A luta por igualdade de gênero na política

Apesar dos avanços, mulheres ainda continuam sendo minoria nas eleições municipais de 2016

Postado em: 04-10-2016 às 06h00
Por: Redação
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Apesar dos avanços, mulheres ainda continuam sendo minoria nas eleições municipais de 2016

Toni Nascimento

Nas eleições municipais, realizadas no último domingo (2), dos 35 vereadores que ganharam as eleições em Goiânia, apenas cinco eram mulheres. A única mulher eleita em primeiro turno em uma das 27 capitais brasileiras foi Teresa Surita (PMDB), que foi também a candidata com a maior votação proporcional do país, obtendo 79% dos votos válidos em Boa Vista (RR) e conquistando a reeleição. Ao todo, 2.105 mulheres concorreram aos cargos de prefeitas em todo o Brasil, contra 14.418 homens.

Esse resultado vai de encontro ao posicionamento realizado recentemente pela nova presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia (sem partido), que levantou em sua primeira sessão um debate que se estende por anos em uma sociedade que ainda é pouco eficiente no cumprimento da igualdade de direitos. Ela afirmou que ainda existe um extremo preconceito contra as mulheres em todas as profissões, incluindo na política.

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O discurso ganha mais força quando analisamos o papel da mulher na vida pública. Segundo dados da última Pesquisa Nacional por Amostra em Domicílios (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2014, o número de mulheres, 104.772 milhões (51,6 % do total), é superior a população de homens, 98. 419 milhões (48,4% do total) no Brasil.

Mais da metade do país é formado por mulheres e essa realidade se repete nas urnas. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o número de eleitoras ultrapassa o de eleitores. Elas somam 52%, enquanto os homens são 48%. E ao falarmos de cargos públicos as coisas se intensificam, a participação das mulheres na Câmara dos Deputados é de 9%, número semelhante aos 10% registrados no Senado segundo dados do TSE.

De acordo com pesquisa realizada e divulgada pela Secretaria de Políticas para Mulheres (SPM), em 2012, as Câmaras municipais contavam com o total de 7.782 vereadoras. Nas prefeituras do País, a participação, em 2012, era simbolizada por 672 mulheres. Ainda segundo o levantamento da SPM, as 7.782 vereadoras brasileiras, contabilizadas representam 13,5% do total dos cargos correspondentes nas câmaras municipais.

Outro dado pertinente e que corrobora com esse cenário é o fato de apenas 52 municípios em todo o país tiveram somente mulheres como candidatas à prefeitura, em contrapartida 3.815 das cidades brasileiras havia apenas homens concorrendo, o que equivale a 68% do total de cidades.

O Problema

A Cientista Política Haína Coelho ressalta o papel da mídia e dos meios de informação no processo de machismo que dificultam o exercício do poder feminino. A sociedade da comunicação, que produz um volume imenso de informação por segundo, deveria desconstruir ideias machistas, colocar homens e mulheres em diálogo e expor noções retrógradas, mas infelizmente, segundo Haína, isso não acontece. Para ela, a internet e os jornais perpetuam ainda mais o machismo e o preconceito, dando voz a discursos machistas e representando as mulheres de forma histérica e sensível

“Um exemplo gritante de como machismo se perpetua na mídia é quando mulheres em importantes cargos públicos não são objeto de discussão sobre suas políticas, ou seus posicionamentos e alianças, mas sobre as roupas que usam. Ninguém discute sobre os ternos de líderes homens, por que esse tópico toma lugar de debates substantivos quando temos líderes mulheres?”, questiona a cientista.

Para Beatriz Bonach Pires Ribeiro, de 22 anos, servidora pública e integrante do Coletivo Pagu, o machismo se perpetua de formas múltiplas, mas destaca dois motivos. Primeiro ela faz uma análise histórica, onde durante muito tempo a base familiar era formada por um homem e uma mulher, em que ele tinha o dever de manter a casa financeiramente e ela de cuidar de todo o resto, não sobrando tempo para trabalhar ou encarar uma vida pública. Quando assim fazia, não era vista com bons olhos pela família e pela sociedade, que encaravam como uma negligência às suas funções básicas. “Infelizmente essa realidade persiste ainda hoje” lembra ela.

Ela também destaca que a desigualdade de gênero se perpetua a partir do momento em que as mulheres são ensinadas a introverter o que pensam.

Mulher na política

Para tentar combater o preconceito e tentar fazer valer os direitos igualitários na política foi implementada em 2009 a lei 12.034. Ela estabelece que cada partido ou coligação preencha o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. O objetivo é exigir que os partidos permitam que as mulheres exerçam cargos públicos, inclusive funções de destaque.
Nas primeiras eleições municipais, após a nova legislação, o número de candidatas mulheres a concorrer o cargo de vereador (a) foi de 31,8%, sendo usado o mínimo do exigido. Apesar da existência da lei já ter completado mais de 7 anos, em 2015 as mulheres só ocupavam 13 % das vagas nos parlamentos do país.

Adriana Accorsi (PT), que concorreu a prefeitura de Goiânia na última eleição municipal e não conseguiu votos suficientes para chegar ao 2º turno, diz que, apesar de sempre ter sido muito bem recebida nos espaços onde trabalhou, quando foi delegada da Polícia Civil em Goiânia percebia atitudes naturalizadas de preconceito velado, como "esta atividade não é coisa de mulher, é coisa de homem"; "mulher age mais com a emoção e o trabalho policial exige razão". No entanto, ressalta que nunca deixou se intimidar.

Cristina Afonso (PSDB), eleita vereadora como a segunda mais votada da capital goiana, também conta que o machismo na vida política se manifesta muitas vezes de forma sutil e difícil de combater. Ela explica que uma das formas de desqualificar o trabalho e as conquistas de uma mulher são as críticas a imagem, ao corpo, a forma de vestir, ao cabelo e ao jeito de ser. “Para desmerecer nosso potencial, somos alvos de brincadeiras baseadas em nossas características físicas”, diz.

Crescimento da Representatividade 

Apesar do preconceito contra a mulher ainda ser tão presente na sociedade, como discursou Cármen Lúcia, já é possível ver mudanças segundo a cientista política Haína, “Nos países nórdicos a participação feminina em cargos públicos já chega a superar a masculina. Alguns países muçulmanos da África e sul da Ásia possuem cadeiras reservadas para mulheres em suas legislaturas. Vem aumentando o número de países que são liderados por mulheres, inclusive economias importantes como Alemanha e Coréia do Sul”, afirma.

Accorsi também vê que a representatividade feminina cresceu muito. Ela diz que em outros países, até mesmo na política, a mulher já está em condições de igualdade como o homem, mas no Brasil, o processo é mais difícil. “O preconceito velado neste espaço consegue com suas artimanhas dificultar esta participação, mas nós estamos na luta”.

Haína concorda, mas lembra que apesar de o quadro ter melhorado, ainda não é suficiente. "Não podemos dizer, contudo, que a representatividade feminina é satisfatória. No Brasil as primeiras mulheres senadoras só foram eleitas na década de 90. A participação de mulheres cresceu, mas ainda não está em níveis aceitáveis”.

Soluções

Para Beatriz só é possível reverter o machismo com um grande processo de educação em direitos humanos. Ela completa dizendo que é necessário estimular as meninas a exercer atividades múltiplas e desvincular o exercício das atividades profissionais a gênero. 

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