Luiz Mauro apresenta a série ‘Ateliê’ no CCUFG

Os trabalhos fazem parte da série Ateliê, apresentada pela primeira vez na Maison Européenne de La Photographie (MEP), em Paris, no ano de 2015, sob o título Des Peintures Comme des Photographies

Postado em: 21-11-2017 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Luiz Mauro apresenta  a série ‘Ateliê’ no CCUFG
Os trabalhos fazem parte da série Ateliê, apresentada pela primeira vez na Maison Européenne de La Photographie (MEP), em Paris, no ano de 2015, sob o título Des Peintures Comme des Photographies

Bruna Policena*

Continua após a publicidade

Após 13 anos sem expor em Goiânia, o artista plástico Luiz Mauro inaugura hoje (21), às 19h, no Centro Cultural da UFG, a mostra Na Escuridão do Ateliê Nasce a Luz, que tem a curadoria de Divino Sobral. Os trabalhos fazem parte da série Ateliê, apresentada pela primeira vez na Maison Européenne de La Photographie (MEP), em Paris, no ano de 2015, sob o título Des Peintures Comme des Photographies. 

Uma das principais abordagens de seu trabalho é a transposição de imagens documentais para o universo da pintura e do desenho. Na seleção das imagens, Luiz Mauro diz que um dos pontos mais importantes é a força do espaço, mas que também procura produzir obras de ateliês de artistas que admira, buscando apresentar um novo olhar, mais íntimo e mais misterioso desses espaços de criação.

A exposição em Goiânia conta com algumas das obras lá exibidas e outras inéditas. Ao todo, são 18 obras que retratam os ambientes de criação de artistas brasileiros, como Rubem Valentim e Lygia Clark, e artistas de outros países como Claude Monet, Auguste Renoir, Anish Kapoor, Ad Reinhardt, Roy Lichtenstein, Benjamin Johnston e Georgia O’Keeffe.

Luiz Mauro

O artista goiano, que começou a pintar no início da década de 1980 na cidade de Inhumas, sempre abordou em sua produção a história da arte, a memória, a subjetividade e espaços arquitetônicos. E são estes os elementos presentes nesses desenhos que têm o papel como suporte, e recebem várias camadas de nanquim, sendo finalizados com a tinta a óleo. 

“Trabalhei muito tempo somente com o nanquim, mas só fui conseguir obter o resultado que buscava quando o associei à tinta a óleo, que trouxe mais força e densidade à pintura. Considero a obra que venho produzindo ultimamente como a mais elaborada que já realizei, envolvendo várias etapas”, comenta Luiz Mauro. 

Essa obra, que só começou a ser feita no ano de 2012, já era projeto do artista em 1997, quando teve em mãos uma imagem do ateliê de esculturas do artista alemão Georg Baselitz, mas só em 2012 ele iniciou a série com o Ateliê Claude Monet. As fotografias para os primeiros trabalhos foram pesquisadas em livros, revistas de arte e na internet. Ultimamente, o artista começou a produzir obras de ateliês de brasileiros, e passou a solicitar as fotografias aos próprios artistas ou, como no caso do artista baiano Rubem Valentim, falecido em 1991, a amigos de Rubem. 

Curadoria

O curador da mostra, Divino Sobral, observa que, na escolha das fotografias, um dos critérios de Luiz Mauro é o alto contraste e as manifestações plásticas da luz entre o preto e o branco: “É justamente a representação da luz que interessa a Luiz Mauro ao realizar a transposição das imagens fotográficas para outro suporte, com outros meios e com uma linguagem sem lugar, que transita entre desenho e pintura”.

Sobral diz ainda que, ao utilizar uma imagem de segunda geração fundada na fotografia, o resultado se revela, ao fim, em nada fotográfico. “São visíveis todos os embates com os meios bem como os procedimentos empregados para a constituição das obras. Seu objetivo não é reproduzir literalmente a fotografia, e sim utilizá-la como matriz para a construção de uma obra que parte do registro documental para atingir o estado poético repleto de melancolia, e que exibe em si seu modo de fatura cambiante entre desenho e pintura e sua existência autônoma da fotografia”, teoriza. 

Sobral considera ainda que há uma teatralidade nas obras da série Ateliê, característica que, de acordo com ele, “é obtida pela perspectiva dos enquadramentos, pelo ritmo das linhas que definem os espaços, pelas bordas escurecidas dos planos, pela oposição marcada entre a escuridão e a luz que confere certa propriedade barroca às obras – propriedade esta que não se encontra nas matrizes fotográficas”.

*Integrante do programa de estágio do jornal O HOJE sob orientação da 

editora Flávia Popov

SERVIÇO

Mostra ‘Na Escuridão do Ateliê Nasce Luz’

Abertura: terça-feira (21 de novembro) às 19h

Visitação: de segunda a sexta-feira – das 9h às 12h e das 13h às 18h

Onde: Centro Cultural UFG (Av. Universitária, nº 1.533, Setor Leste Universitário – Goiânia)

Encerramento: 26 de janeiro de 2018

Entrada gratuita 

Entrevista Luiz Mauro 

Como foi o processo para que te despertasse a temática de pintar e desenhar espaços de criação de outros artistas?

O espaço interior e as questões interiores no campo subjetivo me guiam, desde o início da minha produção, lá na década de 1980. Então o que está acontecendo é que a minha produção atual retorna lá no princípio da minha carreira. Sempre me senti atraído pelo ambiente do ateliê, creio que pelo mistério, pela intimidade que caracterizam esses espaços. Minha formação, enquanto artista autodidata, se deu principalmente nesses espaços, em ateliês de diversos artistas, assim como no ateliê coletivo que tínhamos em Inhumas. No convívio diário com esses espaços, sempre tive na minha imaginação que faria algo sobre o tema, mas não sabia exatamente o que seria; isso só foi acontecer com o passar do tempo. E sabia do risco que eu estava correndo, porque era um tema que estava presente na história da arte de uma forma muito acadêmica, e não era isso que eu queria.

Quais suas inspirações? O que tornam uma fotografia ou um ateliê uma inspiração para você? De que forma você escolhe qual espaço retratar?

Às vezes, a imagem é totalmente transformada. Existem imagens que já têm o contraste de luz e sombra, mas muitas vezes o contraste nem existe; eu que o crio por meio da luz que busco em minha produção. A primeira coisa que me move é a história de cada artista que habitou esse espaço e também a força de cada um desses espaços. No caso do Ateliê Rubem Valentim, por exemplo, que está nessa exposição, o que me moveu foi a admiração pelo trabalho dele. Eu fiquei três anos procurando por imagem do ateliê dele, e, quando encontrei, tive de mexer totalmente na luz do ateli. A luz foi totalmente alterada, mas é um lugar potente, carregado de energia do Rubem. O ateliê pode ser o máximo, mas, se a história do artista não me tocar, já não tenho interesse. Mas há também casos em que eu gostaria de realizar o ateliê, mas não encontro imagem com qualidade para potencializar. Eu tenho um material de pesquisa muito vasto, mas as imagens que eu vou usar até o fim dessa série são poucas.

Como você avalia o desenvolvimento e a adaptação da sua técnica de nanquim com tinta a óleo ao longo dos anos?

Uma das características do meu trabalho é a associação de materiais. Já associei a folha de ouro, prata e cobre à tinta a óleo, a encáustica à tinta a óleo – o óleo está sempre presente entre os materiais utilizados nas minhas obras. O nanquim, dependendo de como você o utiliza, é um material meio ingrato: cada trabalho desse recebe de 60 a 70 camadas de nanquim, e o resultado só aparece mesmo quando aplico a primeira camada de óleo. Esse trabalho somente com o nanquim, sem a associação do óleo, pode até se passar por um trabalho acadêmico e tradicionalista, e na realidade não é nada disso. Eu não tenho base acadêmica; minha formação se deu de maneira independente, faço dentro da minha capacidade, e jamais quis que esses trabalhos parecessem fotografia, e sim pintura realizada a partir de fotografia.

Como artista goiano, você tem alguma referência, algum elemento em suas obras com influência da cultura local?

Meu trabalho é muito barroco, eu acho que essa característica vem da cultura popular, das festas religiosas das quais que participei muito quando garoto e morava no interior.

Qual foi a experiência de expor fora do Brasil? 

Foi uma experiência incrível, porque meu trabalho recebeu um tratamento como poucas vezes teve aqui. MEP é um museu referência, muito respeitado. Poucas instituições brasileiras têm condições de fazer algo parecido, desde o transporte, catalogação, produção da exposição… E um ponto especial é que a MEP fica no centro de Paris, no Marais, e faz parte do roteiro dos grandes museus parisienses, próxima ao Louvre, ao museu de L’Orangerie, ao Centro Georges Pompidou… 

De que forma você percebe o mercado artístico brasileiro e exterior? 

Quanto ao mercado, é preciso que o artista saiba em que mercado ele quer se inserir. Esse trabalho que estou fazendo atualmente não é para a área de decoração, ele é para o colecionismo. O mercado de arte nacional está num momento formidável, mas o regional não tem a mesma força. Dos 30 trabalhos que compõem essa série, apenas dois ficaram aqui; o resto foi todo para fora.

E o público?

Vou falar do que vi em Paris. Percebi que as exposições de arte fazem parte do cotidiano de quem mora lá, e o público é muito interessado. Na abertura da minha exposição, que foi simultânea a de outros cinco artistas – a MEP é muito grande, tem seis andares para mostra –, compareceram mais de 500 pessoas. Dois dias depois de aberta, o livro de assinaturas das mostras já continha nomes de mais de 1.400 pessoas. Quanto ao público brasileiro, acredito que estamos em processo de formação, mas temos muita gente interessada. Eu só consigo produzir porque tem gente que acompanha, adquire, porque produzir arte é muito caro, e para fazer uma exposição são necessários muitos profissionais. E mesmo pessoas que não têm condições de comprar também são importantes, porque visitam mostras em galerias, museus, e esse é o principal intuito de todo artista: que seu trabalho seja visto. 

Veja Também