Tirzepatida chega às farmácias e intensifica debate sobre acesso e segurança no tratamento
O uso indiscriminado do Mounjaro pode acarretar sérios riscos à saúde


A tirzepatida, medicamento desenvolvido pela farmacêutica norte-americana Eli Lilly, começou a ser comercializada no Brasil em maio sob o nome comercial Mounjaro. Considerada uma das substâncias mais promissoras no combate à obesidade e ao diabetes tipo 2, a droga teve seu uso aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) ainda em 2023, mas passou a estar disponível nas farmácias apenas recentemente. Com alta demanda desde a chegada, o produto vem alimentando discussões sobre o acesso à chamada nova era do tratamento metabólico.
O remédio faz parte de uma nova geração de análogos do hormônio GLP-1, inicialmente indicados para o controle do diabetes tipo 2. A inovação da tirzepatida está na combinação do GLP-1 com o GIP, outro hormônio intestinal que atua na saciedade e no controle glicêmico, ampliando os efeitos sobre o metabolismo. Dados clínicos apontam que pacientes com obesidade chegam a perder mais de 20% do peso corporal com o uso da substância, resultado superior ao da semaglutida, princípio ativo de medicamentos como Ozempic e Wegovy, cuja média de redução gira entre 13% e 15%.
A nova classe de medicamentos representa um avanço significativo no tratamento de condições metabólicas, mas a popularização do uso levanta alertas. Apesar da eficácia, os efeitos adversos não são desprezíveis. Entre os mais relatados estão náuseas, diarreia, vômitos e constipação, especialmente no início do tratamento. Tais sintomas atingem até 18% dos usuários da tirzepatida, percentual ligeiramente inferior ao registrado com a semaglutida (24%). Em casos mais graves, os desconfortos exigem intervenção médica e ajustes na dosagem.
Estudos preliminares
A ausência de dados de longo prazo é outro ponto sensível. Ainda não há informações conclusivas sobre os efeitos do uso contínuo da substância por vários anos. Além disso, há lacunas relevantes sobre segurança em grupos específicos, como gestantes, crianças e idosos em situação de fragilidade.
Estudos preliminares com a semaglutida também sugerem agravamento de quadros de retinopatia diabética, o que especialistas atribuem à redução abrupta da glicemia. Esse tipo de reação reforça a necessidade de um escalonamento gradual da dose para evitar descompensações.
Outro ponto de atenção é a perda de massa muscular. Especialistas alertam que de 20% a 40% do peso eliminado com esses medicamentos pode corresponder a tecido magro, o que aumenta os riscos de osteoporose e fraqueza muscular, sobretudo em idosos e pacientes sem suporte nutricional e treinamento físico adequado. A recomendação, nesses casos, é associar o tratamento ao consumo adequado de proteínas e exercícios de resistência.
Com a crescente procura pelos fármacos à base de GLP-1, a Anvisa anunciou, em abril, mudanças nas regras de prescrição. A partir de 23 de junho, medicamentos com tirzepatida ou semaglutida passarão a exigir receita retida, válida por até 90 dias. A medida visa coibir a automedicação e o uso indevido, incluindo o início do tratamento com doses superiores às recomendadas. Há relatos de pacientes que, sem acompanhamento, iniciam o uso em estágios que seriam indicados apenas meses depois, aumentando o risco de complicações.
Apesar dos avanços regulatórios, o custo permanece como a principal barreira ao acesso. Segundo a tabela da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), uma caixa de Mounjaro pode ultrapassar R$ 4 mil, conforme a dosagem. Já produtos com semaglutida, como Ozempic e Wegovy, não saem por menos de R$ 1.065,75. Os valores inviabilizam o tratamento para a maior parte da população brasileira.
No setor público, o cenário é igualmente restritivo. Em maio de 2024, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) rejeitou dois pedidos de inclusão desses medicamentos na rede pública. Um deles, da Novo Nordisk, solicitava a semaglutida para pacientes com obesidade e risco cardiovascular. O outro, da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso), com apoio de sociedades médicas, pleiteava a inclusão da liraglutida. Ambos foram recusados com base no impacto financeiro, estimado em mais de R$ 10 bilhões anuais, mesmo com uso restrito a casos graves.
Com a popularização das terapias e os desafios relacionados ao acesso, segurança e custo, a introdução da tirzepatida no mercado brasileiro reforça a urgência de políticas públicas mais abrangentes para o tratamento da obesidade e do diabetes, em uma realidade onde a inovação ainda esbarra em desigualdades estruturais.
Os riscos para a saúde
O uso indiscriminado do Mounjaro pode acarretar sérios riscos à saúde, especialmente entre pessoas que não apresentam indicação clínica para seu uso.Desenvolveram o fármaco para controlar o diabetes tipo 2 e, mais recentemente, adotaram-no como ferramenta no tratamento da obesidade. No entanto, muitas pessoas têm utilizado o medicamento fora dessas finalidades. Isso preocupa especialistas devido à possibilidade de efeitos adversos severos.
Um dos principais riscos associados ao uso inadequado do medicamento é a hipoglicemia. Como a tirzepatida atua diretamente na redução dos níveis de glicose no sangue, indivíduos sem necessidade desse controle podem experimentar quedas perigosas na taxa de açúcar, com sintomas que variam entre tontura, confusão mental e desmaios. Em quadros mais graves, a hipoglicemia pode desencadear convulsões ou até levar ao coma.
Outro alerta recai sobre a pancreatite, condição inflamatória grave do pâncreas, cuja ocorrência tem sido associada ao uso da tirzepatida. Os sinais incluem dor abdominal intensa e vômitos persistentes. Se não for diagnosticada e tratada prontamente, a inflamação pode evoluir para complicações de alto risco.
O impacto do medicamento sobre a vesícula biliar também está sob observação. Há evidências de que o uso do Mounjaro pode aumentar a incidência de doenças biliares, como colecistite e formação de cálculos. Os sintomas incluem dor aguda na parte superior do abdômen, febre e icterícia, todos indicadores de que o uso da substância exige acompanhamento médico rigoroso.