Com o prêmio, a iniciativa irá receber US50 mil para investir em atividades relacionadas à divulgação científica e ensino de tecnologia.

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