Violência contra mulheres lésbicas no Brasil teve crescimento entre 2014 e 2017

Documento revela que, enquanto em 2000 foram dois casos, em 2017 eles chegaram a 54. A partir de 2013, o aumento tem sido constante, sendo que o maior ocorreu de 2016 para 2017

Postado em: 08-03-2018 às 08h20
Por: Victor Pimenta
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Documento revela que, enquanto em 2000 foram dois casos, em 2017 eles chegaram a 54. A partir de 2013, o aumento tem sido constante, sendo que o maior ocorreu de 2016 para 2017

O primeiro Dossiê sobre Lesbocídio no Brasil mostra
crescimento da violência contra mulheres lésbicas. Lançado nessa quarta-feira
(7), o documento indica que, no período entre 2000 e 2017, foram registrados
180 homicídios de lésbicas. No entanto, os anos mais recentes concentram a
maior parte das mortes: somente entre 2014 e 2017, foram registrados 126
assassinatos de lésbicas no país.

O dossiê foi elaborado pelo Grupo de Pesquisa Lesbocídio – As
histórias que ninguém conta, que atua no resgate de informações e histórias de
lésbicas vítimas desse tipo de crime no país. O dossiê revela que, enquanto em
2000 foram dois casos, em 2017 eles chegaram a 54. A partir de 2013, o aumento
tem sido constante, sendo que o maior ocorreu de 2016 para 2017, quando subiu
de 30 para 54 registros.

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O estudo mostra ainda que a violência vem do preconceito
masculino. “As lésbicas se relacionam sexual e afetivamente exclusivamente com
mulheres, mas os principais assassinos de lésbicas no Brasil são homens, o que
significa que o vínculo conjugal entre vítima e assassino, muito recorrente nos
casos de violência doméstica resultantes em feminicídios, não ocorre nos casos
de lesbocídio”, diz o texto do dossiê.

O estado de São Paulo, com 20% de todas as mortes de lésbicas
no país, foi o que teve, entre 2014 e 2017, o maior número de registro de
lesbocídios. Na capital paulista, foram oito casos nos últimos quatro anos.
Apesar disso, é no interior do país que são anotadas mais mortes. Dos 126 casos
registrados entre 2014 e 2017, 82 ocorreram no interior dos estados.

O documento explica que o termo lesbocídio, entre outras
motivações, é proposto na pesquisa “como forma de advertir contra a negligência
e o preconceito da sociedade brasileira com a condição lésbica, em seus
diversos âmbitos, e as consequências, muitas irremediáveis, em especial a morte
de lésbicas por motivações de preconceito contra elas, ou seja, a lesbofobia.
Assim, definimos lesbocídio como morte de lésbicas por motivo de lesbofobia ou
ódio, repulsa e discriminação contra a existência lésbica”.

A coleta de dados sobre os casos de lesbocídio no país que
ocorreram entre os anos de 2014 e 2017 foi feita durante o ano passado, com
base em informações obtidas por monitoramento de redes sociais, sites, jornais
eletrônicos e outros meios de comunicação de notícias criminais nacionais,
regionais e locais, sempre identificando os casos de lésbicas assassinadas e
ainda os casos de suicídio.

Suicídios

Os registros feitos de 2014 a 2017 indicam 33 suicídios, em
sua maioria com lésbicas na a faixa de idade entre 20 e 24 anos, vindo em
seguida a faixa de até 19 anos. Juntas, as duas faixas etárias concentram 69%
dos casos de suicídios de lésbicas no Brasil. Os registro de casos seguem em
números crescentes nos últimos anos. Em 2014 foram dois, no ano seguinte,
cinco, em 2016 foram seis e ano passado esse número passou para 19. 

“O suicídio
aí é sentido como uma resposta dessas mulheres a uma sociedade em que elas não
têm espaço. Na medida em que se sentem como escória da sociedade, muitas vezes
não conseguem encontrar um lugar de trabalho. São levadas ao fim da linha e
sentem a própria vida como uma vida que não tem valor”, disse a professora.

Maria Clara revelou que, entre os casos pesquisados de
suicídio, as mulheres se encontravam em situação de vulnerabilidade. “Há uma
coexistência de causas ou de vulnerabilidade. Geralmente, são mulheres de baixa
extração social, negras e muito jovens. A maior parte dessas mulheres tem baixa
escolaridade. É uma coincidência de vulnerabilidade que faz com que elas não
encontrem alternativas”, afirmou.

Jovens

Em um paralelo com o Mapa da Violência de 2016, que destacou
os jovens como a parte da população que mais morre no país, entre as lésbicas
assassinadas ou que se suicidam no Brasil isso se repete. Conforme o Dossiê
sobre Lesbocídio
, grande parte das notificações se refere a pessoas de 20 a 24
anos, representando 34% de todas as mortes registradas no período de 2014 até
2017. A segunda faixa com maior número de registros é a que vai até os 19 anos,
com 23% dos casos. Não foram registradas mortes de lésbicas acima dos 50 anos.

O alto número de registro de lésbicas mortas nas duas
primeiras faixas etárias representa vidas jovens, em processo de
amadurecimento, em grande parte, mortas por pessoas com vínculos familiares
e/ou afetivos. Dos registros de lésbicas assassinadas com até 24 anos, 70%
foram casos de assassinatos cometidos por pessoas conhecidas das vítimas.

A pesquisadora destacou ainda o nível de crueldade dos crimes
de lesbocídios, que muitas vezes não ocorrem em outros tipos de assassinatos.
Para ela, entre os motivos está uma certa conivência da sociedade quando o
crime é cometido por um ex-parceiro da mulher. “Fazer com que a opinião pública
se manifeste negativamente com relação a esses crimes é uma arma que a gente
conquistaria e tentar fazer que mesmo os crimes passionais diminuíssem”,
afirmou, destacando que além de os crimes serem praticados por homens próximos
à vítima, existem os casos de violência nas ruas.

Políticas públicas

O Grupo de Pesquisa Lesbocídio – As histórias que ninguém
conta indica ainda a necessidade de criação de políticas públicas para reduzir
a incidência de crimes desse tipo. A coordenadora disse que o trabalho de
levantamento de dados, que atualmente é feito por sites e por pesquisadores,
deveria ser realizado por órgãos públicos para ter mais abrangência e
cruzamento de mais informações.

Maria Clara defendeu ainda a tipificação do
crime como lesbocídio e dispositivos de proteção para as lésbicas. “Muitas delas
são vitimadas em locais públicos, onde não há preocupação específica com o
cuidado dessas mulheres. Talvez tivesse que existir um dispositivo de denúncia,
que elas pudessem acionar em uma situação de busca de socorro quando se
sentissem vulneráveis. Acho que políticas públicas com o objetivo de
protegê-las preventivamente poderiam ser criadas”, acrescentou. 

Fonte: Agência Brasil. (Foto: Reprodução/Fernando Frazão)

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