Belas e recatadas e do lar uma ova!

Premiadas por suas ações, quebrando tabus e atingindo o machismo no estômago ou simplesmente desabafando: assim elas passaram por 2016

Postado em: 17-12-2016 às 07h00
Por: Sheyla Sousa
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Premiadas por suas ações, quebrando tabus e atingindo o machismo no estômago ou simplesmente desabafando: assim elas passaram por 2016

MADONNA 

“Eu sou um tipo diferente de feminista. Sou uma feminista má”, Madonna, ao receber o prêmio de Mulher do Ano pela Billboard. 

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Um dos maiores ícones da música pop no mundo é a cantora estadunidense Madonna. Quem só a conheceu depois da fama não sabe o que a diva passou para chegar onde ela está, e ser o que ela é. Duramente julgada pela mídia e pelas pessoas por ser “muito ousada”. Madonna relembrou, ao receber o prêmio de Mulher do Ano pela Billboard, como foi difícil enfrentar todo o machismo e preconceito em sua carreira. Um estupro em um terraço em Nova Iorque, inúmeros assaltos e vários amigos perdidos para AIDS. Nada disso fez com que Madonna desistisse da vida e continuasse a lutar em prol de sua arte e das idéias em que acreditava. “Minha verdadeira musa era David Bowie. Ele personificava o espírito masculino e feminino e isso me agradava. Ele me fez pensar que não havia regras. Mas eu estava errada. Não há regras se você é um garoto. Há regras se você é uma garota. Se você é uma garota, você tem que jogar o jogo. Você tem permissão para ser bonita, fofa e sexy. Mas não pareça muito esperta. Não aja como você tivesse uma opinião que vá contra o status quo. Você pode ser objetificada pelos homens e pode se vestir como uma prostituta, mas não assuma e se orgulhe da vadia em você”, afirmou Madonna em uma das partes de seu maravilhoso discurso. 

 Marília Mendonça 

“Chegamos com o pé na porta no sertanejo. Acho que estava faltando isso para a mulher. Coragem de ir e mostrar a que veio, sem pretensões de agradar ou não as pessoas”, Marília, em entrevista a Multishow. 

O ‘feminejo’ fez muito sucesso em 2016, e provou mais uma vez que lugar de mulher é onde ela quiser, inclusive, em ritmos musicais anteriormente dominados por homens. A revelação do ano foi Marília Mendonça, cantora de voz poderosa e compositora de mão cheia. Marília, com apenas 21 anos, já é uma das cantoras que mais faturam no Brasil. Em seus shows, a ela deixa claro que sua posição é a de valorização da mulher, e quer deixar no passado a imagem de fragilidade que cerca as mulheres. A cantora é dona dos hits Infiel, Alô, Porteiro, Como Faz com Ela e faz parte da nova geração de cantoras sertanejas junto a Maiara & Maraísa, Simone & Simaria, Paula Mattos e Naiara Azevedo. 

 MC Carol 

“Depois de tudo o que eu presenciei, eu vi que não queria ser o tipo de mulher submissa. Eu quero bater”, MC Carol em entrevista ao O Globo.

Quem escuta Delação Premiada ou 100% Feminista fica de cara quando descobre que MC Carol é a dona dos hits. “Eu não sabia que ela fazia músicas assim também”, é bem fácil de escutar de alguém. Como mulher negra da favela, as composições dela sempre tiveram um tom militante que dizia, às vezes, de forma cômica, sobre o seu lugar na sociedade em relação ao patriarcado, o racismo e o preconceito de classe. 

As duas músicas mencionadas, no entanto, trazem uma narrativa mais direta e, inclusive, denunciativa quanto às opressões. Lançada em meados de julho deste ano, Delação Premiada concorre ao posto de música do ano. MC Carol é ousada e brinca com o termo jurídico, que significa uma troca de favores entre juiz e réu, comparando o tratamento aos políticos e empresários que têm a chance de recorrer a ela com o tratamento da polícia com a periferia. Ainda menciona o caso de Amarildo, desaparecido após uma missão policial, e o assassinato do dançarino DG.

Quando a gente achou que ela já tinha feito sua melhor música de todos os tempos, MC Carol juntou-se a Karol Conka e fez a música que, mesmo sendo deste ano, já virou um hino do movimento por emancipação da mulher. A narrativa vai desde a infância da mulher, que cresce vendo a violência de gênero, até o momento em que cresce e passa a lutar pelo empoderamento feminino. Entre as razões para ela ser a mulher do ano, está o fato de ela ter crescido e virado “Carol bandida, que representa as mulheres, 100% Feminista”.

MC Soffia 

“Representatividade importa muito (…). É o que eu procuro fazer com as crianças negras” MC Soffia em entrevista ao Essência.

A pequena chegou com tudo e mostrando que rap não é coisa só de mano. É coisa pra manas também, não importa a idade. E isso ela faz questão de destacar nas músicas que canta – em cada verso e rima. Neste ano, aos 12, ela foi uma das cantoras a se apresentar na abertura dos Jogos Olímpicos. MC Soffia subiu ao palco ao lado de Karol Conka e, na época, declarou ao Essência que se sentiu cantando com uma amiga.

Mas ela não está aqui somente por ter ganhado tamanho destaque na abertura do evento mundial. O motivo vem antes disso. Ainda pequena a consciência de gênero, raça e de classe da paulista é de impressionar. Suas músicas trabalham com a autoestima da menina negra por meio, por exemplo, do enaltecimento do cabelo afro. Também questiona os padrões femininos impostos a crianças, com a música Minha Rapunzel de Dread, e o sexismo colocado entre meninos e meninas com a música Brincadeira de Menina. E é nessa última que ela se afirma: “As minas fazem tudo, até mandar umas rimas”. 

 Michelle Obama 

 “Quantas mulheres não denunciaram atos sexistas, porque pensamos que ao denunciar parecemos mais vulneráveis” Michelle Obama, em discurso.

É o fim do mandato de Barack Obama na presidência dos Estados Unidos, depois de oito anos, e quem ganhou destaque desde que começaram as campanhas eleitorais foi sua esposa, Michelle Obama. Um jornal chegou a dizer que Michelle deixa o posto de primeira-dama para ser reconhecida como ativista. Ela mesma chegou a dizer que não tem intenção de se dedicar à política, mas sabe que seu legado é político. E diz isso no sentido militante e questionador que suas falas ganharam e impulsionaram no cenário mundial. 

Como primeira mulher negra a chefiar a Casa Branca com o marido, Michelle tornou-se uma das vozes a discutir questões raciais no país. O seu discurso mais famoso, feito em prol da eleição da democrata Hillary Clinton para a presidência do país, menciona, inclusive, o impacto que foi perceber que suas filhas, duas meninas negras, cresceriam em uma casa antes chefiadas apenas por homens brancos. Foi ela, também, a responsável por fazer os rebates mais fortes e contundentes às afirmações problemáticas e, principalmente, machistas feitas por Donald Trump, eleito sucessor de Barack. Não é só porque ela é a primeira dama, longe disso, o legado que Michelle deixa a faz uma das mulheres de 2016. 

 Rafaela Silva 

“Por sermos negros, às vezes não conseguimos viver bem em uma sociedade preconceituosa” Rafaela Silva, em entrevista à Revista Quem.

O choro dela fez o Brasil vibrar junto. Quando chegou à última luta, concorrendo ao ouro, era difícil acreditar que estávamos tão perto. E Rafaela Silva mostrou que não estava só perto, como o ouro no judô já era nosso. Aliás, nosso, não, dela. Quatro anos antes, quando perdeu uma luta e foi desclassificada em Londres, esse mesmo Brasil foi racista com ela. E as agressões que recebeu por não ter suprido as expectativas do País poderiam fazer com que desistisse. Mas, ao contrário do esperado, ela voltou na olimpíada sediada no Rio de Janeiro e conquistou um dos ouros da delegação. Rafaela é o motivo de alegria nacional em 2016 e, também, a razão pela qual quem foi racista com ela em 2012 deve enfiar um rabinho entre as pernas e reconhecer sua grandeza.

 Raíssa Santana 

“É um orgulho ser a representante do Miss Brasil depois de tanto tempo sem ter uma vencedora negra”, Raíssa Santana ao Extra.

A final do concurso a Miss Brasil deste ano foi diferenciada. Em um País, em que a beleza branca tornou-se hegemônica, foi transgressor ver uma maioria de mulheres negras concorrendo ao posto. A paranaense Raíssa Santana estava entre elas e conquistou o posto para concorrer ao título de Miss Universo. Para se ter uma ideia do avanço que sua conquista representa, a primeira e única mulher negra a ser eleita Miss Brasil, até então, foi Deise Nunes em 1986. Ou seja, há 30 anos. Mais que a mulher mais bonita do País deste ano, Raíssa é símbolo de um avanço sutil na luta contra o racismo sexista. 

Simone Biles 

“Não sou o próximo Bolt ou Phelps, sou a primeira Simone”, afirmou a ginasta durante a Olimpíada 2016.

Ainda tinha seis anos de idade quando, em excursão a um centro de ginástica artística, descobriram seu talento. Depois de uma carta enviada aos pais com um “Vocês já pensaram em colocar sua filha na aula de ginástica?”, Simone Biles dedicou-se ao esporte e, hoje, é a maior ginasta olímpica do mundo. A quantidade de medalhas que conquistou apenas na Olimpíada de 2016 impressionou e, por isso, muitos a compararam com os recordistas Usain Bolt, do atletismo, e Michael Phelps, da natação. Com quatro ouros e um bronze na competição, Simone rebateu às comparações, negando que a conquista tenha a ver com uma vontade de ser versão de dois homens. Mais que isso, Simone é ouro por ela mesma.

 Sônia Braga 

“Amo meu país e fico preocupada com as futuras gerações (…) Já vivi uma ditadura, não quero voltar a passar por isso”, Sônia Braga à Agência Efe.

Aos 66 anos, a atriz Sônia Braga mostra que não há idade que faça uma mulher mais frágil ou ultrapassada. Com uma carreira extensa e rica, neste ano, ela protagonizou o longa Aquarius, em que interpretou a jornalista aposentada Clara. Ela não só ganhou os noticiários pelo polêmico protesto contra o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff em Cannes. Nos últimos dias do ano, Sônia acumula prêmios e indicações como melhor atriz, desbancando, inclusive nomes internacionais como o de Emma Stone. Foi eleita a melhor atriz do ano pela Associação de Críticos de Cinema de San Diego e uma das melhores pela Rolling Stone. Sônia Braga é inspiração e, mais que atriz, é, com certeza, uma das mulheres de 2016. 

 Tati Quebra Barraco 

“Se não tinha ninguém para olhar, eu levava para trabalhar comigo. Meu filho, volta pra mãe”, Tati Quebra Barraco em desabafo após a morte do filho.

Até o dia 11 de dezembro deste ano, quem escutava o nome Tati Quebra Barraco lembrava, logo, do seu hit Boladona. Desde o último domingo, no entanto, seu nome tem sido lembrado pela perda de seu filho – de apenas 19 anos de idade. Quando recebeu a notícia, a cantora desabafou em rede social: “A PM tirou um pedaço de mim que jamais será preenchido. A PM matou o meu filho. Essa dor nunca irá se cicatrizar”. Depois disso, matérias jornalísticas tentaram provar que a morte do garoto era justificada por um possível envolvimento com tráfico de drogas. 

Para piorar, pessoas em redes sociais começaram a tentar jogar a culpa da morte do garoto em sua mãe. Mais uma das cobranças às mulheres que não são mães tradicionais. Afinal, para eles, o menino não teria se envolvido com esse mundo (o que nem está provado), se a mãe não tivesse que conciliar a rotina de shows com a maternidade. Os comentários poderiam ser perdoados por se tratar da crueldade de gente que se esconde atrás de um perfil de internet. Mas não podem, porque isso mexe e não só afeta a Tati, como a todas as mulheres que lidam com o estigma de ser a mãe perfeita e têm que enfrentar e tentar ocupar espaços que, por muito tempo, foi negado às mulheres. Sendo uma pessoa pública, o peso é ainda maior e, por ter peito o suficiente para enfrentar isso e compartilhar da vida da mulher brasileira contemporânea, Tati é a mulher do ano. 

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