Com maioria dos votos goianos, Senado aprova limites para o STF

Texto veda decisões monocráticas da Corte. Especialista em Direito Constitucional vê matéria como “altamente questionável” 

Postado em: 24-11-2023 às 09h30
Por: Redação
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A matéria já passou em duas votações e agora segue para a Câmara dos Deputados | Foto: Montagem/Senado Federal

Francisco Costa e Luan Monteiro

O Senado Federal aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 8/2021, que limita poderes do Supremo Tribunal Federal (STF), com 52 votos sim e 18 não. Os senadores Vanderlan Cardoso (PSD) e Wilder Morais (PL) foram favoráveis, enquanto Jorge Kajuru (PSB) foi contrário. 

A matéria já passou em duas votações e agora segue para a Câmara dos Deputados. O texto aprovado proíbe decisões monocráticas que suspendam a eficácia de uma lei ou norma de repercussão geral aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência da República. 

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Vale citar, a decisão monocrática é aquela dada por apenas um magistrado. Por outro lado, a decisão colegiada é aquela tomada por um conjunto de ministros, no caso da Suprema Corte.

Houve, contudo, alguns ajustes. Por exemplo, a retirada de um ponto que limitava o pedido de vistas em julgamentos. Outra alteração foi a exclusão do escopo da PEC das decisões do presidente, como decretos ou nomeações, que estavam previstas inicialmente.

Professor e especialista em Direito Constitucional, o advogado Clodoaldo Moreira critica a PEC. Ele a considera, inclusive, “altamente questionável” do ponto de vista constitucional. Ao Jornal O Hoje, ele argumenta que a proposta pretende regular assuntos protegidos por cláusulas pétreas, especialmente a separação dos poderes. 

O jurista ressalta que o poder reformador do Congresso Nacional não justifica desrespeitar cláusulas pétreas ou de salvaguarda da Constituição diante da separação dos poderes. “O Congresso não pode legislar sobre matérias exclusivas da competência normativa dos tribunais. Na minha visão, a violação dessas limitações representa uma dominação parlamentar arbitrária sobre o STF, resultando em atos de ilegitimidade constitucional.” 

Retaliação?

Nos bastidores, a tramitação da PEC foi vista como uma ofensiva do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O senador apoia Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) para a sucessão. O movimento, então, seria uma tentativa de aproximação com bolsonaristas ligados à pauta anti-STF.

Antes da votação, contudo, ele afirmou que não se tratava de uma retaliação. “Não é resposta, não é retaliação, não é nenhum tipo de revanchismo. É a busca de um equilíbrio entre os Poderes que passa pelo fato de que as decisões do Congresso Nacional, quando faz uma lei, que é sancionada pelo presidente da República, ela pode ter declaração de institucionalidade, mas que o seja pelos 11 ministros, e não por apenas 1.

Da mesma forma, o relator, Esperidião Amin (PP-SC), foi na mesma linha. “O que nós desejamos com esta proposta, tanto em 2019 quanto hoje, é que uma lei aprovada pelas duas Casas do Congresso e sancionada pelo Presidente da República, ou seja, passando por este filtro do Legislativo e do Executivo, seja sim examinada, como é previsto na Constituição pela Suprema Corte e, eventualmente, pelos Tribunais respectivos, e consertada caso haja nela algum defeito jurídico de peso, uma inconstitucionalidade, por exemplo.”

Filho do ex-presidente Bolsonaro, Flávio Bolsonaro (PL-RJ) também tentou afastar qualquer ideia de conflito. Segundo ele, o intuito do texto é buscar “o mínimo de estabilidade jurídica, de estabilidade política, de estabilidade das leis que são aprovadas aqui no Congresso Nacional, e obviamente não tem nenhum sentido virem a ser sustadas, suspensas por um único ministro do Supremo, por mais que ele possa ter razão, mas após uma análise de um colegiado”.

Líder do PT no Senado, Fabiano Contarato (ES) orientou o voto contrário. “Imaginem que nós temos uma pandemia, que todos os órgãos de controle sanitário determinem lockdown, e temos um presidente — hipoteticamente — que seja negacionista e baixe um ato determinando a abertura do comércio. Com essa PEC, não é mais possível um ministro decidir e determinar que aquele ato do presidente da República é inconstitucional para preservar o principal bem jurídico que é a vida humana”, exemplificou.

Ministros do STF rechaçam aprovação da PEC

Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) classificam a aprovação do projeto de emenda à Constituição (PEC) que limita decisões monocráticas da Corte como “ataque” e afirmam que isso prejudica a relação do Supremo com o governo Lula, que teve atuação na aprovação da matéria, segundo avaliam magistrados.

Para ministros do STF, o voto de Wagner foi determinante para a aprovação do texto. Além disso, o senador contribuiu para que alguns senadores se posicionassem a favor do texto. A postura é vista como uma traição por membros da Corte e, com isso, a interlocução de ministros com o governo fica prejudicada. Ministros procuraram o senador para entender a justificativa do voto.

O Planalto, por sua vez, decidiu liberar sua bancada para votar conforme a preferência individual, por entender que a PEC não diz respeito ao governo. Segundo articuladores, caso Lula interferisse poderia prejudicar a relação do Executivo com o Senado.

Wagner, no entanto, foi o único dos oito senadores do PT a votar a favor do texto. Na contramão, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), votou contra a PEC e criticou o texto durante discurso.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, disse que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita decisões individuais dos ministros da Corte “não é necessária e não contribui para a institucionalidade do país”.

“O Supremo Tribunal Federal não vê razão para mudanças constitucionais que visem a alterar as regras de seu funcionamento. Num país que tem demandas importantes e urgentes, que vão do avanço do crime organizado à mudança climática que impactam a vida de milhões de pessoas, nada sugere que os problemas prioritários do Brasil estejam no Supremo Tribunal Federal”, declarou.

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, disse nesta quinta-feira (23) que a Corte não é composta por “covardes” nem por “medrosos”. “Essa Corte não se compõe de covardes nem de medrosos. A Constituição garantiu à independência do Poder Judiciário, proibindo qualquer alteração constitucional que desrespeite essa independência e desrespeite a separação de poderes”, afirmou.

O que diz a PEC

Recesso do Judiciário: No caso de pedido formulado durante o recesso do Judiciário que implique a suspensão de eficácia de lei, será permitido conceder decisão monocrática em casos de grave urgência ou risco de dano irreparável, mas o tribunal deverá julgar esse caso em até 30 dias após a retomada dos trabalhos, sob pena de perda da eficácia da decisão.

Criação de despesas: Processos no Supremo Tribunal Federal (STF) que peçam a suspensão da tramitação de proposições legislativas ou que possam afetar políticas públicas ou criar despesas para qualquer Poder também ficarão submetidas a essas mesmas regras.

Decisões cautelares: A PEC estabelece que quando forem deferidas decisões cautelares — isto é, decisões tomadas por precaução — em ações que peçam declaração de inconstitucionalidade de lei,  o mérito da ação deve ser julgado em até seis meses. Depois desse prazo ele passará a ter prioridade na pauta sobre os demais processos.

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